Derrubar uma estátua, haverá algo mais legítimo? • Françoise Vergès

 


“Derrubar/desmantelar estátuas” de homens brancos é justo porque estes projectaram, conceptualizaram, encorajaram e organizaram o tráfico, a escravatura, a colonização e, portanto, justificaram a deportação de africanas/os, a sua escravidão e o seu estatuto de “objecto”, autorizaram a exploração, a tortura e a morte dos corpos e dos recursos, fizeram do ventre das mulheres negras uma forma de capital, proibindo-as de constituir família, impuseram o Código Negro, o Código do Indigenato, roubaram, pilharam, destruíram cidades, universidades e templos, em nome de uma civilização “superior”. O espaço público deve ser libertado da sua presença.

 

Sem surpresas, esta questão despertou imediatamente em França um debate com contornos familiares. Familiares porque a inadmissibilidade apoia-se sobre as frases feitas de um discurso repetido e ensaiado que mistura má fé, ignorância e desprezo. A reacção defensiva que pretende ser fiel à “História”, “às suas páginas sombrias bem como às suas páginas de luz”, esconde mal o medo de ver todo um monte de mentiras e de ficções que se desmoronam, monte esse sobre o qual repousa uma narrativa nacional mutilada e que mutila. Destruir estátuas de criminosos colonialistas é uma exigência de justiça da memória, de dignidade, de respeito e igualdade, um elemento importante numa luta mais ampla contra o racismo estrutural e sistémico.

Quando nos apontam para a lua, não olhamos para o dedo. Não confundimos a destruição das estátuas com o fim dos controlos discriminatórios, da violência policial, do racismo, do sexismo, das desigualdades e das injustiças. Não confundimos mais história com memória. As estátuas não contam a história, são antes o resultado de escolhas políticas que atestam quem o poder valoriza, assim como a memória que querem encenar. Revelam decisões que impõem na paisagem pública certas narrativas, certas figuras, uma certa estética. Nada disto é neutro. Aquilo que é exigido no período político em que vivemos, neste momento em que face a uma pandemia as decisões governamentais exacerbaram as desigualdades e injustiças raciais, demonstrando a realidade da fabricação de uma vulnerabilidade diferenciada à morte prematura, é respeito e dignidade. Mas as estátuas derrubadas não são apenas um acto simbólico, são também um acto de libertação, de abertura a narrativas, memórias e representações das quais precisamos hoje.

É preciso pensar: não serão mais as mesmas pessoas que terão o direito de decidir por nós, e sem nós, quais as estátuas que adornam as nossas cidades, que nomes dar às nossas ruas, avenidas e praças. Estamos em 2020, é tempo de rever a arquitectura das cidades construídas de forma a não acolher com benevolência ou generosidade as pessoas vulneráveis, racializadas, sem-abrigo, sem-papéis [sans papiers], refugiadas, migrantes, trabalhadoras, negras; estas cidades feitas à medida de homens brancos, ricos e de boa saúde. As estátuas reflectem o mundo que os seus ancestrais edificaram e que lhes garantiu o espaço onde implantaram o poder e a arrogância. Estas são as “suas” cidades, cidades de conquistadores, cidades de homens que esmagaram as insurreições das/os oprimidas/os, que se vingaram com crueldade daqueles e daquelas que ousaram desafiar o seu poder, que foram aos quatro cantos do mundo para esmagar, explorar, despojar, violar, roubar, saquear, para que os seus filhos nascessem com privilégios que nada deviam aos seus talentos ou competências. Agora reivindicamos habitar nessas cidades. Poder decidir colectivamente aquilo que nos rodeia, poder marchar nas ruas, nas avenidas, nas praças, nos jardins, sem nos esbarrarmos contra representações daqueles que defenderam uma ideologia racista, sexista, xenófoba e assassina, e que quiseram que a humanidade fosse dividida entre as vidas que contam e as que não contam. Queremos respirar

 


As acções que contam... e as que não contam

Tudo começou no dia 22 de Maio de 2020, em Fort-de-France, na ilha de Martinica: um grupo de jovens martinicanas fez cair duas estátuas de Victor Schœlcher. Porquê no dia 22 de Maio? Porque nesse dia, em 1848, as escravas e os escravos recusaram-se a esperar a chegada do comissário da República, que aplicaria o decreto de abolição de 27 de Fevereiro e os proclamaria livres. Elas e eles não foram receber a liberdade de um enviado de França, elas e eles conheciam o nome dos seus libertadores, que são os fugitivos e as fugitivas, rebeldes, escravizados, que dia e noite resistiram à desumanização.

Dia 22 de Maio, duas jovens mulheres assumiram a responsabilidade pela destruição das duas estátuas de Schœlcher, de frente para a câmara, informando tranquilamente e com firmeza à polícia, aos juízes e ao Estado porque é que participavam nessa acção. “Não, Schœlcher não é o nosso salvador”, proclama o seu manifesto, que lista de seguida uma série de reivindicações. Uma das jovens é presa e depois libertada; o procurador da República (francês e branco) anuncia uma investigação e promete que os culpados serão punidos. As condenações da acção são imediatas. Na ilha de Martinica são de escritores, intelectuais, representantes eleitos; em França vieram de historiadores e de representantes eleitos. Todas as frases feitas em torno da história e das memórias coloniais estão lá: apagamento da história, jovens que nada entendem sobre a escritura da mesma. O presidente da República condena veemente esta acção, citando a “grandeza de França” e declarando que o acto “mancha a memória de Schœlcher e da República”.

Pouco tempo depois, durante uma conversa com uma das duas jovens porta-vozes, soube que o grupo que derrubou essas estátuas foi também o que organizou, em Novembro e Dezembro de 2019, o bloqueio dos centros comerciais pertencentes à família Hayot, um poderoso grupo capitalista de uma grande família béké[1], que detém praticamente todo o monopólio da distribuição “ultramarina” através da qual uma das empresas, a Laguarigue, dirigida por Yves Hayot, importou o pesticida clordecona, responsável pelo envenenamento da ilha, dos seus rios, lagoas, campos e habitantes.[2] O prefeito de Martinica considerou “inadmissíveis os bloqueios ilegais”, o que levou a que forças policiais fossem então enviadas em força e que sete activistas fossem acusados (até à data, o seu julgamento ainda não foi realizado).

1. Utilizado nas Antilhas Francesas, “béké” é um termo de origem incerta utilizado em referência aos habitantes brancos crioulos da ilha de Martinica ou de Guadalupe, descendentes dos colonos europeus [N. do T.].

2. “O grupo [GBH] detém, entre outras, as lojas Carrefour, Euromarché, Mr. Bricolage, Renault, Décathlon nas Caraíbas (Martinica, Guadalupe, Guiana, Cuba, Saint-Luce, República Dominicana, Trinidade e Tobago) no Oceano Índico (Reunião, Ilhas Maurícias), na França Metropolitana, em África (Marrocos, Algéria, Gana, Costa do Marfim), na China e na Nova Caledónia. GBH exerce as suas actividades ao redor de três pólos: a grande distribuição; a distribuição automóvel; e actividades industriais diversas, em particular a produção de iogurtes da marca Danone na ilha da Reunião, e a produção e exportação de rums (Rum Clément e J.M. na Martinica).

Relembro estes feitos porque o seu esquecimento no debate actual sobre o derrube de estátuas levanta outras questões. É o derrube da estátua do esclavagista Colson a 7 de Junho em Bristol, Inglaterra, que simbolizará aos olhos dos média, dos políticos e mesmo dos militantes o movimento rapidamente global de fazer cair as estátuas de homens ligados à escravatura, à colonização, ao imperialismo e inevitavelmente, portanto, ao racismo. Porquê o esquecimento do gesto de 22 de Maio? Sem dúvida porque existe uma hierarquia de acções militantes, aquelas que contam e aquelas que são marginais. As lutas ultramarinas não encontram nunca em França o eco que deveriam ter, nunca. Essas lutas não são vistas nem como actos políticos nem como reflexões teóricas que contribuem para o debate crítico. Sem dúvida que isso decorre da incapacidade de pensar nas ligações entre as lutas anti-racistas em França e aquelas do ultramar, de pensar na multi-espacialidade do colonialismo republicano e das respectivas lutas.

As palavras proferidas pelas jovens na ilha de Martinica, em 2019 e 2020, traçam os contornos do colonialismo republicano do século XX e as suas reconfigurações neoliberais, a exclusão de uma juventude racializada, o peso que a escravatura e o estatuto colonial continuam a ter sobre um território da república francesa. Estes jovens proclamam: “as vidas negras importam”. No seu canal Mawon, explicam aquilo que anima a sua militância: a oposição à miséria, a ausência de um futuro (50% de desemprego entre os jovens há décadas e uma alta taxa migratória), o envenenamento do seu país por vontade política, a ausência de indemnizações, o acesso difícil ao capital financeiro e social, aos cuidados de saúde, à água potável, o racismo estrutural e sistémico, a dependência da elite martinicana do poder francês. O escândalo em Martinica não é a queda das estátuas de Schœlcher, mas uma taxa de mortalidade infantil três vezes maior que em França, uma taxa de cancro na próstata entre as mais altas do mundo, uma juventude a quem o poder continua a dizer que “o futuro é noutro lugar”.

O argumento que consiste em dizer que é o schœlcharismo que coloca um problema e que é necessário “respeitar Schœlcher”, porque este “salvou a honra de França”[3], repousa sobre uma abordagem contabilística da história onde a página das boas acções é mais longa do que a das más. Ora, o que importa aqui é saber porque é que o republicano Schœlcher, assim como os seus companheiros, defenderam a colonização e viram a abolição da escravatura como o ponto de partida para uma colonialização republicana. A sua cumplicidade levanta a questão da república colonialista. E mesmo que as estátuas tenham sido reclamadas e financiadas pelos (escravos) libertados, mesmo se Aimé Césaire prestou homenagem a esse homem (embora dizendo que a sua obra foi insuficiente), estamos em 2020 e as martinicanas e os martinicanos têm o direito de querer mudar a representação das suas memórias e das suas histórias. As estátuas de Schœlcher reforçam uma história da abolição da escravatura que apaga a luta incessante, longa e difícil daquelas/es que pagaram com a sua vida a sua postura anti-escravatura: as/os escravizadas/os nas plantações, as/os quilombolas, as/os revolucionárias/os haitianas/os. Se Schœlcher pertence à história do abolicionismo francês, mais não é do que um elemento que representa toda a ambiguidade desse abolicionismo. Mas aquilo que pretendo aqui relembrar é sobretudo de onde partiu o movimento de derrube de estátuas; do país de Césaire, Glissant, Fanon e de duas jovens mulheres que quebraram hoje o consenso pós-colonial e trouxeram à luz do dia os “dois males que atormentam a sociedade martinicana: por um lado, a inércia diante um legado colonial ainda vivo; por outro, o fosso crescente entre uma sociedade envelhecida e aburguesada, e uma juventude que exige mudança social.” [4]

3. Patrick Chamoiseau, no Twitter, a 23 de Maio de 2020.

4.  Isis Labeau-Caderia, «La Martinique, malade de sa colonialité et de sa structure gérontocratique », France Antilles Martinique, 28 mai 2020.

 

Racismo, anti-racismo

Em França, as reacções defensivas à reivindicação de desmantelamento das estátuas testemunham o lugar do racismo estrutural, do passado colonial e do presente da colonialidade na construção da nação francesa. Segundo uma sondagem IFOP-Fiducial, 71% das francesas e dos franceses opõem-se ao desmantelamento das estátuas, 8% acreditando ser “justificado desbaptizar nomes de ruas ou retirar as estátuas de todas as personagens da História de França julgadas controversas”. O racismo estrutural foi tecido na vida quotidiana da sociedade francesa, naturalizado, e para a grande maioria dos franceses e das francesas fez parte da ordem das coisas de tal forma que lhes bastava não pensar nisso e ignorar a sua existência. “A França não é racista” tornou-se uma verdade: apenas algumas pessoas sem educação ou de extrema-direita seriam racistas. As estátuas dos militares responsáveis por crimes coloniais fizeram naturalmente parte da paisagem como os zoos humanos, Tintim no Congo ou Tarzan. Criou-se uma ligação emocional, pouco importando quem era Colbert, Gallieni, Bugeaud, Faidherbe ou Mangin. Tornaram-se membros honorários da grande família francesa e as suas estátuas parte da paisagem familiar e quotidiana, servindo como marcos da vida social e cultural. Colbert impôs o Código Negro; Bugeaud, em quem Gallieni se inspirou para colonizar massacrando e praticando a política da terra queimada, foi responsável por massacres e enfumades[5] na Argélia; Gallieni, carregado por quatro figuras femininas, das quais três[6] representavam Madagáscar, África e Ásia, instituiu o trabalho forçado e escravo nesses lugares; Faiherbe impôs a lei colonial no Senegal; Marchand fez reinar o terror no Congo. Todos estes homens tornaram-se heróis nacionais, tendo as suas vidas sido dadas como exemplares aos estudantes franceses. Por que processo se tornaram estes homens heróis nacionais? Através destas representações, construindo-se o consentimento para o esclavagismo, o colonialismo e o racismo.

5. Técnica utilizada para asfixiar nativos que se refugiavam em grutas, acendendo fogos à entrada das mesmas, com o intuito de esgotar o oxigénio no interior da gruta [N. do T.].

6. A quarta mulher [presente na estátua] representa Paris, que Gallieni teria salvo durante a primeira guerra mundial, organizando os «táxis do Marne».

Quando deixamos de querer estas representações bélicas, que encenam a submissão ao homem branco a glória do homem esclavagista e colonizador, respondem-nos que eles representam a História, que “a República não desmantelará nenhuma estátua”. Mas quem é esta República que decide que a história não deve ser revista? Que narrativa foi fixada para os séculos por vir? Em certa medida, isto significa dizer-nos: “Vocês não têm a palavra. Vamos dizer-vos quem devem admirar. Vejam, um dos maiores monumentos de Paris, o Arco do Triunfo, é dedicado a quem restabeleceu a escravatura em 1802, quem enviou as suas tropas para esmagar as/os insurgentes guadalupenses que haviam acreditado na abolição da escravatura de 1794, quem enviou as suas tropas a São Domingos para acabar com a Revolução Haitiana (onde sofreram uma derrota, em Vertières, a 18 de Novembro de 1803, facto que raramente é sublinhado!). Esta é a nossa história e vocês não fazem parte”. Somos aceites apenas na condição de não dizer nada, de não exigir justiça, de permanecer invisíveis, e se somos autorizados a falar é de uma forma que respeite as normas do universalismo abstracto: a raça não existe, somos todos francesas e franceses e exigir justiça é promover o separatismo, o comunitarismo.

A estatuária é massivamente masculina e guerreira – das 750 estátuas de Paris, cerca de 50 são mulheres, essencialmente ninfas, rainhas e Joana d’Arc –, mas coloco-me a questão: se as feministas brancas tivessem exigido a substituição de um “grande homem” por uma mulher célebre, teria isso desencadeado tal controvérsia e uma declaração do presidente? O que choca é que “não-brancas/os”, pessoas racializadas e seus cúmplices se permitam a intervir e exigir uma transformação da cultura memorial nas cidades.

As descendentes e os descendentes de escravas/os, de colonizadas/os, de insurgentes, de trabalhadoras/es imigrantes, de mulheres em luta, de povos autóctones, dos Communards[7], todas essas/es que lutaram pela extensão dos direitos, pela liberdade e pela igualdade, não têm direito à cidadania. Alguns oferecem-nos com paternalismo a possibilidade de “contextualizar”. Como? Para Colbert, descreveríamos as torturas que o Código Negro justificava? Para Bugeaud, reconstruiríamos as grutas que enchíamos de fumo? Para Gallieni, acumularíamos centenas de milhares de cadáveres? A solução que consistiria em instalar uma estátua ao lado destas propondo uma outra versão da história (correu o burburinho de uma estátua de Abdelkader ibn Muhieddine próxima da de Bugeaud!) é liberal: não mudamos nada no quadro narrativo, acrescentamos numa lógica aditiva que desfoca os conflitos e as assimetrias.

7. Cidadãs e cidadãos da Comuna de Paris (primeiro governo operário da história, instaurado em Paris entre 18 de Março e 28 de Maio de 1871) [N.do T.].

Derrubar as estátuas é reflectir sobre a memória cultural que queremos construir no espaço público. É o presente que determina que estátuas, que formas de representação no espaço público, que combates, que acções queremos honrar através das pessoas que melhor as representaram. As estátuas de Martin Luther King Jr., de Nelson Mandela, de Queen Nanny, da Mulâtresse Solitude[8], testemunham esta vontade de ver combatentes contra a opressão e o racismo celebradas/os. Mas podemos também imaginar outras formas de representação no espaço público, menos estátuas monumentais de indivíduos e mais representações colectivas, por exemplo.

8. Escrava doméstica que se tornou uma figura histórica da luta contra o esclavagismo em Guadalupe [N.do T.].

O receio de ver “a História” ser “apagada” reflecte, caso seja necessário repeti-lo, uma profunda apreensão, a de confrontar a realidade do racismo estrutural, de examinar aquilo que Aimé Cesaire chamou “o efeito de retorno” do esclavagismo e do colonialismo, ou seja, o regresso a França do racismo que os justificou, assim como a penetração de todas as instituições – culturais, estatais, legislativas, sociais, económicas – por parte do racismo. Este receio reflecte ainda o que Paul Gilroy analisou como sendo uma melancolia pós-colonial, quando os colonizadores não assumem o que se passou (o fim do seu império colonial), e quando não querem lembrar-se dos crimes coloniais, nem das guerras contra a independência, nem das desigualdades e injustiças que estes séculos suscitaram e que continuam a construir o mundo onde vivemos. Mas os povos colonizados e as/os suas/seus descendentes lembram-se. Em França, o governo quis esquecer muito rapidamente o que a pandemia havia posto em evidência de forma flagrante: que a taxa de mortalidade era mais elevada no seio das comunidades racializadas e que são estas que nos permitem que um confinamento seja decretado, indo trabalhar todos os dias sem protecção.

A condenação do desmantelamento de estátuas vai de encontro à radical recusa do governo em reconhecer as violências policiais, o racismo das instituições. Nunca houve um pedido de desculpas digno desse nome, nenhuma indemnização. O Estado detém militantes e acusa-os (após a incriminação dos jovens de Martinica, Franco, porta-voz da Brigada Anti-Negrofobia e autor do acto político levado a cabo sobre a estátua de Colbert, foi detido pelo Comissariado do 7º arrondissement a 23 de Junho. Será julgado a 14 de Agosto). A polícia exige que um mural em Stains, representando Adama Traoré e Georges Floyd sob a frase “Contra o racismo e as violências policiais”, seja pintado por cima; jovens martinicanas aguardam a decisão de um tribunal colonial. Nós continuaremos a reclamar que as estátuas que são insultos à dignidade sejam removidas.

 

 

Françoise Vergès

Françoise Vergès é académica independente, professora e activista feminista decolonial. Entre mais de uma dezena de títulos, publicou recentemente “Un féminisme décolonial” (2019) nas Éditions La Fabrique.

 

Imagens

1. Revolta dos escravos de Carbet, Ilha de Martinica, 1822 (©NOFI).

2. Estátua do Marechal Galliéni, Paris, c.1926 (©Musée d’Orsay, Fonds Debuisson).

3. Anotações na estátua do Marechal Galliéni, Paris, 2020 (©AP Photo/ Christoph Ena).

 

Nota de tradução

O texto original de Françoise Vergès foi publicado no RP Dimanche -suplemento de teoria, política e cultura da rede Révolution Permanente- no dia 28 de Junho de 2020. A presente tradução foi realizada para o Jornal Punkto por Maria Rebelo e João Paupério.

 

Nota de edição

A reflexão de Françoise Vergès que agora se publica em português foi escrita no auge dos acontecimentos que decorreram após o homicídio de George Floyd. Desencadeado pelas circunstâncias, no entanto, este texto procura reflectir não só sobre a legitimidade história, política e simbólica do derrube de estátuas que marcou as revoltas anti-racistas que então se insurgiram, ou sobre como uma confusão deliberada entre memória e história escamoteia as contradições entre o exercício do poder e o direito à cidade. Mas também, e sobretudo, acerca do modo como um mediatismo selectivo -que escolhe visibilizar ou invisibilizar certas acções militantes- estabelece uma hierarquia dos actos políticos, dos que têm e dos que não têm legitimidade para reivindicar os seus direitos, revelando assim a urgência de aprofundar em toda a linha o processo de descolonização em causa. Nesse sentido, e ainda que por razões técnicas a sua tradução se tenha visto adiada, optou-se por manter a sua publicação tardia, mas que se considera conservar toda a sua relevância.

 

 

Ficha Técnica

Data de publicação: 20.09.2020

Edição #28 • Verão 2020 •