Em Junho,
celebra-se o mês do Orgulho. Um mês de celebração e luta pelas conquistas de
Direitos LGBTI+, pelos Direitos Humanos (DH) e pela igualdade. Seria hipócrita
permitir que Estados com políticas segregacionistas e de apartheid, de
colonização e campanhas genocidas, se juntassem a uma marcha com estes valores.
O representante
de Israel em Portugal está enganado sobre as marchas em Portugal. Estas não são
marchas comerciais, financiadas pela coca-cola e que excluem a comunidade. Não
obrigam a comunidade LGBTI+ a pagar para poder participar. Não esquecem todas
as restantes opressões para as cobrirem com uma bandeira arco-íris. Ao
contrário do que afirma, nunca a organização da Marcha do Orgulho LGBTI+ de
Lisboa (M.O.L.) foi contactada pela sua Embaixada tendo em vista uma
participação, tendo antes tentado infiltrar-se na M.O.L. através de um
expediente manhoso, ao arrepio do regulamento público sobre a participação de
entidades na mesma e sem dar disso conhecimento à Comissão Organizadora. Opera, assim, na falsidade.
Desde que a
Palestina foi dividida pelas Nações Unidas em dois Estados em 1947, a ONU adoptou
inúmeras resoluções sobre o conflito, todas ignoradas ao longo de 75 anos.
A 09 de Julho de
2021, o relator da ONU sobre a situação dos direitos humanos nos Territórios
Palestinianos Ocupados (TPO) pediu que os colonatos israelitas fossem
classificados como "crimes de guerra". Apresentando o seu último
relatório ao Conselho de Direitos Humanos em Genebra (Suíça), Michael Lynk
afirmou que os colonatos israelitas nos territórios palestinianos constituem
uma "violação da proibição absoluta de implantação de colonatos".
"A comunidade internacional classificou essa prática como “crime de
guerra” quando aprovou o Estatuto de Roma em 1998", afirmou.
Pouco mais de um
mês após a execução da jornalista Shireen Abu Akleh pelo exército de Israel, o embaixador
de Israel em Portugal deveria ter pudor de falar em DH (dos quais os direitos
das pessoas lgbti+ fazem parte). As acções militares de um dos exércitos mais
poderosos do mundo contra populações civis desarmadas e as suas políticas de
apartheid constitucionalmente consagradas não escolhem a orientação sexual ou
identidade de género das suas vítimas. Mas a desproporcionalidade não se fica
por aí: também é pouco de diplomata, e mais de “bullying” puro e simples usar o
cargo de representação de um poderoso estado-nação para atacar insultuosamente
meros activistas e movimentos lgbti+ de Lisboa.
O embaixador Dor Shapira acha que lhe cabe determinar quem representa as
comunidades lgbti+ de um outro país soberano. Certo é que não é a embaixada de
Israel. É certo também que a M.O.L. não é, e não será, local para que Estados –
o de Israel ou outros – e demais entidades venham lavar a cara de violações de
DH.
O Estado de
Israel sabe o que é ‘pinkwashing’. Não é de estranhar: o termo foi cunhado para
descrever a sua política externa, que mobiliza recursos financeiros e outros
para se autopromover internacionalmente como respeitador dos DH a pretexto da
tolerância para com os movimentos lgbti+. No entanto, é um Estado iníquo que há
décadas desrespeita as sucessivas resoluções da ONU sobre a ocupação da
Palestina, mantém encarceradas e sujeitas à acção militar 2 milhões de pessoas
– quantas lgbti+? - na maior prisão a céu aberto do mundo – Gaza – enquanto
nega às populações refugiadas o seu direito de retorno.
Um estado que se
vangloria da sua democracia e respeito pelos DH enquanto desenvolve um dos mais
longos genocídios da história da humanidade. Segundo Dor Shapira, Israel acolhe
pessoas lgbti+ fugidas da Palestina. Esquece-se de mencionar sob que condições:
o exército de Israel é conhecido por ter uma unidade de espionagem electrónica
que recolhe informação pessoal sobre pessoas nos TPO, entre outras sobre a sua
orientação sexual, de forma a chantageá-las para espiarem em seu favor.
Enquanto Israel
não cessar toda a violência contra a Palestina, intimidação e regime de
apartheid, a sua autoproclamada tolerância e aceitação são somente atos
performativos de exclusão e não políticas de liberdade e igualdade.
Nota
de edição
Este
artigo é uma resposta a um artigo escrito no jornal Público pelo
Embaixador de Israel em Portugal, Dor Shapira, a propósito da tentativa da embaixada
de Israel em participar na edição deste ano da Marcha, algo que não foi aceite
pela Comissão Organizadora da 23ª Marcha do Orgulho LGBTI+ de Lisboa. A recusa
do “direito de resposta” por parte do Jornal Público (baseado em critérios jornalísticos
pouco claros e ambíguos) e a pertinência do problema que a posição da Comissão
Organizadora revela, leva-nos a partilhar e a divulgar o texto na íntegra, com
a devida autorização da Comissão Organizadora.
Imagem
Fotografia
da 23ª Marcha do Orgulho LGBTI+ de Lisboa, que decorreu a 18 de Junho de 2022.
Imagem via Marcha do Orgulho LGBTI+
Ficha
técnica
Data
de publicação: 04.07.2022
Edição
#35 • Verão 2022 •