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E pur
si muove!*
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ICOMOS
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Do
ponto de vista simbólico, esta frase sintetiza a teimosia das provas
científicas contra a censura ou a quintessência da rebelião científica contra
as convenções de autoridade e dos interesses dos maus poderes em cada
circunstância. Conta-se que foi pronunciada por Galileu Galilei para reafirmar
o seu conhecimento científico de que a terra gira em volta do sol e não o
contrário, como queriam obrigá-lo a reconhecer.
A
intervenção no quarteirão das Cardosas (no centro histórico do Porto) o maior
exemplo de destruição e demolição intencional em património classificado e
protegido ao mais alto nível (património mundial da UNESCO) em Portugal, foi
sintomaticamente premiado pela Revista Vida Imobiliária como bom exemplo de
Reabilitação.
Esta
intervenção no quarteirão das Cardosas, agora premiada, e reprovável a todos os
títulos, foi realizada sob o slogan:
“Cardosas, construímos hoje o património do futuro". Um júri constituído
quase exclusivamente por pessoas vindas de sectores que não o do património ou
o da REABILITAÇÃO, e, portanto, longe de serem especialistas, entendeu
premiar esta intervenção. Existe um pudor e uma ética que nos deve inibir de
avaliar publicamente aquilo para o qual não temos conhecimento específico
reconhecido. Existe também uma regra, além das questões éticas e da praxis.
Assim funciona a avaliação de mérito em instituições sérias e rigorosas,
nacionais e internacionais, respeitadoras do estado do conhecimento e das boas
práticas adoptadas internacionalmente relativas às matérias em apreço. Os
prémios geralmente destinam-se a premiar o que se distingue positivamente e não
o contrário. Estamos pois perante uma inversão perigosa de valores e uma
manipulação grave dos conceitos e do léxico da conservação e da reabilitação
das cidades históricas, sem reação ou contraditório visível, o que nos confirma
talvez que vivemos de novo em tempos sombrios. Os tempos sombrios, definidos
por Hannah Arendt são aqueles em que se perdeu a capacidade de pensar
criticamente e de exercer a capacidade de julgar, dando assim lugar à
possibilidade da banalidade do mal. O mal na pujança da sua normalidade, o que
permite tudo sem um julgamento, como se fosse banal. A incapacidade de
estabelecer juízo crítico é um atributo dos tempos sombrios que amesquinham o interesse
público, que o corroem por dentro com as faltas de credibilidade, com governos
invisíveis, com discursos que não revelam o que são, degradando a
verdade. Tudo isto se passa agora nas nossas cidades históricas e no
património arquitectónico e urbano. Esta incapacidade ou negação objectiva para
exercer o julgamento ou o juízo crítico permite que tudo seja reduzido ao
discurso promocional imobiliário e tudo vale! Eis a banalidade do mal no
domínio da conservação e da reabilitação das cidades históricas. O prémio
imobiliário agora atribuído à intervenção realizada no quarteirão das Cardosas,
não é um prémio para distinção de boas práticas em reabilitação de cidades
históricas porque justamente esta intervenção viola todas, mas todas, as regras
e boas práticas nacionais e internacionais reconhecidas pelos especialistas,
universidades, e pelo ICOMOS e UNESCO e às quais o Estado português está
obrigado por força dos seus compromissos e da legislação em vigor no nosso
país. O ICOMOS Portugal promoveu de resto em Outubro de 2013 um encontro
nacional sobre este assunto, com uma participação institucional e cívica
alargada, e onde se demonstrou que há alternativas a este modelo imobilista,
velho e errado, técnica e cientificamente, que se insiste em aplicar na gestão
das cidades históricas, o que ainda é mais grave quando elas, as cidades, são
um património da humanidade.
E pur si muove: A
verdade do conhecimento científico e das boas práticas reconhecidas a nível
internacional contra a banalidade do mal dos nossos tempos sombrios.
*«No entanto ela (a Terra) move-se»
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Conselho de Administração do ICOMOS Portugal
NOTA: Imagens da responsabilidade da redacção