La revolución no será televisada? \ Pedro Bismarck




La revolución no será televisada?
Chávez e os aparatos mediáticos
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Uma das grandes ilusões que deslizam silenciosamente pelo nosso quotidiano é a de pensarmos que com o actual “aparato mediático” sabemos tudo aquilo que se passa pelo mundo. O círculo mediático parece ter concretizado esse sonho antigo da humanidade: esse desejo de tornar tudo próximo, isto é, de controlar tudo, mesmo o mais infimamente distante. Mas será a velocidade sinónimo de conhecimento? Terá algum de nós a ilusão que conhece a Europa só porque a sobrevoou duas ou três vezes de avião? Terá algum de nós a convicção que é possível conhecer alguém com quem nos cruzamos duas vezes na rua?
Será preciso admitir, por isso, que talvez não saibamos assim tanto acerca deste suposto mundo que, todos os dias, nos chega através das televisões, dos jornais, da internet. Contudo, a questão que se coloca é que, nunca como hoje, foi o nosso acesso ao real tão dependente desses “aparatos mediáticos”. E, por isso, são eles, hoje mais do que nunca, o palco de uma batalha invisível, mas derradeira, pela posse e manipulação dessas imagens do real (o caso da Venezuela de Chávez mostra isso mesmo).
Se, por um lado, podemos afirmar que a realidade é o que o “aparato mediático” disser que ela é, pois é este que decide o que mostra, quando mostra e como mostra (e isto não supõe nenhuma teoria conspirativa, apenas a constatação que a escolha dessas imagens/fragmentos do real é uma montagem política e ideológica raramente inocente). Por outro lado, a nossa relação com esse aparato é, em si mesma, precária: deixamo-nos ficar pelo imediatismo das imagens, dos ‘headlines’, da leitura acelerada dos artigos. E isso parece ser suficiente, dado o contínuo fluir das imagens, para nos dar uma certa ilusão de conhecimento da realidade.
É sobre esse fundo deslizante e precário (mas não ingénuo) que se ergue a imensa e pantanosa superfície das opiniões individuais e de um terrível senso comum, que move as multidões e as arrasta para o território sem fim da manipulação e da demagogia. Somos demasiado rápidos a dar opiniões, mas raramente reflectimos sobre as condições da sua fundamentação. Teríamos muito a ganhar se o nosso esforço pudesse estar concentrado não tanto na vontade de, a todo o custo, vociferar uma opinião, mas no exercício de inquirir o fundo opaco onde se constrói essa nossa relação com uma realidade que, apesar de parecer caber eterna e fixa no rectângulo de uma imagem, foge-nos como areia fina pelos dedos da mão.
Podemos até confessar um certo desconforto perante o estilo e culto de personagem de Hugo Chávez, mas antes de entrar nesse território pantanoso das opiniões construídas a partir do deslizante “aparato mediático” oficial, talvez fosse mais útil abandonar alguns pré-juízos e compreender qual foi, de facto, o fundo da política de Chávez e da Venezuela nestes últimos anos. E talvez até possa acontecer que isso nos seja bem útil para iluminar uma certa escuridão da nossa condição actual.

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