tag:blogger.com,1999:blog-35496808628731781532024-03-20T12:27:38.157-07:00PUNKTOPUNKTO IS AN UN-DISCIPLINED JOURNAL ABOUT LIMITS: OF PRACTICE, OF THEORY, OF POLITICS AND ARCHITECTURE AND IS BASED IN PORTO, PORTUGALPunktohttp://www.blogger.com/profile/07165794378697047848noreply@blogger.comBlogger550125tag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-63380688033148172062024-03-19T11:58:00.000-07:002024-03-20T12:27:06.325-07:00Je est un autre: a persistência do desejo fascista • Paulo Ávila<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjTpIH6Ki1a3L-jrMySgxNOSqUnViXCDD340RnqxQ8E2inuPsDPI3FfD41H0AyNywCPaUjyLx8cpBNRo9_3putAiT_pXrfa6Aovnin8HEiEgHJzP-PICk1vweocjPN_l0SAtZd76cRORPMlJdziB6tvUwfljHbEN18HGq-MDUwKZ4ADfnRFRiNImHlBp0DG/s1976/imagem_pasolini%20(1).jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1334" data-original-width="1976" height="381" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjTpIH6Ki1a3L-jrMySgxNOSqUnViXCDD340RnqxQ8E2inuPsDPI3FfD41H0AyNywCPaUjyLx8cpBNRo9_3putAiT_pXrfa6Aovnin8HEiEgHJzP-PICk1vweocjPN_l0SAtZd76cRORPMlJdziB6tvUwfljHbEN18HGq-MDUwKZ4ADfnRFRiNImHlBp0DG/w565-h381/imagem_pasolini%20(1).jpg" width="565" /></a></div><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Mergulhando no universo das elaborações em
torno do fascismo, será hoje indispensável voltar ao livro que viria a ser
descrito, num prefácio de Michel Foucault, como uma<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>«introdução à vida não fascista». O que nos
propôs o <i>Anti-Édipo</i> foi uma viagem além das concepções «históricas» do
fascismo, enquanto movimento localizável no tempo e no espaço (de Hitler a
Mussolini), para começar a compreendê-lo como matéria de <i>desejo</i> — um fenómeno
que atravessa cada um de nós, que persiste em estado latente, incrustado no
pensamento, reproduzido numa infinidade de comportamentos quotidianos; para
Foucault, aquilo «que martela os nossos espíritos, o fascismo que nos faz
desejar o poder, desejar esta coisa que nos domina e nos explora»; </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[1]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">trata-se do fascismo
molecular, o húmus psico-social que germinou o fascismo histórico, mas que não
começou com a sua emergência, nem tão pouco se extinguiu com a sua derrota.
Compreender o fascismo como fenómeno do <i>desejo</i> passa por abandonar a
crença na inocência das massas; por recusar a ideia de que a vasta adesão a
esses movimentos possa ser explicada por truques de ilusionismo ou pelo medo da
repressão. O que Deleuze e Guattari nos propõem, partindo de Reich, é que as
massas não foram ingénuas, não foram atraiçoadas por líderes carismáticos e
mentirosos. As massas <i>desejaram </i>o fascismo. Não se trata de negar que a
ilusão tenha tido um papel, ou de implicar que cada indivíduo tenha almejado
conscientemente a violência que esses regimes fariam abater sobre os outros e,
em última instância, sobre si mesmos. Trata-se antes de reconhecer que a sua
dimensão e a sua violência, como de resto, a de todos os grandes movimentos de
massas, não pode ser compreendida sem atender a uma <i>economia do desejo</i>
em que surgiram, e que souberam mobilizar em seu favor.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 13.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 13pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">1. Michel Foucault.
Prefácio à edição americana de <i>L’anti-Œdipe. Capitalisme et schizophrénie</i>,
de Gilles Deleuze e Félix Guattari.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Olhando para o caso português, uma aproximação
à natureza do regime salazarista não se pode restringir às instituições
centralizadas de repressão e de propaganda. É preciso compreender como esse
regime se apropriou de uma subjectividade cultivada durante séculos pela
Igreja, para investir todo o campo social de uma paixão lasciva pela servidão,
pela denúncia e pelo castigo, toda uma rizomática da vigilância permanente, que
avançou pelas cidades até às aldeias mais remotas, penetrando cada grupo, cada
família, cada indivíduo, cobrindo todos os corpos e cada uma das suas partes. O
salazarismo não teria sobrevivido sem a capilaridade da sua rede de «chibos»
voluntários; toda uma atmosfera social em que cada um era incitado a observar o
seu vizinho, a apontar cada acto «suspeito», cada excentricidade, cada desvio
da norma; uma espionagem disseminada cuja motivação não ia, tantas vezes, além
do simples prazer mesquinho da coscuvilhice, do controlo, da repressão do <i>outro</i>
e de si mesmo. Na mesma medida em que essa produção já era anterior ao
salazarismo, também é preciso entender que ela não se extinguiu com a sua
queda, subsistindo hoje de forma molecular, vincada nos nossos corpos e nos
nossos hábitos, e tão pouco foi preciso André Ventura para reacendê-la. Já
Passos Coelho encarnara a figura de um autêntico messias da castração,
rentabilizando habilmente esse desejo pervertido de tomar as rédeas do próprio
castigo, essa ânsia de ir além do capataz, de «apertar o cinto», de ir «além da
troika»; uma tendência que o governo «de esquerda» esteve longe de contrariar,
sob o espectro do «bom aluno» Mário Centeno. Também não é por acaso que foi
justamente do círculo de Passos Coelho que emanou a figura de André Ventura, o
mesmo homem que usou cilício para auto-infligir danos corporais na sua passagem
pelo seminário. Pois como pode ainda surpreender-nos o seu êxito num país onde
os estudantes faltam às aulas para se submeterem em massa à humilhação da
praxe? O desejo fascizante está por toda a parte, desde o neonazi, com os seus
sonhos molhados de ser o cão de caça do capital, até ao estagiário que vigia o
colega e se humilha diariamente por uma recompensa que não passa, tantas vezes,
de uma palmadinha nas costas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Guattari destacou a eficiência distintiva do
nazismo na captura de uma <i>energia libidinal</i> </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[2]
</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">que lhe concedia a capacidade de penetrar
todas as células da sociedade. Terá sido essa vantagem a seduzir os industriais
alemães, que não viram noutras formas totalitárias a mesma promessa repressiva
que o partido nacional-socialista, articulado com os seus bandos semioficiais,
lhes apresentava. O que os capitalistas não previram foi a potência destrutiva
que estavam prestes a libertar; uma <i>máquina louca</i> que seria mais ameaçadora
para o seu domínio do que a própria Revolução de Outubro. O <i>desejo</i>, em
Deleuze e Guattari, tem mais a ver com economia do que com ideologia — ele é «pura
matéria, um fenómeno da matéria física, biológica, psíquica, social ou cósmica».
</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[3] </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Desejo seria também o
propulsor desse movimento niilista, em aceleração perpétua, que Deleuze apontou
como condição da sobrevivência do nazismo:</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;"> [4]<span style="mso-spacerun: yes;"> </span></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">a <i>máquina
de guerra</i> nazi, alimentada por uma exasperação que a iminência da derrota só
veio intensificar; passando da «Economia de Guerra» à «Guerra Total», aos
discursos sacrificiais de Goebbels: e enfim coroada com o último telegrama de
Hitler — «Se a guerra está perdida, que a nação pereça» <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>—, onde o <i>führer </i>ordenou ao exército
que obliterasse as próprias infra-estruturas e reservas civis, unindo-se ao
inimigo para consumar<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>a extinção do próprio
povo.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 1pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">2. Félix Guattari. <i>A
Revolução Molecular: Pulsações Políticas do Desejo. </i><o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 1pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">3. Gilles Deleuze e
Felix Guattari. <i>Mille Plateaux. Capitalisme et schizophrénie</i>. <o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 13.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 13pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">4. Gilles Deleuze. <i>Sur
Anti-Oedipe et d’autres réflexions.<o:p></o:p></i></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">O destino suicida, que as massas alemãs abraçaram
desde o início, não estava apenas anunciado nos discursos fulminantes do
nazismo. Era reconhecível nas próprias transformações que este operou na
economia, na substituição gradual dos meios de produção por meios de destruição.
</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[5] </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Pois o que levou, então,
as massas a abraçarem esse projecto, não só assassino, como suicidário? Num
texto publicado recentemente no <i>Punkto, </i></span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[6]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> Toni Negri realçava como a palavra de ordem do fascismo —
o «Viva a Morte!» — se oculta sob o véu de «necessidade de espírito» e da «obrigação
moral». Também Deleuze e Guattari reconheceram que a máquina fascista não podia
sobreviver à exposição crua da sua violência e do seu absurdo, ao admitirem que
«até o mais descarado fascismo fala a linguagem dos objectivos, da lei, da
ordem e da razão», assim como «o mais insano capitalista fala em nome da
racionalidade económica» </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[7]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">.
Basta-nos recordar o historial de pedofilia e de abusos sexuais praticados sob
a protecção da Igreja para admitir como a mais rígida máscara moral serve
tantas vezes para ocultar justamente os impulsos mais doentios e perversos.
Pois, também hoje constatamos como os neofascistas mais delirantes não ousam
prescindir desses eternos chavões. Falam de «Lei e Ordem» (ao mesmo tempo que
pregam o caos), do «combate à corrupção» (que praticam à vista de todos), ou de
«valores tradicionais» (que desprezam abertamente). Pese, no entanto, a
imprescindibilidade do véu com que se cobrem, não deixa de ser reconhecível a
sua escassa opacidade — lembremos os dolorosos <i>zig-zags</i> mediáticos
durante a primeira campanha de Trump quando, a cada incoerência flagrante, a
cada escândalo sexual, a cada traição ao seu próprio discurso, se profetizava
uma quebra de popularidade que nunca se veio a verificar. Oito anos passados,
incorremos na mesma armadilha em Portugal quando, precipitados pelas sondagens,
decretámos o fracasso do partido de Ventura.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 1pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">5. Gilles Deleuze e
Félix Guattari. <i>Mille Plateaux. Capitalisme et schizophrénie.</i><o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 1pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">6. <a href="https://www.revistapunkto.com/2024/02/que-eternidade-nos-abrace-toni-negri.html"><span style="color: #97694b; text-decoration: none; text-underline: none;">Toni Negri. <i>Que
a Eternidade dos Abrace.</i></span></a><o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 13.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 13pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">7. Gilles Deleuze e
Felix Guattari.<i> L’anti-Œdipe. Capitalisme et schizophrénie.</i><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">A nossa vulnerabilidade a estes equívocos
revela uma inépcia generalizada em compreender o fenómeno do neofascismo
contemporâneo. Refugiamo-nos na expectativa de que seja passageiro, que se
dissipe assim que a mentira seja descoberta, ou que a hipocrisia dos seus líderes
seja exposta. Continuamos a crer que as massas são ingénuas e que se encantaram
com essa débil máscara moral do fascismo; tudo isto para não admitir que o que
as seduz não é a máscara, mas justamente o que ela deixa transparecer — a
promessa de uma tirania democratizada, de uma repressão sem limites, a cada
instante insinuada no subtexto, na retórica, na gestualidade codificada, na
proliferação dos <i>dog whistles</i>: dos fuzis imaginários de Bolsonaro aos
rostos rasurados nos cartazes do Chega. Deleuze reconheceu no fascismo a
promessa da morte do outro, mas a morte do outro «coroada» com a própria morte.
</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[8] </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Na <i>Revolução
Molecular</i>, Guattari realçou como «Hitler e os nazis lutavam pela morte,
incluindo, e sobretudo, pela morte da Alemanha». </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[9] </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">O «judeu», o «cigano», o «eslavo», o «bolchevique», ficções
levantadas como entraves à realização da utopia ariana, comportariam assim
outro sentido obscuro: o de re-territorializar em grupos sociais delimitáveis
uma pulsão de morte colectiva e efervescente, sem nenhum horizonte além da pura
destruição — uma <i>linha de fuga</i> intensa convertida em linha de morte e
abolição.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 1pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">8. Gilles Deleuze. <i>Seminar
on Anti-Oedipus and Other Reflections,</i> 1980. Conferência 1, 27 de Maio de 1980.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 13.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 13pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">9. Félix Guattari. <i>A
Revolução Molecular: Pulsações Políticas do Desejo</i>.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Partindo da imagem desse impulso incendiário
que se auto-consome, para descrever o espectáculo mediático a que hoje
assistimos, será pertinente recuperar o que Pedro Levi Bismarck escreveu em
2016 sobre a cobertura dos incêndios em Portugal: «O segredo do seu fascínio é
a secreta e irreprimível complacência que une os espectadores». </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[1o]
</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Do mesmo modo, a extraordinária simbiose
entre os meios de comunicação de massas e o neofascismo não seria possível sem
as paixões massificadas e subterrâneas que a mobilizam e lhe servem de combustível;
o magma de amor e repulsa que faz detonar as audiências, e para onde fluem as
nossas <i>paixões tristes,</i> o nosso <i>ressentimento,</i> todo o nosso
desejo colectivo, secreto e mortificado, de ver «o mundo a arder», de assistir
enfim ao eclipse fulminante de uma vida desprovida de intensidade, na qual nada
de novo parece realmente acontecer. É partindo desta dinâmica transversal e recíproca
que podemos reconhecer o nosso grande equívoco, quando repetimos que «eles não
passarão», traçando assim uma fronteira ilusória entre um <i>eles</i> e um <i>nós,</i>
um <i>fora,</i> onde o fascismo existiria, e um dentro que lhe seria
necessariamente antagónico. Pois é justamente da criação de um mundo oposto e
exterior que nasce aquilo a que Nietzsche chamou a «moral dos escravos»,</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[11]
</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">a moral daqueles que dizem que «o <i>outro</i>
é mau, portanto eu sou bom» para assim elegerem a reacção, ou a negação, como o
seu único princípio motor.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 1pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">10. <a href="https://www.revistapunkto.com/2016/08/o-tempo-dos-incendios-pedro-levi.html"><span style="color: #97694b; text-decoration: none; text-underline: none;">Pedro Levi
Bismarck, <i>O tempo dos incêndios.</i></span></a><o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 13.0pt; margin-left: 269.35pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 13pt 269.35pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">11. Friedrich Nietzsche,
<i>Zur Genealogie der Moral.</i><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Talvez seja esta a irónica tragédia que nos
anunciam estes 50 anos da Revolução de Abril. Ela não está apenas no facto de
sermos presenteados com cinquenta deputados fascistas nas celebrações oficiais.
Está, sobretudo, na chance envenenada, oferecida por Ventura a cada um de nós,
de se comprazer com a sua ilusória oposição face a algo que não é senão o <i>nosso
</i>tenebroso reflexo — a triste autobiografia de um país que há muito deixou
capturar, pela mão estranguladora do mercado, aquele desejo que Abril libertou.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Paulo
Ávila<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Paulo
Ávila (1994) é arquitecto pela Faculdade de Arquitectura da Universidade do
Porto. Colabora com o Jornal Punkto desde 2017.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Salò
ou os 120 Dias de Sodoma</span></i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">, Pasolini, 1976.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«<i>Je
est un autre:</i> a persistência do desejo fascista» • Paulo Ávila<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 19.03.2024<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#41 • Inverno 2024</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-77665384190178811752024-03-05T11:06:00.000-08:002024-03-05T11:22:55.793-08:00«O canteiro e o Desenho» de Sérgio Ferro • Bernardo Amaral & Joana Vieira da Silva<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh76rpQ8rYWhL8UCShQpCK_0Vf9KAVqPRGod_JNDJypYBGS6tmJazehY2KV5rQy9SeTjp3DtxoHpCYeR0x6wpTi4GBAUh5G2IBLpqhPYVjSs88MTOAy7q6Sq3I-wnHQlclE2pkQgMO2mKm1xLFgZv_ntTh_XrpTejpmLShk1Xiy4MCBy7lpB94yXV61c_-p/s4515/EA16_Dafne_Zammataro_Foto%20Fernando%20Santkuns.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="3010" data-original-width="4515" height="395" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh76rpQ8rYWhL8UCShQpCK_0Vf9KAVqPRGod_JNDJypYBGS6tmJazehY2KV5rQy9SeTjp3DtxoHpCYeR0x6wpTi4GBAUh5G2IBLpqhPYVjSs88MTOAy7q6Sq3I-wnHQlclE2pkQgMO2mKm1xLFgZv_ntTh_XrpTejpmLShk1Xiy4MCBy7lpB94yXV61c_-p/w594-h395/EA16_Dafne_Zammataro_Foto%20Fernando%20Santkuns.jpg" width="594" /></a></div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 10pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">No texto <i>O Canteiro e o Desenho,</i> que
aqui publicamos pela primeira vez em Portugal,</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[1]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Sérgio Ferro
formula a crítica do «desenho separado» e revela como o desenho de
arquitectura, desde as suas origens, imprime uma separação gradual entre a
autoria do projecto e o estaleiro de obras, desconsiderando as condições
materiais e laborais de produção. Para enquadrar o texto fizemos uma longa
entrevista ao autor. Quando o visitámos na sua casa no sul de França fomos
calorosamente recebidos pela família e amigos, com quem tivemos a oportunidade
de conviver. À chegada, e antes de nos sentarmos a conversar, Sérgio Ferro
fez-nos uma visita guiada à casa, um antigo estábulo que tem vindo a reabilitar
com um pedreiro local. As paredes em alvenaria de pedra aparente, o pavimento
em cimento queimado, a nova estrutura em aço, os espaços amplos e luminosos,
reflectiam a «poética da economia», um dos princípios que modelam a sua obra.
As marcas do trabalho manual, evidentes na obra final, são fruto de uma
colaboração horizontal entre arquitecto e construtor, um princípio que o autor
sempre reclamou na sua obra prática e teórica.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 15.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 15pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">1.</span><span style="color: #97694b; font-size: 10pt;"> </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">Publicado originalmente em 1976, em duas
partes na revista brasileira <i>Almanaque</i>, foi reeditado em livro pela
Editora Projeto em 1979 e numa segunda edição em 2005. Também em 2005 saiu a
tradução francesa nas Éditions La Villette sob o título <i>Dessin/Chantier</i>
e, em 2006, o texto integrou a antologia <i>Arquitetura e Trabalho Livre</i>,
editada por Pedro Arantes e publicada pela Cosac Naify.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 10pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Sérgio Ferro nasceu em Curitiba, no Brasil, e
formou-se na Faculdade de Arquitectura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
(FAUUSP) em 1962. Ainda estudante, fez os seus primeiros projectos de
arquitectura para Brasília, cidade então em construção e onde a violência que
se exercia no trabalho e nos estaleiros de obra o marcou profundamente.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[2]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> Com os colegas Rodrigo Lefèvre e Flávio Império formou o
colectivo Arquitetura Nova, que se dedicou a projectos de escolas e de casas
unifamiliares, em cujos canteiros testaram novas relações de produção.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[3]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> Recém-formado, Ferro leccionou História da Arte e
Estética na FAUUSP, mantendo uma intensa actividade de projecto e pintura.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[4]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> A força repressiva da ditadura militar que se instalou
no Brasil em 1964 acabou por impor a separação do grupo, com a prisão de Ferro
e de Lefèvre, que entretanto tinham integrado a resistência armada. Ao obter a
liberdade condicional, Sérgio Ferro exilou-se em França em 1972 e leccionou na
École Nationale Supérieure d’Architecture de Grenoble até 2003. Foi aí que
fundou o laboratório de investigação em arquitectura e construção <i>Dessin/Chantier</i>,
que funcionou sob sua direcção entre 1982 e 1997.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[5]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> Tendo deixado de projectar, Ferro dedicou-se à docência,
à pintura e à investigação, continuando sempre a escrever e a publicar sobre
arquitectura e artes plásticas.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[6]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 3.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 3pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">2. Ver também: André
Tavares<i>, Novela Bufa do Ufanismo em Concreto</i>, Dafne Editora, 2009, pp.
133-134.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 3.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 3pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">3. O nome
consolidou-se a partir do título do ensaio de Sérgio Ferro “Arquitetura Nova”,
publicado em 1967 na revista <i>Teoria e Prática </i>n.º 1 e reeditado
posteriormente em <i>Arte em Revista</i> n.º 4 (1980), em <i>Espaço e Debate</i>
n.º 40 (1997) e em <i>Arquitetura e Trabalho Livre</i>, supra n. 1. A propósito
do trabalho do grupo Arquitetura Nova ver: Pedro Arantes <i>Arquitetura Nova: Sérgio
Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefévre, de Artigas aos mutirões</i>, São
Paulo: Editora 34, 2002; Ana Paula Koury<i> Grupo Arquitetura Nova: Flávio Império,
Rodrigo Lefévre e Sérgio Ferro</i>, São Paulo: Edusp, 2003.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 3.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 3pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">5. Os trabalhos
desenvolvidos no <i>Dessin/Chantier,</i><span style="mso-spacerun: yes;">
</span>ou em português Desenho/Canteiro, faziam uma abordagem<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>historiográfica da arquitectura a partir da
análise das relações e condições de produção no estaleiros de obra. O livro Le
Corbusier: <i>Le couvent de La Tourette, </i>organizado por Sérgio Ferro, Chérif
Kebbal, Philippe Potié e Cyrille Simonnet (Marselha, Parenthèses, 1987),
regista uma síntese do primeiro trabalho de investigação do laboratório.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 15.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 15pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">6.</span> <span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">Entre as suas publicações
mais recentes destacam-se <i>A construção do desenho clássico</i> (Belo
Horizonte: MOM Edições, 2021) e <i>Artes plásticas e trabalho livre II: De
Manet ao cubismo analítico</i> (São Paulo: Editora 34, 2022).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 10pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Nos últimos anos, a obra de Sérgio Ferro tem
vindo a ser progressivamente reconhecida e valorizada, com várias iniciativas
internacionais de divulgação e de promoção do debate em torno do seu trabalho.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[7]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Neste contexto,
destaca-se o <i>projecto TF/TK – Translating Ferro/Transforming Knowledges,</i>
que decorreu entre 2020 e 2024<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>com o
objectivo de traduzir e disseminar a sua obra teórica em inglês.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[8]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> Com a presente edição, participamos no actual movimento
de divulgação do pensamento de Sérgio Ferro, publicando o ensaio mais
representativo de uma obra incontornável para o campo da arquitectura.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 3.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 3pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">7. É o caso da
exposição sobre o grupo Arquitetura Nova, convidado de honra da Bienal de
Arquitectura de Órleans, em 2019, <i>intitulada Des rêves vus de près</i> com
curadoria de Davide Sacconi, ou de publicações como <i>Bauen als freie Arbeit:
Lina Bo Bardi und die Grupo Arquitetura Nova</i>, de Richard Zemp (Berlim: Dom
Publishers, 2021) ou a entrevista por Mariana Meneguetti publicada em Fevereiro
de 2023 pela revista <i>The Architectural Review</i>. O reavivar do interesse
pela sua obra foi impulsionado pelas publicações de Pedro Arantes e Ana Paula
Koury em 2002 e 2003 (supra n. 4) e da antologia de textos organizado por
Arantes em 2006 (supra n.1).<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 15.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 15pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">8. <i>Translating
Ferro/Transforming Knowledges of Architecture, Design and Labour for the New
Field of Production Studies</i>, ou na versão em Português <i>Traduzindo
Ferro/Transformando Conhecimentos em Arquitetura, Projeto e Trabalho para um
novo campo de Estudos da Produção</i>, é uma colaboração entre a Universidade
de Newcastle, a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade de São
Paulo, coordenado por Katie Loyd Thomas e João Marcos Lopes.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 10pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">O <i>Canteiro e o Desenho</i> foi escrito há
cerca de cinquenta anos, mas mantém ainda a sua força, originalidade e lucidez.
É um ensaio denso e hermético, inscrito num plano conceptual que integra várias
áreas disciplinares.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[9]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> No sentido de contextualizar a sua recepção e
clarificar a sua formulação, este livro inclui uma longa entrevista com o autor
que tivemos oportunidade de realizar no âmbito dos nossos trabalhos de
investigação.</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[10]</span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>O texto resulta da edição de duas conversas na
sua casa em Grignan, na Primavera de 2019. As transcrições foram revistas por
Ferro, que as aprofundou com novos comentários, identificados nesta edição como
«nota do autor». O conteúdo abrangente e polivalente das entrevistas foi
agrupado em cinco temas, enunciados a partir de questões que consideramos
estruturantes da sua perspectiva crítica. Ambos os textos – entrevista e ensaio
– foram redigidos em português europeu, deixando em nota certas expressões
originais que consideramos indispensáveis. A excepção a essa regra foi a
palavra <i>canteiro</i>, termo brasileiro para <i>estaleiro de obras</i> que,
por integrar o título do ensaio e marcar a identidade do livro, manteve a sua
grafia original. Para dar imagem às palavras de Sérgio Ferro, incluímos também
o valioso registo fotográfico por Fernando Stankuns de duas casas projectadas
pelo grupo Arquitetura Nova, cujos canteiros foram experiências fundamentais
para o ensaio crítico aqui publicado.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 3.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 3pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">9. Em parte, o
hermetismo do texto chegou a ser justificado por Ferro como recurso para fintar
a censura existente na época da sua escrita.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 15.0pt; margin-left: 241.0pt; margin-right: -28.4pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -28.4pt 15pt 241pt; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">10. Em 2019,
estavam em preparação as teses de doutoramento <i>Funções do desenho de
arquitetura,</i> de Joana Vieira da Silva sob orientação de Silke Kapp e
co-orientação de Jorge Marques, defendida em 2021 na Escola de Arquitetura da
Universidade Federal de Minas Gerais e, <i>Do direito à arquitectura ao direito
à habitação</i>, de Bernardo Amaral sob orientação de Paulo Providência e
co-orientação de Tiago Castela, a defender em 2024 na Universidade de Coimbra.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Em <i>O canteiro e o desenho</i>, redigido já
depois de se refugiar em Grenoble, Ferro elaborou uma teoria crítica da
arquitectura, sintetizando a experiência vivida no Brasil como arquitecto e
professor. Ferro mobilizou a crítica da economia política e conceitos-chave
cunhados por Karl Marx em <i>O Capital</i>, e estruturou o texto a partir do
método dialéctico. O autor revela a contradição que a própria arquitectura
encerra: a separação entre canteiro e desenho, ou entre obra e projecto. Como
anuncia no título, Ferro começa por analisar o canteiro de obras, pondo em
evidência esse lugar «invisível» da produção arquitectónica. O autor observa os
processos de dominação a que são sujeitos os trabalhadores, manifestos na falta
de autonomia e articulação entre as várias equipas de construção que se limitam
a executar tarefas sem poderem colaborar entre si e desenvolver o seu
saber-fazer. Ao revelar o que acontece quando um desenho é construído, mostra
como o processo de trabalho na arquitectura é determinado pela divisão social
do trabalho entre quem concebe e quem constrói. Ferro indica que essa divisão é
instituída pelo «desenho separado», promovendo um corte com o estaleiro e com
as suas condições de trabalho, no plano social, político, técnico e artístico. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">O autor recua cinco séculos, até à emergência
do arquitecto moderno e aos fundamentos da arquitectura como <i>cosa mentale,</i>
para situar o momento histórico em que a concepção se separou da construção.
Com a entrada em cena do desenho separado dos processos construtivos, o
projecto passou a incorporar uma linguagem estranha aos construtores,
afastando-se progressivamente da sua anterior lógica produtiva e servindo assim
à subordinação do trabalho nos canteiros de obra. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">Com este horizonte crítico, Sérgio Ferro põe
um dedo na ferida da arquitectura como disciplina autónoma, situando-a no
universo da indústria da construção e no cerne do sistema de produção
capitalista. Entendida a partir do seu papel económico, isto é, como uma
mercadoria, a arquitectura serve-se do desenho como prescrição, transformando
os construtores em meros executantes e suprimindo o saber-fazer intrínseco à
arte da construção. Para superar a separação histórica entre desenho e
estaleiro, Ferro sugere que a arquitectura elabore um «desenho da obra» e não
um «desenho para a obra», isto é, um projecto que coordena o processo
construtivo. Uma colaboração entre projectistas e construtores que promova a
autonomia técnica e funcional de cada equipa especializada, permitindo a
incorporação do seu saber-fazer e uma coordenação horizontal e orgânica, «como
numa banda de jazz».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 63.8pt; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 63.8pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 30pt; line-height: 115%; mso-themecolor: text1;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Bernardo Amaral & Joana Vieira da Silva<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Bernardo Amaral é arquitecto pela Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto (2004) e doutorando no Departamento de Arquitectura da
Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra. A sua investigação centra-se
na análise crítica da arquitectura no contexto dos movimentos pelo direito à
habitação. Desde 2010 coordena o gabinete de arquitectura BAAU. É professor de
pós-graduação na Escola Superior Artística do Porto e no curso de Arquitectura
e Urbanismo da Universidade Portucalense.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Joana Vieira da Silva é arquitecta pela Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto (2007). Faz parte do grupo MOM (Morar de Outras Maneiras)
da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, onde defendeu
o seu doutoramento (2021). Tem trabalhado e escrito sobre políticas urbanas, a
construção das favelas brasileiras e os papéis do desenho na arquitectura. É
actualmente arquitecta na Câmara Municipal de Gondomar e professora no curso de
Arquitectura e Urbanismo da Universidade Portucalense.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Nota da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">O texto que aqui publicamos corresponde à «Introdução» do livro <i>O
canteiro e o desenho</i> editado por Bernardo Amaral e Joana Vieira da Silva,
publicado pela primeira vez em Portugal pela mão da </span><a href="https://dafne.pt/noticias/o-canteiro-e-o-desenho/"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Dafne</span></a><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">. A<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>presente edição inclui, para além do texto original
publicado em 1976 que dá nome ao livro, uma extensa entrevista realizada pelos
autores a Sérgio Ferro. O livro será lançado no próximo dia 9 de Março na Casa
da Arquitectura, em Matosinhos, às 18h, e no dia 9 de Abril em Lisboa, pelas
18h30, na Livraria da Travessa. Passará ainda por Newcastle, a 25 de Março, no
contexto da conferência internacional <i>Production Studies, </i>onde será igualmente
apresentado, contando com a presença de Sérgio Ferro.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Casa Dino Zammataro, Butantã, São Paulo, 1970. Fotografia Fernando
Stankuns, 2020<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Ficha Técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">«“O Canteiro e o Desenho” de Sérgio Ferro» • Bernardo Amaral &
Joana Vieira da Silva<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Data de publicação: 05. 03.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Edição #41 • Inverno 2024 •</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-46938515753589429832024-02-26T14:30:00.000-08:002024-02-27T14:19:00.197-08:00Palestina — Diário Retrospectivo • Paulo Ávila<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25.0pt; line-height: 150%;">•<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">«Palestina — Diário Retrospectivo» é um artigo <i>em construção</i>
onde se reúnem reflexões pontuais, livres da obrigação cronológica e da
actualidade, dirigindo a atenção aos detalhes, imagens e testemunhos, à relação
entre os discursos e os acontecimentos, e outros aspectos que tenham passado
despercebidos, esquecidos ou ofuscados pelas grandes narrativas.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25.0pt; line-height: 150%;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><b></b></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><b><br /></b></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><b><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjxZ3ErkKCCOG2HyzgkJ2S1GMERzbi76DE7-RM3KD8-PxksKf2aydrB8XCxPUZlLFz9QMlz40oIgtc6kSJBcRgmXuER-s93UHPRywpjRrHfqWQP03xn3VgXW2fqxHGtwWeSDRR6qDOll4OnujNcnug3rv7aADjtpAjRWOE-EWpUY9oZs9x79uggllOmLRmo/s2558/img_texto.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1474" data-original-width="2558" height="333" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjxZ3ErkKCCOG2HyzgkJ2S1GMERzbi76DE7-RM3KD8-PxksKf2aydrB8XCxPUZlLFz9QMlz40oIgtc6kSJBcRgmXuER-s93UHPRywpjRrHfqWQP03xn3VgXW2fqxHGtwWeSDRR6qDOll4OnujNcnug3rv7aADjtpAjRWOE-EWpUY9oZs9x79uggllOmLRmo/w580-h333/img_texto.png" width="580" /></a></b></div><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;"><br /></span></b><p></p><p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">16
de Julho de 2014<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Na
imagem, quatro “figuras” correm na praia após um míssil ter atingido o pequeno
porto da Cidade de Gaza. Vários jornalistas que acompanhavam aquela que veio a
ser conhecida como “Operação Margem Protectora”, entre os quais Peter Beaumont
(<i>The Guardian</i>), estavam hospedados em hotéis nas proximidades, de onde
testemunharam a explosão. Beaumont escreveu que, apesar da distância, não
duvidou que eram crianças a correr na praia, uma percepção partilhada por
outras testemunhas que assim exclamaram quando assistiram à detonação de um
segundo míssil, desta vez sobre as “figuras” que se debatiam por alcançar a
segurança do Hotel Al-Deira.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Foi
assim que, em poucos segundos, a família Bakr perdeu Ismail (9 anos), Ahed
(10), Zakariya (10), e Muhammad (11), em mais um dos incontáveis “incidentes”
em que a destacada tecnologia militar israelita se revelou, aparentemente,
obsoleta na hora de distinguir civis de alvos militares. Em plena luz do dia, a
câmara do <i>drone </i>não terá sido eficaz a distinguir crianças que jogavam
futebol na praia dos supostos comandos navais do Hamas que, segundo o porta-voz
da FDI à altura, Peter Lerner, se preparavam para reunir no que parecia ser uma
cabana de pesca — alegadamente, um “complexo militar”. Ainda que na ausência de
perigo iminente, e apesar de não ter sido possível, segundo o próprio,
averiguar a identidade destas “figuras”, os operadores decidiram disparar, não
uma, mas duas vezes sobre elas. A possibilidade de massacrar um grupo de
crianças, literalmente aos olhos da imprensa internacional e sem sofrer
consequências, é bem ilustrativa da impunidade patente na relação das forças
israelitas com civis palestinianos. As alegações de que as crianças foram confundidas
com “comandos navais” e de que a cabana de pesca era afinal um “complexo
militar” foram suficientes para que a auto-investigação conduzida pelas
autoridades responsáveis culminasse — imagine-se — na sua auto-exoneração.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Sendo
verdade que, depois dos ataques de 7 de Outubro, não foram poucos os oficiais
israelitas a engendrar uma retórica explicitamente genocida, não tem sido menos
perturbador assistir à persistência de outros em preservar, contra todas as
evidências, o que resta do verniz de civilização e de moralidade do Estado que
representam. Será mais perigoso o ministro de extrema-direita Amihai Eliyahu,
quando admite a hipótese de lançar uma bomba atómica em Gaza, ou o porta-voz
Richard Hecht, que após reconhecer o bombardeamento de uma zona densamente
povoada, em Jabalia, declara que tudo está a ser feito para prevenir a mortes
de civis? O segundo traz-nos à memória as palavras de Daniel Hagari, citadas na
primeira entrada deste diário, sobre a liberdade de imprensa em Israel, logo
após se “desculpar” pela morte da jornalista Shireen Abu Akleh.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Em
entrevista, no (entretanto cancelado) programa de Mehdi Hasan, o conselheiro
sénior de Netanyahu, Mark Regev, declarou que em última instância a operação
“Espada de Ferro” seria benéfica para o povo de Gaza, nas suas palavras, por
este “merecer melhor do que o terrível, autoritário e extremo regime do Hamas”.
À altura da entrevista, o número de mortes civis causadas pela operação,
divulgado pelo Ministério da Saúde de Gaza, superava os 11.000, dos quais mais
de 4.000 crianças — números que o conselheiro descartou sem hesitações por
serem “do Hamas”, embora tenha reconhecido na mesma entrevista que os números,
apresentados pelo seu governo para as vítimas do 7 de Outubro, tinham sido
exagerados, levando à revisão de 1.400 para 1.200 vítimas. Segundo o próprio,
esse “erro de contagem” decorreu da contabilização de corpos carbonizados que
afinal pertenciam a “terroristas do Hamas” — uma explicação enigmática, que
logrou apenas levantar mais dúvidas: estaria o conselheiro a sugerir que as FDI
admitiam, até então, ter massacrado 200 dos seus próprios civis? Ou ter-se-iam
os militantes auto-incinerado? Infelizmente, o tempo de entrevista seria sempre
insuficiente para tantas questões. Neste caso, Mehdi Hasan optou antes por
interpelá-lo quanto ao (não menos bizarro) caso do “erro de tradução” — o vídeo
em que Daniel Hagari tentou fazer passar um calendário árabe por uma lista de
guarda dos “terroristas do Hamas”, justificando o ataque ao Hospital Pediátrico
de Al-Rantisi.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Numa
primeira leitura, a profusão inconsistente de desinformação, de justificações
erráticas e mentiras primárias poderia levar-nos a interpretar o aparente
amadorismo e a falta de credibilidade dos oficiais israelitas como resultados
previsíveis de décadas de impunidade, em que a cobertura política e mediática
do Ocidente sempre os isentou de grandes elaborações na justificação dos seus
“erros” frequentes ou na fabricação de mentiras sólidas para os encobrir. Por
outro lado, o modo como essa trama de contradições se reproduz nos media
ocidentais, prolongando-se no discurso dos seus aliados, permite-nos entrever,
no que parece ser um discurso caótico, um sentido estratégico mais abrangente —
o mesmo sentido que sobressaiu, com particular clareza, nas afirmações
erráticas de Donald Trump e dos seus variados clones pelo mundo, que não se
limitaram a emitir sinais contraditórios, mas mobilizaram exércitos de <i>bots</i>
para contaminar as redes sociais com desinformação. Quando nos ocupamos em
expor as mentiras e as incongruências desse discurso, continua a escapar-nos
que é justamente a partir da incoerência radical que ele constrói a sua
estratégia mediática.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Qual
é o objetivo da lynchiana excursão de Daniel Agari pelas caves do Hospital
Pediátrico Al-Rantisi, divulgada em vídeo pelas FDI? A singularidade simbólica
das “evidências” apresentadas concede-lhes uma aura propriamente
cinematográfica<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>— uma cadeira com roupas
de mulher e uma corda são “provas” da presença de reféns; a marca de uma bala
no assento de uma mota “prova” que ela foi usada nos ataques de 7 de Outubro;
um biberão pousado numa caixa com o símbolo da Organização Mundial Saúde
“prova” a presença de uma criança sequestrada, enquanto transmite uma nítida
insinuação sobre a OMS e as Nações Unidas; por fim, o célebre papel na parede,
a suposta<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>“lista onde todos os
terroristas escreviam o seu nome”, que afinal era apenas um calendário com os
dias da semana em árabe. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Diante
da tragédia imensurável e a devastação dos hospitais de Gaza, determinar a
veracidade destas “provas” não deixa de ser um exercício supérfluo. Além disso,
avaliando pelo caso flagrante do calendário árabe, a produção cinematográfica
em causa também não revela grandes preocupações com a eventual exposição das
suas farsas. É também por isso que, quando procuramos nela um esforço efectivo
na justificação das atrocidades cometidas, o seu sentido permanece, para nós,
obscuro. Por outro lado, ele revela-se mais plausível se admitirmos que o seu
desígnio não é o de oferecer explicações, mas antes o de transmitir ordens
claras sobre aquilo em que devemos acreditar a cada momento, negando e
esquecendo, para tal, tudo quanto for necessário.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Num tempo em que a difusão de informação
restringe ao limite o alcance da censura, a desinformação ganha relevância na
instauração de uma ditadura de actualidade permanente, em que cada um é
impelido à existência em pleno esquecimento. Nesse paradigma, a incoerência e,
em paralelo, a boçalidade não decorrem de simples descuidos ou de inabilidade
discursiva. São antes os meios pelos quais o poder atesta a fidelidade dos seus
súbditos, exigindo deles uma obediência incondicional na aceitação da sua narrativa,
enquanto define como seus inimigos — neste caso, como anti-semitas e cúmplices
do terrorismo — aqueles que ousam questioná-la.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></b></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><b><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhH5_KTHN0z5tI6kmXMhe31bj8Tg0t_Ha8pkLnYi_gX1i2y5KHyDw6sYZJ9qx6rLwVOeQ3fVz-4rbWKSugt1ahquzEzSLdr0VDdZtk5H5YnZ_OmvdGIFHx1S2CwifKp806RQyrk9KboQKACNHjEgbCUNGCb4ijZzkF7bGGepqtl_mAu6_8FNu1icnsc0Ej1/s3240/2%20(1)%20(1).jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1080" data-original-width="3240" height="201" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhH5_KTHN0z5tI6kmXMhe31bj8Tg0t_Ha8pkLnYi_gX1i2y5KHyDw6sYZJ9qx6rLwVOeQ3fVz-4rbWKSugt1ahquzEzSLdr0VDdZtk5H5YnZ_OmvdGIFHx1S2CwifKp806RQyrk9KboQKACNHjEgbCUNGCb4ijZzkF7bGGepqtl_mAu6_8FNu1icnsc0Ej1/w601-h201/2%20(1)%20(1).jpg" width="601" /></a></b></div><b><br /></b><p></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">15
de Outubro de 2015<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Nas
imagens, o rabino Arik Ascherman é atacado por um colono israelita, perto de
Awarta, na Cisjordânia ocupada. O rabino tentava denunciar os colonos que
punham fogo nas oliveiras, quando foi surpreendido por um homem mascarado e
armado com uma faca. Em entrevista ao Democracy Now, Ascherman mostrou-se
surpreendido por estar vivo, admitindo que o desfecho podia ter sido diferente
se fosse palestiniano. Ascherman foi um dos fundadores e era à data presidente
de uma ONG religiosa (<i>Rabbis for Human Rights</i>) que promovia, entre as
suas iniciativas, a participação de voluntários ao lado de agricultores
palestinianos nas colheitas de azeitona. A sua intenção era que essa presença
ajudasse a proteger os agricultores e as oliveiras da rotina de ataques
violentos, de sabotagem e destruição praticados por colonos israelitas. No
entanto, como atestam as imagens, ela não foi suficiente.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">O
agressor mascarado, que acabou por confessar, era à altura um adolescente de 17
anos e a sua sentença resumiu-se a trabalho comunitário e ao pagamento de
compensação monetária, sem pena de prisão. Segundo o <i>The Times of Israel,</i>
a juíza Sharon Halevi terá dito que não pretendeu, com uma sentença criminal, e
tendo em conta a idade do réu, comprometer o seu serviço militar nas FDI. Dado
o que o jovem fez com uma faca a um sacerdote judeu desarmado, resta-nos
questionar sobre o que o tornará apto a dispor de armas de assalto ou de
precisão em contacto com civis, crianças e adolescentes palestinianos. Se a
postura da magistrada nos concede um vislumbre sobre o perfil pretendido ou
pelo menos tolerado pela justiça israelita, no que respeita aos operacionais das
FDI, um segundo aspecto é também revelador da relação dos políticos no poder
com estes casos. Trata-se do advogado que assumiu a defesa do jovem colono
mascarado. Ninguém menos que o actual ministro da segurança nacional, Itamar
Ben-Gvir, entretanto responsável pelo plano de compra de 10.000 armas de
assalto para serem distribuídas por colonos milicianos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Esta
não tinha sido a primeira vez, nem veio a ser a última, que o rabino ou a sua
organização sofreram consequências pela defesa de direitos palestinianos, quer
da parte do Estado, quer das milícias de colonos. Entre 2004 e 2005, Ascherman
tinha sido julgado por desobediência civil, ao obstruir um bulldozer que estava
prestes a demolir uma casa palestiniana em Jerusalém Oriental. Em Janeiro de
2021, um acto de sabotagem esteve perto de lhe causar um acidente de carro.
Três meses depois, outra agressão foi captada em vídeo, no qual é agredido por
um homem com um taco de madeira, enquanto outros assistem. Tratava-se de
membros da <i>Hilltop Youth</i>, um grupo extremista cujas práticas passam pela
expropriação violenta de palestinianos daquilo que julgam ser a “Terra Santa” e
pelos assentamento ilegal de colonatos nas terras sequestradas.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Ascherman
é apenas um de entre incontáveis judeus cujas práticas e ideologia estão nos
antípodas da actuação do Estado que diz representá-los. No Ocidente, o avolumar
preocupante da violência anti-semita explícita, a par da islamofóbica, não
justifica a negligência das suas manifestações menos óbvias, até porque são
estas que sustentam a primeira. Uma delas, que a custo tem vindo a ser
desmantelada, é o silenciamento de milhares de judeus dissidentes através da
fusão forçada da sua identidade com a de um Estado colonial e genocida que não
os representa nem defende, e inclusive os oprime.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>A recusa da crítica do Estado de Israel
através da sua equivalência forçada ao “anti-semitismo” tem como efeito duplo o
apagamento dos judeus dissidentes e a negação implícita da sua identidade
judia, configurando, por essa razão, um profundo acto de anti-semitismo. Esse
artifício discursivo, cujo papel histórico no branqueamento dos crimes
israelitas não pode ser ignorado, tem vindo a ser abalado à medida que cada vez
mais judeus se levantam em solidariedade com o povo palestiniano e contra o
genocídio em curso em Gaza. Foi este o caso, entre muitos outros, da <i>Jewish
Voice for Peace,</i> cujos membros foram detidos às centenas pela Polícia de
Nova York quando ocuparam a Estação <i>Grand Central</i> de Manhattan. A sua
mensagem foi clara: “<i>Jews say cease Fire</i>” e “<i>Not in Our Name</i>”. A
administração de Biden, que muito se tem mostrado preocupada com o incremento
de mensagens anti-semitas nos campus norte-americanos, recusa-se, no entanto, a
ouvir a sua voz.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhYN9lm_MOaKvpM7Cz5QUVLnZCMtg080Znzh8wIjj1-0-cFXNKtXNTnICcTJR6MMqVs2YHEoDgrZRVy3G6ziO1waEBH-hyVjIU0srwEhrlbfsNL9jXZN9-LoQy6wXw0BChtiUNVRn4-2709B6zQmOE506QoowWcoS6qrcVDdjD9jl-m0D9lC4c3kbKt4XRk/s1182/Untitled-2%20(1).jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="437" data-original-width="1182" height="222" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhYN9lm_MOaKvpM7Cz5QUVLnZCMtg080Znzh8wIjj1-0-cFXNKtXNTnICcTJR6MMqVs2YHEoDgrZRVy3G6ziO1waEBH-hyVjIU0srwEhrlbfsNL9jXZN9-LoQy6wXw0BChtiUNVRn4-2709B6zQmOE506QoowWcoS6qrcVDdjD9jl-m0D9lC4c3kbKt4XRk/w602-h222/Untitled-2%20(1).jpg" width="602" /></a></div><br /><p></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">11
de Maio de 2022<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Na
imagem, a jornalista palestiniana Shatha Hanaysha, testemunha o assassinato da
colega Shireen Abu Akleh. O grupo de jornalistas da Al Jazeera preparava-se
para cobrir uma incursão das Forças de Defesa de Israel (FDI) no campo de
refugiados de Jenin quando foi alvo de disparos à distância.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Numa
entrevista, Shatha mencionou os principais motivos que a levavam a suspeitar,
tal como outras oito testemunhas, que o ataque fora uma execução dirigida pelas
FDI: um deles era o facto de estarem visivelmente identificadas como «PRESS»;
outro estava na precisão dos tiros, disparados na sua direcção sempre que
tentava resgatar o corpo de Shireen para segurança.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Confrontada
com a hipótese, avançada pelas FDI, de terem sido atiradores palestinianos a
disparar, Shatha recusou com firmeza. Afirmou que não havia palestinianos
armados no local e que, como jornalista e como ser humano, não se colocaria
numa situação de perigo. Vídeos verificados vieram reforçar as suas palavras,
revelando a ausência de conflitos ou de fogo cruzado nos instantes que
antecederam o ataque. O grupo armado palestiniano mais próximo encontrava-se,
afinal, para além dos 200 metros de alcance dos disparos, estando, para além
disso, do outro lado das forças israelitas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Perante
evidências incontornáveis, passados vários meses, as FDI acabaram por admitir a
«elevada possibilidade» de terem atingido «acidentalmente» Shireen, numa
alegada «troca de tiros». Após um «exame compreensivo» e dadas as «circunstâncias
do incidente», o Advogado-Geral Militar decidiu que não havia razões de
suspeita que justificassem a abertura de uma investigação criminal.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Passado
um ano, o mundo teve direito a um breve «pedido de desculpas», dito pelo
porta-voz das FDI Daniel Hagari, em entrevista à CNN, rapidamente seguido desta
ressalva:<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 115%;">«<i>Israel é uma
democracia, e na democracia valorizamos muito o jornalismo e a imprensa livre,
e queremos que os jornalistas se sintam seguros em Israel, especialmente em
tempo de guerra. E mesmo que nos critiquem, queremos que se sintam seguros.
Somos todos pela democracia e nós somos uma democracia liberal.</i>»<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Não
consta que a execução de uma jornalista seja conciliável com qualquer conceito
de democracia, por mais vago que seja. Porém, convenientemente, os
simpatizantes de Israel no Ocidente não revelam grandes exigências a este
respeito. Avaliando pelas vozes que persistem em reiterar, plenas de convicção,
que Israel é uma democracia, podemos supor que, para muitos dos que nos
rodeiam, as palavras de Hagari terão sido mais que suficientes para derrubar as
graves suspeitas e precipitar no esquecimento Shireen Abu Akleh, convertida em
mero dano colateral, vítima de um «erro» bizarro, inexplicável e sem
responsáveis.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Por
outro lado, não será difícil reconhecer um efeito distinto das mesmas palavras
para outro grupo particular de pessoas, a quem este crime imprimiu na memória,
como uma marca indelével, a imagem de Abu Akleh. Jornalistas na Palestina estão
entre aqueles que nunca se puderam dar ao luxo de partilhar com os líderes e
comentadores ocidentais as convicções benevolentes sobre a natureza do Estado
Israelita. A quem cabe acompanhar e documentar as operações das FDI no terreno,
não terá passado despercebido que, entre as volumosas afirmações que seguiram o
breve «pedido de desculpas» de Hagari, não teve lugar qualquer explicação,
responsabilização ou garantia relativamente ao sucedido, um silêncio que
introduz uma contradição assinalável relativamente ao vago «desejo» expresso de
que «os jornalistas se sintam seguros em Israel».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">À
hora a que escrevo, desde os ataques de 7 de Outubro, o Comité para Protecção
dos Jornalistas já confirmou a morte de trinta e um jornalistas e membros da
imprensa, na sua grande maioria vítimas de ataques aéreos israelitas. Para além
de destruírem sistematicamente as redes e infra-estruturas de comunicação, as
forças israelitas recusam-se dar qualquer garantia de segurança a quem arrisque
dar a conhecer ao mundo o que está a acontecer em Gaza. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">O
problema não fica por aqui. Não é apenas a jornalistas e trabalhadores da
imprensa que não é dada essa garantia. A 25 de Outubro, o repórter veterano e
chefe de escritório da Al Jazeera na cidade de Gaza, Wael Al Dahdouhé, recebeu
em directo a notícia da morte de vários membros da sua família, entre os quais
a mulher, um filho de quinze anos, uma filha de sete, e um neto. Ao contrário
do repórter, que arriscou a vida ao permanecer na Cidade de Gaza, a sua família
obedecera dias antes às ordens de evacuação israelitas, procurando abrigo numa
área supostamente segura, no campo de refugiados de Nuseirat. Porém, como se
veio a confirmar, e como o próprio afirmou, «não há lugar seguro na Faixa de
Gaza».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Partindo
de que seja aceitável para os aliados de Israel, como de resto tem sido, que as
vidas de milhares de homens, mulheres e crianças sejam sacrificadas em nome do «combate
ao terrorismo», e ademais pela ausência de órgãos isentos que averigúem no
terreno as alegações das FDI, ninguém em Gaza estará a salvo de ser reduzido a
qualquer momento a um alvo para os bombardeiros israelitas. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%;">Para
quem ainda se permite duvidar das intenções genocidas do Estado de Israel
expressas por vários dos seus representantes, deixou ao menos de ser possível
negar que as condições necessárias à sua concretização têm vindo a ser
rigorosamente reunidas. Particularmente decisiva, de entre elas, é a névoa
impenetrável que envolve Gaza quando toda a imprensa é silenciada.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12.0pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25.0pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Paulo
Ávila<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Paulo
Ávila (1994) é arquitecto pela Faculdade de Arquitectura da Universidade do
Porto. Colabora com o Jornal Punkto desde 2017.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Nota
de Edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«Palestina
— Diário Retrospectivo» é um artigo em construção onde se reúnem reflexões
pontuais, livres da obrigação cronológica e da actualidade, dirigindo a atenção
aos detalhes, imagens e testemunhos, à relação entre os discursos e os
acontecimentos, e outros aspectos que tenham passado despercebidos, esquecidos
ou ofuscados pelas grandes narrativas.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«Palestina
— Diário Retrospectivo» • Paulo Ávila<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 27.02.2024<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#41 & 42 • Outono & Inverno 2024</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-11824423645549788362024-02-21T11:35:00.000-08:002024-02-22T01:33:04.870-08:00Dizer e pensar uma vida para além do que o colonialismo de ocupação fez • Samera Esmeir<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhNZrCsLHnhgduWlEVmlq9n1yXJ0mm0EsR7LZmGbIzQYijvGxtz5wT-LxWnM115s4fHveMFi9GY5xJT8G1psAOW5MLifK44HeZGdOpIASXO2nYdigTmOoEH1S6oEUzZzpAefOtjb2ugqR0poBNBkLymTMWdl2tIQdJSjygsbumXQWn40zza4AvvnjY_OLCZ/s1314/A9945544-2921-46CA-93A8-065BF1DFF319.JPG" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1019" data-original-width="1314" height="408" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhNZrCsLHnhgduWlEVmlq9n1yXJ0mm0EsR7LZmGbIzQYijvGxtz5wT-LxWnM115s4fHveMFi9GY5xJT8G1psAOW5MLifK44HeZGdOpIASXO2nYdigTmOoEH1S6oEUzZzpAefOtjb2ugqR0poBNBkLymTMWdl2tIQdJSjygsbumXQWn40zza4AvvnjY_OLCZ/w525-h408/A9945544-2921-46CA-93A8-065BF1DFF319.JPG" width="525" /></a></div><p></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">A
Terra fecha-se sobre os palestinos em Gaza. No momento em que escrevo estas
linhas, Israel continua a bombardear mais de 2 milhões de palestinos,
refugiados e descendentes de refugiados confinados a uma Faixa de Gaza sitiada,
um território com apenas 365 km2. Mais de 300 mil soldados israelenses
preparam-se para levar a cabo uma invasão terrestre. Israel também ordenou a
1,1 milhões de palestinos que se deslocassem de norte para sul da Faixa de
Gaza, e estão em curso esforços diplomáticos internacionais para expulsar os
palestinos de Gaza para fora da Palestina — ou seja, para fazer uma limpeza
étnica de Gaza. Entretanto, intensifica-se a destruição pelo ar: devastação,
destroços, corpos soterrados sob os escombros e por cima deles. Não há para
onde fugir. A faixa é demasiado pequena, encontra-se absolutamente devastada, é
já inabitável.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Antecipando
a sua morte, alguns palestinos de Gaza publicam os seus pedidos de perdão, para
o caso de terem feito mal a alguém. Se pensávamos que existia um limite
empírico para a destruição israelense de Gaza, constrangimentos
estratégico-militares, podemos agora ver que esse marco não existe. Quando
lemos «ordenei um cerco total à Faixa de Gaza. Não haverá electricidade, nem
comida, nem combustível. Tudo está fechado. Estamos a lutar contra animais
humanos e agimos em conformidade», não estamos a receber as palavras de um
ministro israelense que se refere a uma estratégia militar em resposta a uma
qualquer situação concreta. Pelo contrário, escutamos a voz de uma colónia de
ocupação (<i>settler colony</i>) que reafirma o seu domínio sobre o território,
que declara a sua supremacia sobre a população palestina indígena. Estamos na
presença de um conquistador que recusa a revolta dos conquistados,
exigindo-lhes uma declaração de derrota. Estamos na presença de um desejo de
erradicar os palestinos, senão da terra, então da política da terra. Estamos na
presença de uma campanha que tenta destruir o que escapou à destruição durante
e após as anteriores rondas de conquista e devastação, rondas que remontam a
1948. Estamos na presença de um desejo colonialista de obliterar o nativo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Os
índices de obliteração aparecem primeiro na linguagem. Assim, os Estados
civilizados e as organizações internacionais, os liberais e os conservadores,
os reitores das universidades americanas e os seus doadores, todos eles se
alinharam para participar neste discurso. A sua ordem colonial é clara: não
contém uma única referência dignificante aos palestinos. Não se trata de um
acaso. Antes de poderem ser obliterados, os palestinos têm primeiro de ser
transformados discursivamente em monstros bárbaros. Este discurso não pretende
apenas criminalizar o Hamas pelas suas acções. Para tal, já dispomos do
imaginário jurídico dos crimes de guerra, da acção penal, da punição
individual. Em vez disto, este discurso colonial internacional afecta algo
muito mais abrangente do que o permitido pelo imaginário jurídico. Condena o
próprio ser dos palestinos, a sua própria existência. Esta ordem de discurso,
que o Ocidente (entendido não como conjunto de Estados, ou enquanto território,
mas antes como projecto moral que continua a universalizar-se violentamente) já
elaborou sobre outros povos colonizados e escravizados, considera os palestinos
inerentemente culpáveis. Esta ordem de discurso transforma-os num inimigo
universal, opositor que é preciso esmagar, e não conceber como objecto de
negociação política. Na medida em que este discurso, mantido e imposto pelos
Estados civilizados, bem como pelos meios de comunicação social liberais, gera
a ausência de mundo dos palestinos, o seu efeito é genocida. Sabemos por outras
histórias que a linguagem que constrói a distinção entre o civilizado e o
bárbaro é uma linguagem de extermínio.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">A
construção ocidental da falta de mundo dos palestinos é generalizada. Embora
abundem os catálogos dos horrores provocados pelo Hamas, não existem registos
semelhantes em relação às acções israelenses. Isto não se deve ao facto de a
destruição diária, rotineira e estrutural do Estado colonizador de ocupação ser
impossível de enumerar e catalogar. É porque a reacção emocional do Ocidente
liberal só consegue invocar o horror perante atrocidades muito particulares. O
bloqueio continuado da população palestina cativa não causa consternação. Os
bombardeamentos, repetidos não causam tristeza. O cerco não suscita qualquer
reflexão ética. A violência militar e dos colonos, necessária para manter a
ocupação na Cisjordânia, não suscita qualquer preocupação. O que explica esta
indiferença perante o sofrimento do indígena colonizado e o horror perante a
dor do colonizador? Por que razão os sentidos se distribuem de forma tão
desigual? Será apenas uma questão de dois pesos e duas medidas? O que explica,
então, a sua esmagadora consistência? Em que medida gera esta disparidade
radical obstáculos à luta palestina? Será que muitos dos que estão fora de
Israel desejam secretamente que a resistência palestina desapareça, para que as
chamadas tragédias possam ser evitadas, a «confusão» possa ser resolvida e a
ordem internacional colonial restaurada? E, além disso, esse desaparecimento
desejado não reforçaria apenas a gramática da obliteração?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">São
várias as respostas possíveis para tais interrogações. Uma delas remete-nos
para a guerra de 1967, quando a vitória de Israel sobre os exércitos árabes e a
ocupação da Cisjordânia e da Faixa de Gaza foram recebidas, dentro e fora de
Israel, como acontecimentos milagrosos e messiânicos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Houve
também o apoio britânico e a facilitação de um Estado para os colonos sionistas
no século XX.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Há o
inabalável apoio americano a Israel, a profunda afinidade entre os colonos no
Médio Oriente e as colónias das Américas. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Pretendo
centrar-me numa outra resposta, uma resposta que se mantém nas atrocidades
geradoras da Faixa de Gaza, na destruição que foi indispensável para a criação
do território israelense e nas expulsões que foram necessárias para a
constituição de civis israelenses e para o desvanecimento dos sujeitos
palestinos. Parece-me que dispomos agora de ferramentas críticas para seguir e
condenar a desestabilização da categoria jurídico-política do civil, uma
desestabilização que permitiu a morte de sujeitos inocentes e sem culpa, seja
no Afeganistão, no Iraque, na Síria ou no Iémen, para mencionar apenas alguns
exemplos recentes. Mas talvez precisemos de reflectir mais sobre a construção
da figura do civil e da noção de normalidade civil, as condições territoriais e
discursivas que são necessárias para cultivar vidas civis e a sua distribuição
desigual. Proponho que a conquista colonial de ocupação (<i>settler colonial</i>)
e a territorialização da terra não se restringe ao contexto dos acontecimentos
actuais, mas são forças que produzem e estabilizam categorias específicas,
incluindo a do civil. Há poderes envolvidos no fazer e desfazer do civil, e não
apenas no facto de este ser alvo de violência. Na Palestina, este poder é um
exercício de territorialização colonial de ocupação, uma vez que tem estado
entrelaçado com a remoção, o assassínio e o enclausuramento em curso dos
palestinos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Seja-me
permitido desvendar este ponto, voltando à Faixa de Gaza, local de novas
tentativas de obliteração dos palestinos e de territorialização de um Estado
sionista chamado Israel. Recordemos que, antes de 1948, a Palestina não tinha
uma área chamada Faixa de Gaza. Havia, isso sim, uma área muito maior chamada
Distrito de Gaza. Durante a guerra de 1948, as forças sionistas conquistaram a
maior parte do distrito de Gaza, destruíram 49 aldeias e deslocaram a população
à força. Apenas 365 km2 foram poupados à conquista. Posta sob domínio
administrativo egípcio, esta extensão do território passaria a ser conhecida
como a Faixa de Gaza e receberia 200 mil refugiados palestinos que iriam
habitar em 8 campos de refugiados. Em 1950, Israel retirou os que viviam à
volta dos campos para o território que era agora de Israel, despovoou a aldeia
palestina de Majdal e começou a cercar a faixa, criando colonatos que a
delimitavam e cercavam.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Estes colonatos
foram o palco dos acontecimentos deste fim-de-semana. Já nessa altura, os
palestinos tentaram regressar às suas casas e terras. Também tentaram ataques
armados contra os colonatos construídos nas terras dos refugiados. Para manter
o seu domínio territorial sobre os colonos, Israel recorreu a ainda mais
violência. Em 1953, por exemplo, foi iniciada uma grande operação militar, e
Israel massacrou 50 pessoas. Em 1956, Israel ocupou a Faixa pela primeira vez.
Em Khan Yunis, os soldados capturaram e abateram centenas de palestinos. Em
1967, Israel voltou a ocupar a Faixa de Gaza e permaneceu como ocupante de
terras até se tornar um agente do bloqueio. Ao longo de toda esta história,
Israel aplicou uma série de medidas de pacificação contra a luta anticolonial
dos palestinos em Gaza: detenções sistemáticas, demolição de casas, pressão
económica e deportações; os rebeldes foram presos, dezenas foram sumariamente
executados. Desde então, os campos de Gaza, mesmo após 16 anos de bloqueio,
continuam a estar no centro da resistência contra aquilo que o Estado colonial
quer impor, como um cerco fatal e eterno.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Noutros
locais da Palestina, semelhantes operações militares-coloniais garantiram a
construção de território israelense onde ele não existia, o que teve como
resultado a extrema desterritorialização da Palestina – ou seja, a sua
destruição. Por exemplo, apesar da destruição generalizada e das expulsões em
massa em 1948, quase 160 mil palestinos permaneceram na terra em que Israel
demarcou o seu território. Em breve seriam submetidos a regime militar. Foram
acantonados, os seus meios de subsistência confiscados e impedidos de alcançar
os seus campos. Utilizaram-se munições reais para impedir a chamada
«infiltração» de palestinos que queriam regressar dos seus locais de refúgio
atrás da linha de armistício. Houve massacres. Levou-se a cabo a judaização da
Galileia. Desde então, muitas outras práticas coloniais de ocupação (<i>settler
colonial</i>) e estruturas de cerco, remoção e imposição de fronteiras,
continuaram a confinar os palestinos, restringindo-os a pequenas extensões de
território, e a disponibilizar o resto da terra para os israelenses. Daí as
centenas de <i>checkpoints </i>militares que resultaram em centenas de
comunidades palestinas fragmentadas e confinadas na Cisjordânia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Apresento
estes gestos históricos não com o objectivo de fornecer um contexto histórico
para os acontecimentos actuais, mas para poder analisar a constituição
entrelaçada do território e dos civis israelenses. À medida que o Estado
sionista foi balizando as suas fronteiras, fortificando-as com colonatos e
colonos armados, à medida que se foi territorializando, despovoando aldeias e
cidades palestinas, destruindo-as, impedindo o retorno de refugiados palestinos
e recrutando judeus de todo o mundo para povoar as novas colónias, à medida que
foi fazendo o que noutras latitudes ia deixando de ser possível num mundo em
processo de descolonização, então poderia começar a materializar a figura do
civil e a noção de normalidade civilizada e armá-los como factos no terreno a
serem defendidos. Em nome do civil, e para sua protecção, poderiam cometer-se
as piores atrocidades.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Fundamental
para esta noção de normalidade civil é a sua condição institucional-territorial
de possibilidade: uma forma de Estado forte, com território permanente e
fronteiras fortificadas. Israel tem-nos. Arrancou esta forma estatal pela força
aos palestinos. Esta forma estatal tem instituições: Forças Armadas
profissionais, uma força policial, um Ministério do Interior, um registo dos
seus cidadãos e um Ministério da Defesa. Estas são apenas algumas das
instituições que produzem e reproduzem a distinção entre civil e militar, mesmo
quando o serviço militar nacional é obrigatório para todos os cidadãos judeus e
israelenses, com apenas algumas excepções. A condição de possibilidade para
estas instituições é a exclusão dos palestinos — em termos de entrada no país,
direitos de residência, unificação familiar, acesso à terra, etc. —, a sua
supressão, remoção, policiamento e confinamento. Estas instituições promoveram
uma sociedade civil israelense, postura civil, pluralidade civil e normalidade
civil. O colono, precisamente a figura através da qual se procedeu, tanto à
territorialização do Estado sionista de Israel, como à expropriação e remoção
dos palestinos, converteu-se também num civil.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">A
ocupação da Cisjordânia e da Faixa de Gaza em 1967 foi fundamental para o
estabelecimento da normalidade civil israelense. Os «territórios ocupados»
sempre foram o terreno para activar o poder militar israelense, evitando assim
que a violência da ocupação se intrometesse na vida civil israelense
normalizada. Aí, a coberto da linha verde, Israel dirigiu o «conflito». Quanto
mais violência militar dos colonos existir na Cisjordânia e na Faixa de Gaza,
mais normalidade civil existirá em Israel, e mais a noção de normalidade civil
se poderá transformar em arma para justificar mais violência na Cisjordânia e
na Faixa de Gaza. Mas as operações de purificação e normalização da linha verde
nem sempre ficaram isentas de contestação. Os palestinos sempre compreenderam
que a condição de possibilidade para este estado de normalidade civil, dentro
da linha verde, consistia na destruição da existência dos palestinos na terra e
a proibição do seu regresso a ela. Assim, sempre houve violações dos limites
impostos e operações para desfazer a fronteira: aquilo a que os palestinos
chamam «retorno».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Entretanto,
a reivindicação palestina pelo estatuto civil ou de normalidade civil tem-se
debatido com inúmeros desafios. A sociedade palestina foi destruída em 1948. Os
territórios ocupados em 1967 foram deliberadamente fragmentados, desligados e
separados por colonatos. Não existe Estado formado, Forças Armadas regulares,
profundidade de território, nem postura civil. Em vez disto, são muitos os
campos de refugiados, as famílias despossuídas e pessoas envolvidas em
conflito. Tudo o que poderia contribuir para a normalidade civil é actualmente
alvo da ocupação israelense, desde casas e escolas a ONGs, centros culturais e
universidades. Quando comparada com o outro lado da linha verde, a vida na
Cisjordânia e na Faixa de Gaza, os contentores da violência de Israel contra os
palestinos, não pode manifestar a normalidade civil.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas
há mais. O ethos civil, por uma questão de sensibilidade liberal, exige
inocência, passividade política, falta de movimento e fixidez. Aos olhos do
Ocidente liberal e civilizado, espera-se que o civil seja alguém pacífico,
passivo e inocente, que deve rejeitar a revolta. Os palestinos, enquanto
refugiados, sujeitos resistentes, politicamente comprometidos, olham na
direcção da terra de onde foram expulsos e aspiram a seguir na sua direcção. O
seu desejo é não estarem limitados a um cerco, por isso não cumprem os
requisitos de tal ethos. A sua justa recusa do confinamento, a firme rejeição
do cerco, a esperança isenta de desespero de regressar à terra de onde foram
expulsos, violam esse ethos liberal. Os seus sonhos e aspirações tornam-nos
obliteráveis aos olhos daqueles que valorizam a normalidade civil, apesar do
seu pesado impacto sobre os outros. Portanto, não pode haver qualquer emoção
perante a perspectiva do seu extermínio. Muito pelo contrário. Em nome da
normalidade civil, o não-civil terá de ser obliterado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Por
um lado, temos, então, um Estado com um dos exércitos mais avançados à face da
terra, um Estado que, ao invocar violações da normalidade civil, pode mobilizar
forças militares destruidoras com o apoio da maioria dos membros da comunidade
internacional. O sofrimento da comunidade civil deste Estado é evidente e
provoca repúdio. Por outro lado, temos um povo palestino colonizado, ocupado,
sem Estado e desterritorializado, sem Exército regular, com um território
disponível de dimensões assaz modestas e que, por se atrever a resistir à
devastação colonial dos ocupantes, não dispõe de uma normalidade civil que
possa invocar e armar. A sua luta desencadeia escasso apoio internacional. Por
um lado, temos um Estado colonial de ocupação (<i>settler colonial</i>)
autoterritorializante, construído através da limpeza étnica do território, que
realiza operações extraterritoriais destrutivas para se reterritorializar
contra aqueles que continua a expulsar e a confinar; as suas operações são
apoiadas a nível internacional e fortificadas do ponto de vista militar. Por
outro lado, temos os expulsos e confinados, que subsistem em condições extremas
de desterritorialização e obliteração, tentando criar uma abertura no terreno
ao chegar até ele a partir da periferia do território; estas pessoas estão
condenadas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Eis
a cruel ordem internacional que nos cabe, com o seu mandato territorial sagrado
e o seu regime de normalidade civil. Talvez seja altura de deixarmos — nós, que
não queremos fazer o jogo dos Estados — de participar, contestar e solicitar do
discurso colonial internacional, que deixe de afirmar os seus direitos e
reivindicações, os seus termos e formas. Só então poderemos começar a
viabilizar uma vida que não pode senão lutar contra o domínio colonial sobre o
território, procurar a destruição das fronteiras e recusar as condições de
confinamento e privação necessárias à normalização da colónia de ocupação (<i>settler
colony</i>). Construir esta vida para além da territorialização e da
normalidade civil é criar uma abertura na linguagem, na política e na ética,
uma abertura que excede a cartografia colonial e a ordem internacional que a
permite.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 30pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: "Avenir Next Regular"; mso-fareast-font-family: "Avenir Next Regular"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Samera
Esmeir</span></b><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Jurista,
doutorada em direito e sociedade pela Universidade de Nova Iorque, é professora
associada do Departamento de Retórica da Universidade de Califórnia, em
Berkeley. A sua investigação e ensino centram-se na intersecção do pensamento
jurídico e político, da história do Médio Oriente e dos estudos coloniais e
pós-coloniais. O seu foco principal tem sido investigar como o colonialismo
moderno tardio administra lógicas e gramáticas jurídicas liberais que moldam a
praxis política atual, e como estas persistem na era pós-colonial em diversos
países do Médio Oriente. Sobre este problema publicou <i>Juridical Humanity. A
Colonial History</i> (2012, Stanford University Press), onde examina o modo
como os poderes jurídicos coloniais reconfiguraram o conceito do humano na
relação com a lei. Atualmente trabalha num segundo projeto <i>The Struggle that
Remains. Between World and International</i> onde teoriza a emergência da
palavra internacional em contraposição à palavra mundo e analisa a relação
entre guerra e revolução no contexto das diferentes tradições jurídicas
(incluindo o direito internacional), procurando deste modo rastrear as mudanças
nas sensibilidades e nas teorias jurídicas, e compreender o direito das lutas
que perduram no presente.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Nota
da autora<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Agradeço
a Reem Al-Botmeh, Basit Kareem Iqbal e Ramsey McGlazer pelos seus comentários
relativamente a este ensaio. Estou também grata pelas discussões colectivas com
Helen Kinsella e Murad Idris sobre a questão do civil.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Nota
da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Este
texto inaugura uma colaboração entre o jornal Punkto e a editora KKYM + P.OR.K a
propósito do projecto</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> </span><a href="https://www.unground.pt/"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">(un)common ground</span></a><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">e da exposição </span><a href="https://www.ciajg.pt/detail-eventos/20240224-terra-estreita/"><i><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Terra Estreita</span></i></a><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">que inaugura no próximo dia 24 de Fevereiro no CIAJG,
em Guimarães; uma exposição que tem como curadores João Francisco Figueira
(coord.), Marlene Monteiro Freitas, Miguel Figueira e Vítor Silva. O texto de</span>
<span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><a href="https://www.unground.pt/txt/dizer-e-pensar-uma-vida-para-alem-do-que-o-colonialismo-de-ocupacao-fez/"><span style="color: #97694b;">Samera Esmeir</span></a> </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none; mso-themecolor: text1;">foi </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">publicado em 2023 no site do<i>
(un)common ground</i> (onde pode ser descarregado), acompanhando uma exaustiva e
ímpar colecção de textos de reflexão sobre o conflito e a ocupação israelita da
Palestina. A tradução do texto é de Hugo Pinto Santos (com revisão de João
Francisco Figueira, Fátima Martins e Vítor Silva). O texto original «<i>To say
and think a life beyond what settler colonialism has made»</i>, pode ser lido </span><a href="https://www.madamasr.com/en/2023/10/14/opinion/u/to-say-and-think-a-life-beyond-what-settler-colonialism-has-made/"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">aqui.</span></a><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">(un)common
ground<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> (un)common
ground investiga a inscrição artística e cultural do conflito que opõe
autóctones e colonos quanto à pertença, posse, controlo e poder no território
de Israel/Palestina, constituindo o palco e objecto da disputa. </span><span style="color: #97694b;"><a href="https://d.docs.live.net/14f384b0134296f5/Documentos/www.unground.pt"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">www.unground.pt</span></a></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> Um projecto com apoio DGARTES |
República Portuguesa, Ministério da Cultura, Direcção-Geral das Artes.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Imagem
a partir de Elia Suleiman, <i>The time that remains, </i>2009 [a escolha da
imagem é da responsabilidade da edição do Punkto]<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Ficha
técnica</span></b><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">«<i>Dizer
e pensar uma vida para além do que o colonialismo de ocupação fez» </i>• Samera
Esmeir<i><o:p></o:p></i></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Data
de publicação • 22.02.2024</span><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Edição
#41 • Inverno 2024</span><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-85450459298336070112024-02-15T01:15:00.000-08:002024-02-15T11:30:25.914-08:00Dizer qualquer coisa de esquerda • Pedro Levi Bismarck<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgn6rDv0UUzdOjdGxkbnqsmK3YK300Oqdo7NURxI1PCBf_rQ5G3GxXYsMMzoPVBjj-xqcyatwuahBgYgAdgyrFojZGZkvHiMl48OJ2fD2sFknVn-nCgyuesozAW5xQO_NfSD05_XU88J9kJ-dZxSTkphbHyPGq0Q3vTDJAmWMFleJUi3DqkcBHrjEuErTI0/s736/esquerda.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="463" data-original-width="736" height="330" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgn6rDv0UUzdOjdGxkbnqsmK3YK300Oqdo7NURxI1PCBf_rQ5G3GxXYsMMzoPVBjj-xqcyatwuahBgYgAdgyrFojZGZkvHiMl48OJ2fD2sFknVn-nCgyuesozAW5xQO_NfSD05_XU88J9kJ-dZxSTkphbHyPGq0Q3vTDJAmWMFleJUi3DqkcBHrjEuErTI0/w525-h330/esquerda.jpg" width="525" /></a></div><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">«Um festival de demagogia»,
foi assim que uma jornalista e representante do comentariado nacional — talvez
a mais ilustre instituição política da direita em Portugal — sintetizou o
debate entre Mariana Mortágua e André Ventura. O comentariado nacional foi
obrigado a reconhecer a capacidade e a preparação de Mariana Mortágua perante o
líder do Chega. Mas
para o fazer teve de reduzir o debate «a um confronto entre duas demagogias»: isto
é, concede a «vitória» à coordenadora do Bloco, mas apenas na medida em que
esvazia o debate de todo o conteúdo político — como se o debate do dia anterior
entre Ventura e Montenegro tivesse sido uma lição ímpar de conteúdo político.
Ao reduzir o debate a um «festival de demagogia», o comentariado utiliza o
Chega — e a incoerência das suas propostas — para englobar o Bloco e os juntar
nesse estranho lugar político-geométrico onde os «extremos se tocam». <i>Dizer
qualquer coisa de esquerda</i> — para recordar o desânimo de Nanni Moretti, no
filme <i>Aprile,</i> enquanto observava o debate de D’Alema contra Berlusconi —
passou a ser considerado hoje uma demagogia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">É verdade que
Mariana Mortágua poderia ter procurado explicar com mais detalhe algumas das
propostas que foi elencando, algo difícil de fazer no modelo que o próprio
debate impõe. Não é possível explicar em trinta segundos a relação constitutiva
entre vistos <i>gold, </i>corrupção e especulação imobiliária, muito menos
fazê-lo com André Ventura do outro lado da mesa. Não há nenhuma demagogia
política nas propostas do BE ou da CDU ou do Livre há, sim, opções políticas
que visam reduzir o peso implacável da máquina financeira sobre as cidades e
sobre aquilo que era, até há bem pouco tempo, um direito constitucional e não
apenas um activo bancário: a habitação. A conversão da habitação em activo de
fundos de investimentos sem rosto, escondidos nessa utopia do liberalismo
financeiro que é o <i>offshore</i>, é um problema central de uma economia cada
vez mais dependente de um rentismo monopolista que, na verdade, tem vindo a pôr
em causa a liberdade do próprio mercado, dos pequenos empresários e
comerciantes. Basta ver o que se passa hoje nas cidades, onde as altas rendas
são um entrave ao estabelecimento não apenas de habitantes, mas de novos
negócios, neutralizando a própria dinâmica da economia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Permitam-me um
pequeno desvio. É preciso que se diga, de uma vez por todas: não foi o alojamento
local que reabilitou os centros históricos das cidades, mas sim todo um
conjunto integrado de políticas que fizeram do turismo o núcleo fundamental da
economia e apostaram no investimento estrangeiro. Do mesmo modo, o abandono e a
desertificação das cidades não foi um processo natural, mas foi o resultado de
cinquenta anos de políticas de esvaziamento dos centros urbanos. A democracia impôs
um <i>modelo suburbano,</i> capaz de responder às exigências de estatuto das
classes médias, que se baseou no entrelaçamento de três eixos fundamentais: <i>casa,
carro </i>e<i> centro comercial</i>; um modelo que assentava na valorização
urbana dos solos periféricos, no sistema do crédito bonificado e num sector da
construção civil pouco profissionalizado e sem grande capacidade para intervir
em processos de reabilitação. Esse modelo terminou definitivamente em 2008, com
o início da crise financeira, obrigando Portugal, ao longo dos anos da Troika,
a redireccionar a sua economia para o turismo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Ora, voltando ao
debate, para André Ventura — e <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>para a
direita no seu todo — qualquer medida que vise <i>mexer </i>no mercado é
reunida sob o epiteto de «<i>mais Estado</i>», «<i>Estado por todo o lado</i>»,
mas a verdade é que sem um quadro regulatório mínimo não são apenas as cidades
que se tornarão inabitáveis, é o próprio mercado que implodirá. A <i>mão
invisível</i> do mercado, o sonho de uma auto-regulação divina do mercado: isso
sim é um «festival de demagogia» que a história já se
encarregou de expor vezes sem conta. Foi, aliás, precisamente contra esse liberalismo
<i>laissez-faire,</i> que mergulhou a Europa numa grave crise económica e
social, que a social-democracia se afirmou definitivamente após a Segunda
Guerra Mundial. Mas na «era da finança», na era de uma economia rentista, é de
novo o desmantelamento de qualquer quadro regulatório que se tornou um alvo. Mas não só: é toda a ideia de uma protecção social colectiva, é toda uma
noção de bens comuns e de direitos essenciais básicos — saúde, habitação,
educação — que é preciso <i>privatizar,</i> para que estes possam entrar no
gigantesco circuito de despossessão da finança.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">A direita quer
menos impostos, mas quer o Estado a pagar o acesso a uma saúde providenciada
pelo privado. O neoliberalismo não quer menos Estado, quer que o Estado, isto
é, os contribuintes, sejam financiadores do negócio privado. E que o façam
duplamente, inscrevendo-os simultaneamente na lógica dos seguros de saúde. É
que, ao contrário do que Montenegro dizia a Mortágua, o privado não «somos você
e eu», não é a classe média, não são os pequenos «proprietários»; pelo
contrário, são os grandes grupos económicos, os grandes monopólios que fazem da
exploração dos direitos básicos colectivos </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 18.6667px;">—</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 19pt; letter-spacing: -0.2pt; text-align: left;"> </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt;">que a democracia elegeu como seus </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 18.6667px;">—</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt;"> funções absolutas do seu negócio. Essa é a grande armadilha política que se
esconde sob a lógica e sob o nome «privado».</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">É por isso que o
Chega é o grande partido da classe média, isto é, da classe média dos pequenos
proprietários endividados: ele não representa os <i>privados,</i> representa, sim,
uma fatia considerável daqueles que estão hoje nas mãos dos <i>privados</i>,
endividados pelo mercado, endividados pelo capital rentista, endividados pelos
bancos. A oposição histórica da <i>Sociedade contra o Estado</i> é transformada
na oposição <i>Mercado contra o Estado</i>. E é essa a operação
político-teológica que consuma o sucesso actual da extrema-direita: <i>mobilizar
o ressentimento contra o mercado como ressentimento contra o Estado (social)</i>,
isto é, <i>como ressentimento contra a própria democracia</i>. É esse o papel
da extrema-direita: fazer com que o Mercado permaneça intocável, que este possa
continuar o desmantelamento da Social-democracia e do Estado social; isto é,
fazer aquilo que a direita não foi até agora capaz de levar a cabo, nem que
para isso se coloque em causa a própria democracia. É essa a ironia da
extrema-direita: permitir o avanço derradeiro do neoliberalismo financeiro à
custa daqueles que diz defender, a classe média. A direita do Chega não é
anti-sistema, ela é o sistema — neoliberal e financeiro —, Saturno devorando os
filhos da social-democracia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Estamos, portanto,
numa situação política singular: o Estado, essa entidade demiúrgica e totalizadora
que mobilizou a crítica da esquerda, transformou-se no último baluarte da
defesa dos direitos inalienáveis da constituição democrática. E mais, fez da
esquerda o seu último grande defensor. É por isso que o epíteto «festival de demagogia»
é, ele próprio, tão demagógico e intelectualmente ignorante: porque nada nas
posições de um partido como o BE, a CDU ou o Livre é extremista: eles são, pelo
contrário, os últimos defensores do projecto da social-democracia — esse mesmo que
o PS provou na última década ser incapaz de defender. Eles, CDU, Bloco e Livre,
são o <i>centro político</i>: oferecem uma reflexão estruturada — bastou ver os
debates entre cada um dos partidos —, medidas e um programa mínimo de regulação
para que o mercado, ele próprio, possa funcionar tanto economicamente, como
socialmente, isto é, para a sociedade no seu todo, para essa sociedade dos
pequenos proprietários e não apenas para a sociedade dos grande proprietários. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">E este é o
paradoxo que determina a difícil posição em que a esquerda se encontra: ela
está na posição de falar para aqueles que foram sempre os seus <i>inimigos políticos
</i>e que sempre viram na esquerda o espectro capaz de colocar em causa a ordem
social-democrata da classe média — papel destruidor que afinal veio a caber aos
próprio partidos sociais-democratas. Hoje, no entanto, classe média e esquerda,
são aliados e não o sabem. É também neste sentido que devemos perceber o papel
da extrema-direita: ela visa neutralizar a possibilidade de uma frente comum,
de uma aliança entre classe trabalhadora e classe média. Mas o seu sucesso só é
possível porque a social-democracia no seu processo de pacificação política e depois
o neoliberalismo, no seu processo de precarização laboral e social, fizeram da
classe média um gigantesco vazio político e intelectual, uma massa
politicamente dessubjectivada e politicamente iletrada. Mas há ainda um outro
aspecto fundamental da crise da esquerda, porque o proletariado ainda existe ou,
melhor, existe economicamente e socialmente, mas não politicamente: isto é, a
grande massa de trabalhadores é hoje mão-de-obra migrante, trabalhadores
migrantes sem qualquer direito político. Temos um proletariado internacional e móvel
que não detém representação política suficiente dentro do quadro democrático
para lutar pelos seus direitos, isto é, não vota. E é esse um aspecto que diz
também muito do momento histórico que atravessamos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas há uma
última reflexão que interessa fazer. Acusar as propostas do Bloco de Esquerda de
demagógicas não reflecte apenas uma radicalização da direita política, mas a
condição de um comentariado nacional que fez da posição de isenção e
objectividade com que o jornalismo os dotou, o campo de uma batalha sem tréguas
não apenas contra a social-democracia, não apenas contra a democracia, mas diga-se
contra o próprio jornalismo. O sistema de avaliação por notas no final dos debates
exprime lapidarmente isso mesmo ao esconder, por detrás da objectividade e da
fria neutralidade do número, todo um programa ideológico e político que vê
demagogia por todo o lado excepto nos seus próprios argumentos, excepto na sua
própria posição de jornalista-ideólogo. A indicação em rodapé identifica o
comentador como jornalista, mas será essa a posição a partir da qual este fala?
É verdade, dirá o leitor atento, que o jornalismo viveu sempre de uma
ambiguidade e de um confronto entre os critérios de objectividade e isenção que
definem o seu campo e o posicionamento ideológico e político em que
naturalmente se insere. Mas a questão que se coloca, precisamente por causa de
toda esta reconfiguração do espectro político, é a da pluralidade. Ora, se a
pluralidade política é o princípio fundamental da democracia, aquilo que hoje o
sistema do comentariado nacional — mas também os meios de comunicação social no
seu todo — revela de forma tão evidente é o fim dessa pluralidade da
democracia. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">É provável que,
para a jornalista aqui citada, não exista nenhum problema em que um fundo de
investimento sem rosto possa deter uma casa ou mesmo uma cidade, porque isso é
«bom» para a economia. E, no entanto, aquilo que a crise do grupo Global Media,
hoje nas mãos de um fundo de investimento sem rosto localizado num <i>offshore</i>,
expôs de forma tão evidente — e expôs ao próprio jornalismo — é a contradição
absoluta de entregar determinados sectores — sectores fundamentais à vida
social e democrática — à lógica da mão invisível do mercado, aptos a serem
desbaratados como activos no negócio sem tréguas da finança, ainda que isso
possa ser «bom» para a economia. Chegamos ao momento em que o capitalismo já não
serve a liberdade de imprensa. E não sou eu que o digo, é o jornalista Pedro
Coelho, em entrevista a Daniel Oliveira no programa «Perguntar Não Ofende». A
crise do jornalismo é também a crise da democracia. Mas não é apenas porque
este deixou de ser rentável para o capitalismo: é porque o princípio que fundou
a sociedade democrática no seu todo, o princípio da autonomia de uma esfera pública
e crítica — à qual o jornalismo, mas também, por exemplo a Universidade,
pertencem — está hoje em crise. E está em crise, por uma razão muito simples:
porque o capitalismo deixou de ter necessidade de se legitimar, primeiro contra
a velha ordem da aristocracia, depois contra o espectro do comunismo. Quem
diria que, com a queda do muro de Berlim e da União Soviética, em 1989, se
consumaria não a vitória, mas a queda, lenta e penosa, da social-democracia? <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Editor
do Jornal Punkto, arquitecto, crítico e ensaísta, investigador no CEAU (Centro
de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«Dizer
qualquer coisa de esquerda»</span></i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"> • Pedro Levi Bismarck<i><o:p></o:p></i></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 15.02.2024<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#41 • Inverno 2024</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-75095993674426138742024-02-07T09:58:00.000-08:002024-02-16T09:35:29.739-08:00Que a eternidade nos abrace • Toni Negri<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgTMbWLryc4JQ9D9diUzZE3pQrlXllNICpyFYtn2NDNsr0NspMnHEdCMRGhsdNXEmnsx6ftRRSVeqsGG3nIVDW4pXfyCm4pt8i069eydJfZkOGZOQaS8cOk-LTlpwPlMaDF1q8y7opj1j8lMHZAlfgqnoG6usR6pAl8xlI5x_9RSDtg_70d2c8a0Fb7dO0L/s1170/17desk1-riapertura-toni-negri-bascetta-foto-di-tano-d-amico-archivio-manifesto.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="829" data-original-width="1170" height="328" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgTMbWLryc4JQ9D9diUzZE3pQrlXllNICpyFYtn2NDNsr0NspMnHEdCMRGhsdNXEmnsx6ftRRSVeqsGG3nIVDW4pXfyCm4pt8i069eydJfZkOGZOQaS8cOk-LTlpwPlMaDF1q8y7opj1j8lMHZAlfgqnoG6usR6pAl8xlI5x_9RSDtg_70d2c8a0Fb7dO0L/w463-h328/17desk1-riapertura-toni-negri-bascetta-foto-di-tano-d-amico-archivio-manifesto.jpg" width="463" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Por
vezes sinto-me completamente estranho face ao mundo que me rodeia. Sensação
curiosa para quem preencheu três volumes com uma história de intensa imersão no
existente. Provavelmente, digo a mim mesmo, é porque estou velho; por mais que
me agite, tentando manter aberta a comunicação com amigos mais jovens e
despertos, a minha percepção é obtusa. Mas depois pergunto-me: não serão, esta
visão do mundo e esta noção de estranheza, verdadeiras?<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Verdadeiras? Quero dizer que esta percepção
de estranheza não depende de mim, da minha insuficiente ou diminuída atenção,
mas que o mundo que me rodeia se tornou, de facto, feio e inconsistente. Será
que a minha confiança no ser, a minha admiração pelo que é vivo, já não
corresponde a algo que se possa amar?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Feio,
belo, vivo, amado... são adjectivos de difícil definição e de grande
relatividade. Sendo assim, talvez não deva confiar nestes termos para constatar
a minha dúvida. Talvez o único adjectivo válido, entre os muitos que utilizei
desde o início, seja «estranho». Um efeito de estranhamento é aquilo que
provocam em mim as linguagens e os estados de espírito, não importa se
individuais ou colectivos, que ressoam na sociedade, fora de mim. Julgo que
estou surdo e que escuto sons confusos. Na realidade, um pouco surdo, eu estou,
mas os sons confusos, não os escuto com os ouvidos, mas com a alma, com o
cérebro. Escapa-me o mundo à minha volta. Tive uma vida longa, conheci
contradições enormes e conflitos mortais, todavia sempre soube do que se
tratavam, os elementos da contradição e do conflito estavam dentro de um quadro
conhecido, de qualquer modo, significante — por que razão é que o significado
dos acontecimentos que se desenrolam hoje em torno de mim se obscurece e me
escapa?<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Em que consiste a sua
insignificância? Há todo um mundo novo que representa esta estranheza. Um mundo
novo, mas cansado, prostrado diante das dificuldades físicas, políticas e
espirituais da sua própria reprodução. Dificuldades económicas e declínio das
referências políticas, colectivas, de valores. A comunicação tornou-se
frenética, mas os significantes esbatem-se na velocidade. Há confusão nos
espíritos. Há corrupção nas linguagens. As velhas referências de luta
desapareceram:<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>direita e esquerda,
sindicatos e partidos, sentido e significado da história… este é o mundo que me
rodeia. Não depende da minha velhice, do meu cansaço: é assim.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Quando
reflicto sobre esta fenomenologia do presente, quanto mais afino o olhar, mais
a única, a última figura valorativa e descritiva, que me parece investir o
mundo de significado e permitir descrevê-lo é aquela do niilismo.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Os signos carecem de sentido, os rostos
carecem de sorrisos e os discursos estão vazios. Não sabemos do que falar. Vejo
no rosto altivo do interlocutor um esgar — é sempre o mesmo que encontro em
grande parte dos meus interlocutores. Por isso é uma grande festa quando se
encontra alguém indemne desta patologia. A gente está<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>desesperada. Quando penso naqueles que, no
meu tempo, já antigo, desenvolveram concepções niilistas para a sua filosofia,
e culminaram, com frequência, na <i>krisis,</i> no pessimismo e na expectativa
da catástrofe (e os meus leitores sabem com que persistência e com que dureza
os combati) — todavia, quando penso neles, quase me comovo agora com a sua
doença, que era consciente e sofrida. Ao passo que hoje tenho diante de mim
personagens cuja ética é niilista e catastrófica, não como resultado de um
labor crítico, mas porque a sua existência não tem consistência, ainda que
quando, ao convivermos, pareçam levar uma vida comum. Não têm paixões, na
realidade, não têm significantes, não têm fé — por tudo isso, pensam que a
linguagem devia ser depurada, lavada e re-lavada, e conduzida a uma pureza
significativa, a pureza do lavatório onde foi depurada. Na verdade, deitam fora
o significante com a água suja do banho. Resta-lhes esse ideal de pureza — o <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>«<i>reine</i>» da razão, da sensibilidade, do
conceito — que se tornou adjectivo do vazio, do mero resto depois do
esvaziamento do ser. Quando olho à minha volta, sinto-me rodeado destes
zombies, de milhões de zombies.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">É
realmente novo este mundo? É certo que se consolidou recentemente, e está a
crescer, em breve este «novo» ocupará tudo. Mas não é novo. Eu tenho 85 anos.
Até aos meus 25-30 anos, este «novo» mundo era, em formas sólidas e efectivas,
o mundo de entre-guerras e do segundo pós-guerra. Foi o mundo que me oprimiu e
contra o qual lutei. Tínhamo-lo metido no sótão e parcialmente destruído,
e<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>agora esse mundo velhíssimo ressurge
hegemónico. É o mundo fascista da minha infância e juventude. Era o mundo no
qual «patriarcado-exploração capitalista-soberania da nação» dominavam, como
patrões, a vida e as mentes das pessoas. E traíam a generosidade e a
inteligência dos jovens para conduzi-los em aventuras ilusórias: o patriotismo,
a nação, a raça, a identidade, a masculinidade eram assumidos como valores
superiores. Chama-se fascista, esse mundo, não só conservador, mas reaccionário,
não só religioso mas fanático na destruição de toda a liberdade. Um mundo onde
o cansaço de viver dominava todas as outras paixões, e onde uma dura disciplina
forçava as almas à insensibilidade perante a dor. A opressão impelia à
insignificância. É a isto que regressou o mundo presente?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas,
se for esse o caso, como poderão ler-me, e como poderão compreender-me, os
jovens de hoje? O meu livro parecer-lhes-á afundar-se em longínquas
profundezas, dificilmente acessíveis. Será, para eles, um documento
arqueológico. E o meu editor, porque deverá publicar este texto, no máximo,
digno de arquivo? Haverá ainda um número suficiente de velhos que apreciarão
esta história e agradecerão ao editor por este a ter publicado?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Quando
— não há muito tempo — um horrendo personagem fascista ascendeu à presidência
de um grande país, o Brasil, alguns jovens amigos perguntavam: «<i>O que
podemos fazer? Como agir para resistir?</i>», respondi: «<i>Não tenham medo</i>».
Esta é a condição para construir uma grande e efectiva resistência. O fascismo
rege-se pelo medo, produz o medo, institui e mantém o povo no medo. Não ter
medo: é tudo o que temos de ser capazes de dizer ao povo, entre o povo, na
multitude que hoje sofre o regresso da barbárie fascista, também aqui, sob o
nosso sol. Não ter medo de romper a prisão da linguagem vazia que nos é imposta
e rir da autoridade, onde quer que ela se apresente com a grotesca máscara
fascista. Não ter medo significa libertar as paixões e, desse modo,
preencher<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>aquelas formas linguísticas
que o processo fascista de subjugação deixou vazias. Parece que o século se
obscureceu: repelir o medo, produzir resistência, é, antes de mais, dissipar as
sombras, reconquistar o sentido das palavras. Preenchê-las com coisas, com
realidade, com liberdade. Subjectivá-las. Mas a operação principal consiste em
reconhecer que o fascismo é sempre o mesmo, é sempre a repetição da violência
para bloquear a esperança, é o velho — os desvalores absolutos do patriarcado,
da violência da exploração e da soberania — que volta a ser ilusoriamente
proposto como uma necessidade do espírito e uma obrigação da moral, quando, na
verdade, é fundamento de uma cultura de morte. «<i>Viva a morte</i>» é a
palavra de ordem do fascismo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">«<i>Viva
a vida</i>» é a resposta de quem não tem medo. A Primavera regressará. Regressa
sempre! O fascismo parece eterno e, de facto (embora breve), parece uma pena
demasiado longa, mas o fascismo é frágil. Em confronto com a paixão do viver
livre, quão pouco se poderá sustentar. A liberdade impõe-se necessariamente contra
o fascismo, pois com a liberdade estarão as outras paixões políticas fortes,
como aquela pela igualdade e aquela pela fraternidade. A Primavera regressará e
será uma<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>verdadeira estação do novo.
Porque, se o fascismo é sempre igual, a Primavera da liberdade é sempre nova,
sempre diversa, sempre plena de dons.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Olhem
para o passado, olhem de novo para as grandes estações de luta. Poderíamos
recuar tanto… bastam dois exemplos. 1848 e 1968 são datas fundamentais para a
minha geração. A primeira, a inauguração do socialismo na Europa, dentro e
contra o desenrolar das contradições vindas da revolução francesa e da
maturação da acumulação capitalista. Deste encontro surgiu o antagonismo entre
liberdade e igualdade e aquele da igualdade como fraternidade do povo <i>versus</i>
a liberdade como nacionalismo e soberanismo. Os reaccionários estão sempre de
um lado, rígidos, encerrados na defesa dos seus privilégios; os
revolucionários, pela primeira vez, erguiam a bandeira vermelha da fraternidade
entre os povos. Um século de lutas ferozes seguiu-se a 48. O socialismo
afirmou-se, e depois foi derrotado, deixando, porém, uma enorme herança de bens
públicos, ou melhor dito, de «comuns» para as novas gerações. Foi sobre este
terreno de inovação e de potência que se abriu 68. O «comunismo» era o seu
horizonte. Tratava-se de tornar «comum» aquilo que era público, de obter mais
comum do público conquistado no jogo democrático. O fruto do socialismo tinha
de ser multiplicado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Estivemos
e continuaremos dentro desta batalha, nossa e dos nossos filhos. Foi nova, essa
vaga de vontade democrática que uma vez mais pôs o mundo de pernas para o ar. E
repete-se: a cada dez anos, mais ou menos, teremos grandes episódios, alargados
e difusos, de revolta. Os ciclos de Kondriatev acabaram. Os ciclos de
subjectivação do comum tomaram a dianteira: de cada vez adaptando a resistência
para superar os obstáculos criados por uma repressão agora convertida em «ciência
de governo». Cada «<i>governamentalidade</i>» é uma operação capitalista,
soberana, para bloquear e constranger os movimentos produtivos do trabalho
vivo. A resposta a isto é feita através de um ataque renovado dos movimentos
cidadãos-trabalhadores e com a capacidade de fazer valer as conquistas alcançadas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Olhemos<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>com atenção para este jogo que se joga desde
68. Resistência dos trabalhadores para conquistar a satisfação de velhas e
novas necessidades, seguida de repressão. Mas pode a repressão cumprir o seu objectivo
de bloquear a acção subversiva? Muitas vezes, vimo-nos forçados a responder
positivamente a esta pergunta. Mas, mesmo quando o movimento subversivo é
bloqueado, é preciso averiguar se a luta tem, de facto, um resultado negativo
(ou relativamente negativo). Pois bem, não é assim. As reformas que as lutas,
ainda que perdedoras, acumulam são importantes, são um incremento do «comum»
nas mãos das multidões do proletariado. Cuidado com as velhas vozes do passado:
a positividade deste processo significa que devemos ser «reformistas» na
condução do movimento? De modo algum. Os reformistas não acumulam nada de
comum, acumulam somente derrotas e demolições do comum, colaboram na <i>governance</i>
capitalista, corrompem e pervertem as lutas. Pelo contrário, só as lutas de
resistência, que se tornam subversivas, acumulam a riqueza comum e a subdividem
pelas instituições do comum. Rodeados de instituições do comum, conquistámos um
certo progresso para as nossas vidas e para as vidas dos nossos filhos.
Testemunho-o de bom grado na minha velhice.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas
para manter aberto este dispositivo do «comum», da sua conquista e acumulação,
a história das lutas ensina-nos que é preciso organizarmo-nos. Passei a minha
vida a tentar resolver esta tarefa. Não creio que tenha conseguido — isto é,
descobrir uma fórmula organizativa que tivesse a eficácia do «sindicato» na
Segunda Internacional ou do «soviete» na Terceira. Identificámos o terreno da
multitude como um conjunto de singularidades, operando como um enxame, como uma
rede, provavelmente organizável numa verdadeira democracia directa. No entanto,
nunca conseguimos ir além das experiências <i>in vitro.</i> Mas esse é o
caminho, e percorrê-lo já permite à dialéctica da resistência e da subversão,
desestabilizar o poder inimigo e desestruturar o seu sistema produtivo, e assim
preparar a conquista do comum e a construção de instituições do comum. Há
ainda, no entanto, um longo caminho a percorrer, e a falta de organização, os
tempos vazios da empresa subversiva, têm um preço.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Confrontamo-nos
com um fascismo ressurgente. Sabemos que a luta se está a tornar difícil. Não
tenhamos medo. Estamos na<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>linha da
frente. Pensemos que a nossa resistência é eficaz. Mas temos de nos preparar
para as consequências extremas a que o fascismo pode conduzir: a guerra. Quem
viveu a guerra, quem a sofreu, sabe que a guerra é, foi e será uma irresistível
máquina de destruição. E, desta vez, da humanidade inteira, dados os meios
bélicos de que as grandes potências capitalistas dispõem. Guerra entre
potências = destruição das raízes da humanidade. O fascismo pode produzir este
desastre do humano, este massacre da sua história no planeta. Por isso, lutar
contra o fascismo é lutar pelo humano. Sem esquecer jamais que o fascismo é
capaz de o destruir, quando se apercebe que as regras patriarcais da sociedade,
a estrutura de comando para a exploração e a soberania do seu próprio interesse
na forma política do Estado estão em perigo. Concentremo-nos neste ponto e
organizemo-nos para não sofrermos a decisão de guerra de um capital que se
cruzou com o fascismo. Evitar a guerra, lutar e vencer o capital sem passar
pela guerra é a nossa tarefa. Como fazê-lo? O pacifismo será a nossa arma,
porque a paz é o nosso desejo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Vivi
e sofri o fascismo. O meu coração fica ofendido e o meu cérebro traumatizado
quando penso nessa experiência. Vivi depois, desde 68 até hoje, sem medo do
fascismo. Os crimes de que foi acusado, a <i>Shoah</i> em primeiro lugar,
impediram-no de voltar a ser desejado, a grande massa da população parecia
tê-lo repudiado definitivamente. Só os funcionários da soberania puderam
acompanhar na memória (e sendo coniventes na prática) essas condutas criminosas
— renovando-as, por vezes. A repressão do 68 europeu foi um exemplo disso. No
entanto, nunca tive medo, apenas desenvolvi desprezo por esses criminosos. Hoje
as coisas são diferentes: somos envolvidos por uma nuvem de fumo sulfuroso, uma
atmosfera espessa, impossível de atravessar a olho nu. O fascismo é
omnipresente. Temos de nos revoltar. Há que resistir. A minha vida está a
esvair-se, lutar depois dos 80 anos torna-se difícil. Mas o que resta da minha
alma conduz-me a esta decisão.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Na
resistência ao fascismo, na tentativa de quebrar este domínio, na certeza de o
conseguir, este livro foi escrito. Só me resta, meus amigos, deixar-vos. Com um
sorriso, com doçura, dedicando estas páginas, estes três volumes que estou a
concluir, aos homens virtuosos que na arte da subversão e da libertação me
precederam, e aos que se seguirão. Dissemos que são «eternos» — que a
eternidade nos abrace.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><br /></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 30pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: "Avenir Next Regular"; mso-fareast-font-family: "Avenir Next Regular"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: justify;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Antonio
Negri</span></b><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Antonio
Negri é um filósofo e militante marxista e comunista com um longa participação
política e percurso intelectual. Preso e exilado em Paris pela sua participação
e mobilização no movimento da <i>Autonomia Operaia</i> que liderou. Foi ainda
profícuo autor, escrevendo, entre outros, <i>Crisi dello Stato-piano: comunismo
e organizzazione rivoluzionaria</i>, <i>Dall'operaio massa all'operaio sociale:
intervista sull'operaismo, L’anomalia selvaggia: saggio su potere e potenza in
Baruch Spinoza,</i> e com Michael Hardt <i>Impero: il nuovo ordine della
globalizzazione,</i> <i>Moltitudine: guerra e democrazia nel nuovo ordine
imperiale</i> e <i>Commonwealth</i>. Morreu em Dezembro de 2023, em Paris.</span><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Nota
da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Este
texto foi publicado em italiano na </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><a href="https://www.euronomade.info/leternita-ci-abbracci/"><span style="color: #97694b;">Euronomade</span></a> </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">no dia da morte de Negri a 16 de Dezembro de 2023. Foi
escrito a propósito do lançamento do terceiro e último livro da série <i>Storia
di un comunista 3 – Da Genova a domani,</i> lançado em 2020. A tradução esteve a cargo de Paulo
Ávila a partir da tradução italiana e espanhola publicada no </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><a href="https://lobosuelto.com/que-la-eternidad-nos-abrace-toni-negri/"><span style="color: #97694b;">Lobo suelto</span></a></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">!<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Toni
Negri durante uma audiência em 1983. Fotografia de Tano D'Amico. Via </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><a href="https://ilmanifesto.it/nelle-pieghe-dellindignazione"><span style="color: #97694b;">il manifesto</span></a></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Ficha
técnica</span></b><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">«<i>Que
a eternidade nos abrace» </i>• Toni Negri<i><o:p></o:p></i></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Data
de publicação •07.02.2024</span><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Edição
#41 • Inverno 2024</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-26721260666810753112024-01-26T08:36:00.000-08:002024-02-07T02:58:51.536-08:00O bom, o mau e o militante. Toni Negri (1933 - 2023) • Luhuna Carvalho<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiWWMmtZhwAqSjditw-0AZrN4PPxsZbSqh1f2TD5MQxwmj-SChxZCzHswvUfpfzpaMP-_VI0Jlu8uwAC5E-k4-tqSAy4ikz3Z5BUhrrWCPEKV_Ky0oqoyHqBqywSMEW0F87bXXmVCqEnOw0TxrD7nLHeCVXnzhX6UwkXOnCnyK6sfY7JL9GPCPho0tLyD08/s2048/GBd9FOjXkAAba-I.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="2048" data-original-width="1536" height="701" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiWWMmtZhwAqSjditw-0AZrN4PPxsZbSqh1f2TD5MQxwmj-SChxZCzHswvUfpfzpaMP-_VI0Jlu8uwAC5E-k4-tqSAy4ikz3Z5BUhrrWCPEKV_Ky0oqoyHqBqywSMEW0F87bXXmVCqEnOw0TxrD7nLHeCVXnzhX6UwkXOnCnyK6sfY7JL9GPCPho0tLyD08/w525-h701/GBd9FOjXkAAba-I.jpeg" width="525" /></a></div><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Os
situacionistas diziam que tinham um pai que amavam, Dada, e um pai que odiavam,
o Surrealismo. Para muitos de nós, Toni Negri cumpria ambos os papeis. O longo
Maio de 68 italiano permanece um dos nossos últimos mitos, ainda que demasiado
jovens para o ter vivido em primeira mão. Grande parte das nossas lutas, nas
ocupações e nas ruas, ocorreu dentro dos repertórios fragmentados que herdámos
desse período, quer o saibamos que não, sendo essas lutas a única forma de
comunidade que alguma vez conhecemos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">O
Negri que amámos foi o Negri que abandonou uma carreira académica confortável e
promissora para se tornar num agitador subversivo. Foi o Negri que nos ensinou
que a raiva, o desespero, o ódio e a alienação que sentíamos não eram senão um
desejo febril de uma vida e de um mundo diferentes, não eram senão uma estranha
e profunda paixão pelos nossos camaradas e companheiros, não eram senão uma
obsessão com a questão da abolição do capitalismo. O Negri que amámos foi o
Negri que afirmou que <i>ricominciare da capo non significa andare indietro</i>
(recomeçar do início não significa andar para trás), transformando o partido <i>Potere
Operaio</i> na rede rizomática de colectivos da <i>Autonomia Operaia.</i> Foi o
Negri que celebrou a recusa proletária da memória de esquerda, sempre tão
melancólica e institucional. Foi o Negri que leu cada conceito económico
enquanto uma categoria de antagonismo. Foi o Negri que nos mostrou uma
dignidade, um fervor e uma alegria inerentes ao acto de lutar que o cinismo da
teoria crítica nunca realmente conseguiu compreender. Foi o Negri que levou a
sério quando Marx disse que o comunismo era «o movimento real de abolição do
estado de coisas existente», percebendo como os momentos de luta eram também
momentos de comunhão, e portanto instâncias concretas de algo ainda por vir.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">O
Negri que rejeitámos, com uma impaciência reservada a quem nos é próximo, foi o
Negri da busca desesperada por um novo sujeito colectivo, as suas sucessivas
hipóteses desaparecendo desvanecendo uma após a outra. Foi o Negri que lia cada
nova moda enquanto uma expressão de «resistência», sem nunca explicar bem como
ou porquê. Foi o Negri que transformou o pós-operaismo numa sociologia vulgar.
Foi o Negri da União Europeia, o Negri do rendimento básico universal, o Negri
constituinte, o Negri democrático, o Negri aceleracionista, etc.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
houve, na verdade, qualquer oposição entre o Negri do passa-montanhas e o Negri
cidadão. Ante a sua morte, temos de admitir que essa distinção foi uma invenção
toda nossa. Negri foi profundamente consistente. A continuidade do seu
pensamento reside em como o seu optimismo <i>beckettiano</i> esteve
inerentemente presente ao largo de todo o seu trabalho político e filosófico.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Tudo
começou com a famosa «viragem coperniciana» de Mario Tronti, o lendário parágrafo
vermelho da capa da revista <i>Classe Operaia:</i> «temos de inverter o
problema, mudar o signo, recomeçar do início, e o início são as lutas de classe
operárias». Foram as lutas operárias que obrigaram os capitalistas a criar o
capitalismo e o desenvolvimento capitalista foi sempre dirigido pelas suas
lutas mais avançadas. A tradução para inglês deste parágrafo foi sempre
complexa. O original diz «luta de classe operária» e não apenas «luta de
classes». A primazia da lutas estava ancorada nas especificidades concretas do
trabalho industrial da classe operária italiana do pós-guerra, e não na «classe
trabalhadora» ou no «povo» por inteiro. O antagonismo espontâneo e criativo
desta classe operária surgia de uma conjugação particular entre a sua inclusão
económica e a sua exclusão política, uma tensão que alcançava a sua maior
expressão nas fábricas do milagre económico italiano. A ontologia política do <i>Operaism</i>o
foi fundada na distinção entre os operários e a classe trabalhadora enquanto
tal.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Negri
abole esta diferença trontiana, um gesto ao mesmo tempo brilhante e espúrio. A
essência desse antagonismo não era qualquer forma de trabalho produtivo <i>per
se,</i><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>mas as formas de separação e
alienação concretas sofridas por estes operários. A extensão do domínio
capitalista sobre a reprodução social significava que essa separação e alienação
estavam agora em todo o lado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Ao
observar o modo como esse antagonismo selvagem se estendia da fábrica para a
metrópole, Negri desenvolveu as ferramentas conceptuais com que nomear, armar e
organizar esse antagonismo difuso, algo que nem o situacionismo nem o
anarquismo conseguiram verdadeiramente fazer. Negri desenvolveu a possibilidade
de um comunismo imediato e imanente às lutas em si próprias. O comunismo não
era um prémio à espera no final da caminhada pelas etapas toscas e aldrabadas
do materialismo dialético, era algo que estava já aqui, presente na
inteligência violenta, radical e colectiva que emergia por entre mil actos de
antagonismo, insurreição e comunização.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
primazia absoluta que Negri lia nas lutas postulava um conteúdo positivo dentro
do fenómeno da recusa do trabalho. Por trás da sabotagem, das greves selvagens
nas fábricas e da subversão na metrópole estava a afirmação social de um modo
proletário de produção. «Auto-valorização» foi um dos seus primeiros nomes, «multitude»
um dos seus últimos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
omnipresença social desse antagonismo foi evidente durante os anos setenta, mas
tornou-se cada vez menos evidente à medida que o longo Maio Italiano terminava.
Como poderia esse «conteúdo positivo» inerente à recusa do trabalho
expressar-se quando essa recusa do trabalho deixava de ser uma prática de
ruptura? Se Negri defendia uma primazia social das lutas, não ancorada na
fábrica, então essa primazia tinha de se tornar numa teoria da vida social
contemporânea, capaz de redescobrir algo semelhante à agitação das décadas
anteriores numa sociedade civil cada vez mais fragmentada e insipiente. O
pós-operaismo acabou por ver cada mínimo espasmo do corpo social enquanto «auto-valorização»
e enquanto possibilidade de «resistência», sem nunca desenvolver qualquer
critério para distinguir essa resistência de tudo o resto. O resultado final é
que tudo era «resistência» e portanto nada era resistência.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Negri
foi frequentemente acusado de ser pouco dialéctico. Ele próprio concordaria,
sorrindo, mas se Negri pode ser acusado de algo é de ser demasiado dialéctico.
Se Tronti foi, nas suas próprias palavras, primeiro um político e só depois um «pensador»,
Negri foi, com orgulho, antes de tudo um militante e só depois um filósofo.
Negri escrevia para o «movimento», consciente de que escrever para esse sujeito
era um modo de o criar. Não havia razão externa ao movimento subjectivo da
classe, à afirmação do seu conteúdo positivo, e consequentemente a consistência
do trabalho conceptual de Negri apenas seria confirmada nas próprias lutas. «Auto-valorização»
e «multitude» eram conceitos válidos na medida em que a ideia <i>negriana</i>
de movimento se reconhecia neles e nos processos políticos pressupostos neles.
Por outras palavras, a «multitude» só existia quando ela própria acreditava
existir.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Esse
«movimento» não podia senão pressupor as suas condições históricas, o estado e
o capital. O seu antagonismo triunfante existia apenas na medida em que
partilhava um campo de jogo com a equipa oposta, mas isso significava que cada
golo marcado reforçava a aceitação das regras do jogo. É por isso que Negri
nunca foi anarquista, nem nunca o afirmou ser, apesar da sua escrita ter sido
sempre colorida por um libertarianismo vago e de o anarquismo moderno tanto lhe
dever. Para ele, os conceitos e as ideias só existiam quando se tornavam
movimento, e o movimento só existia quando se articulava com as realidades
institucionais do seu período — fossem elas o Partido Comunista Italiano ou a
União Europeia, a Mirafiori ou o empreendedorismo neoliberal.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">No
entanto, à medida que as insurreições vinham e iam, a coerência interna de qualquer
instância de movimento parecia dissipar-se cada vez mais. O Negrismo funcionava
na presunção de que o núcleo dinâmico da política contemporânea residia na oscilação
entre formas constituintes e constituídas. Mas hoje o poder afirma-se através
da sua capacidade de destruir, desmantelar e aniquilar o seu próprio corpo
social, através da austeridade, da exclusão ou da guerra. A coerência da sua
ontologia política, assente numa substância revolucionária, só era sustentável
enquanto essa dialéctica constitucional também o era, mesmo que a ideia negriana
de «potência constituinte» almejasse uma suspensão dessa lógica soberana. O
optimismo irredutível de Negri ganhou, a pouco e pouco, um sabor cada vez mais
amargo, como se a única estratégia restante fosse repetir «estamos a ganhar»
ante a óbvia derrota. A <i>autonomia operaia</i> dos anos 70, para Negri,
existia enquanto modo de libertar o PCI da sua ortodoxia e complacência, não
enquanto modo de o destruir. Mas a União Europeia não é o PCI e a <i>bitcoin </i>não
é a Mirafiori.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Ainda
assim, Negri estava certo, de um modo que poucos outros estiveram, precisamente
nessa insistência de que o comunismo é algo sempre já presente. A sua própria
vida foi, nas suas palavras, uma «vida comunista». Afirmar que uma vida é
comunista não significa afirmar que o comunismo se realizou na integridade
ética dos próprios gestos, afectos e acções, ou acreditar que uma história
pessoal se pode afirmar enquanto exemplo do que é o comunismo. Significa, pelo
contrário, que se escolheu viver dentro da questão do comunismo, com as suas
singulares alegrias e tristezas. A morte de Negri, como a de Tronti e outras,
levanta uma questão de continuidade, especialmente para os que, de um modo ou
de outro, foram criados dentro de tradições militantes devedoras a essas
figuras. Num mundo que suscita pouca esperança, a sua tenacidade lendária é
simultaneamente inspiradora e um fardo. Talvez o único modo de lhe permanecer
fiel seja, nos nossos termos, ensaiar novamente a ruptura inerente ao seu
pensamento. É precisamente porque podemos celebrar o optimismo de Negri que podemos
também sugerir que, hoje, recomeçar de novo pode querer dizer recuar. Recuar
precisamente até à questão do que pode ser essa vida comunista.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 30pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: "Avenir Next Regular"; mso-fareast-font-family: "Avenir Next Regular"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: justify;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Luhuna
Carvalho</span></b><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Lisboa
(1980). Estudou Cinema em Barcelona. Fez um estágio em Nova Iorque. Mestrado na
FCSH. Universidade Nova de Lisboa. Doutoramento no <i>Centre for Research on
Modern European Philosophy,</i> <i>Kingston University,</i> Londres. Autor de
<i>Depois da Lei</i>, Língua Morta, 2022.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Nota
da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Este
texto foi publicado em inglês em </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><a href="https://illwill.com/the-good-the-bad-and-the-militant"><span style="color: #97694b;">Ill Will</span></a>. </span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">No próximo dia 5 de Fevereiro, na Biblioteca Nacional,
irá realizar-se o colóquio</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> <a href="https://bnportugal.gov.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=1862%3Aseminarioaoencontrodeantonionegri&catid=175%3A2024&Itemid=1848&lang=pt"><span style="color: #97694b;">Ao encontro de Antonio Negri</span></a></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> com organização de Amedeo
Policante, Bruno Peixe Dias e José Neves.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Capa
da revista <i>Potere Operaio, </i>Novembro 1973.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Ficha
técnica</span></b><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">«<i>O
bom, o mau e o militante. Toni Negri (1933 - 2023</i>)» • Luhuna Carvalho<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Data
de publicação • 30.01.2024</span><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Edição
#41 • Inverno 2024</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-21735706886267533212024-01-25T03:58:00.000-08:002024-02-26T09:13:06.432-08:00Escola do Porto: um princípio de desassossego (— a propósito do centenário de Fernando Távora) • Pedro Levi Bismarck<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvopXT-ANnCk5h2VsByBQf1gLG2-m5OwXOcrQKKjFyabozYHiIrqi9W2bPyTTKOQVsWQJu9gVHrDuxEa3wXi1Ly02BFSyoyNL5v5jE6EDhVWSQQcIjWmUaPJ_rU9Dxwmas0HIymTqJrcJ-K-KraF2NnKHe7AUAXbjUgvuW-vw8X-bITJFVt0ZrZC9C1EKH/s1200/05_FIMS-FT-0022-Foto0015.1.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="981" data-original-width="1200" height="474" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvopXT-ANnCk5h2VsByBQf1gLG2-m5OwXOcrQKKjFyabozYHiIrqi9W2bPyTTKOQVsWQJu9gVHrDuxEa3wXi1Ly02BFSyoyNL5v5jE6EDhVWSQQcIjWmUaPJ_rU9Dxwmas0HIymTqJrcJ-K-KraF2NnKHe7AUAXbjUgvuW-vw8X-bITJFVt0ZrZC9C1EKH/w579-h474/05_FIMS-FT-0022-Foto0015.1.jpg" width="579" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">A <i>co-memoração</i> de algo implica
um recordar que é <i>co-lectivo</i> e <i>co-electivo</i>. Trata-se de trazer
para o presente a qualidade de algo que se identifica como pertença de todos e
que é fundacional. E, de facto, se Fernando Távora — cujo centenário agora se assinala
— pode ser <i>co-memorado</i> é porque nele podemos identificar a condição
fundadora de todo um espaço comum que define a existência de um modo próprio de
ver, entender e praticar, a arquitectura, que aqui e ali tomou a designação de <i>escola
do Porto.</i> <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Confesso que ao longo da minha formação
na Faculdade de Arquitectura senti sempre uma certa ambivalência, talvez mesmo
um certo desconforto, relativamente a essa designação. Sei-o agora porquê.
Porque, na verdade, exceptuando alguns poucos, ninguém sabia bem o que era<i>:</i>
«É o desenho!», dizia-se, «É o projecto!» declarava-se, «É a história!»,
exclamava-se; «É a síntese de tudo!», afirmava-se por fim. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Neste sentido, a expressão <i>escola do
Porto</i> tinha, de facto, a força de um <i>mito</i>: porque pertencia aquele
domínio das coisas que se sabem apenas na condição de não se saber o que são.
Parafraseando Gertrude Stein, podia-se efectivamente dizer que «<i>A escola do
Porto é a escola do Porto é a escola do Porto é a escola do Porto</i>» [«<i>uma
rosa é uma rosa é uma rosa é uma rosa</i>»]. Mas se a <i>escola</i> se tornou
ou se foi tornando <i>mito</i>, se se <i>mitificou</i>, foi precisamente porque
em determinado momento esta teve de <i>mistificar </i>as suas próprias
condições de existência no contexto de uma rápida transformação da profissão,
mas também das universidades a partir do final da década de noventa até ao
derradeiro golpe que foi a crise de 2008-2014. A crise financeira e económica
não colocou apenas em causa todo um modelo de prática da construção e da
arquitectura que vingou a partir dos anos oitenta em Portugal, mas as próprias
condições materiais — políticas, sociais e económicas — que suportaram esse
modelo: isto é, o fim do projecto do Estado Social e a afirmação definitiva de
uma ordem de mercado neoliberal.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Ao mesmo tempo, a delapidação lenta e
penosa de uma ideia de universidade, em que a «<i>transmissão de saber</i>»
cedeu lugar à «<i>aquisição de competências</i>», com um perfil de aluno cada
vez mais mobilizado pela lógica do <i>portfolio</i> e do empreendedorismo, mas
também assombrado pelas perspectivas de proletarização e precarização da
profissão, exacerbou ainda mais um devir técnico-tecnicista do ensino da
arquitectura: um devir <i>positivista </i>do projecto, poderíamos dizer, sempre
mais lançado em direcção ao «como se faz?», do que a perguntar «porque se
faz?», ainda que confortado aqui e ali pelo horizonte da «<i>professione
poetica</i>».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Curiosamente, os únicos que pareciam
reflectir uma preocupação relativamente a todo este estado de coisas já não
estavam na <i>escola </i>— exceptuando Manuel Mendes e Carlos Machado — mas
fora dela. Sérgio Fernandez, Alexandre Alves Costa, Álvaro Siza e até Eduardo
Souto de Moura, pareciam ser os únicos a demonstrar uma certa inquietação
pública face a esse processo de transformação. Na escola: o <i>mito</i> era a
forma ou, melhor, a fórmula de um silêncio. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Ora, foi precisamente em conversa com
Eduardo Souto de Moura, em Abril do ano passado, numa entrevista para a revista
<i>Electra</i>, que pude finalmente reconhecer qual era o elemento constituinte
comum que unia todas estas gerações de arquitectos — Távora, Siza, Souto de
Moura — e que parecia definir o <i>core </i>dessa entidade que dava pelo nome
de <i>escola do Porto.</i> Ora, se fosse possível reduzir esse elemento a uma
só palavra arriscava dizer: <i>desassossego.</i> Talvez pudesse mesmo ser o título
de uma monografia: «<i>Escola do Porto. Um princípio de desassossego</i>»<i>.</i>
Não é o desenho, não é projecto, não é a história, aquilo que define essa <i>escola</i>,
mas o sentido de uma interpelação das coisas do mundo a partir da arquitectura;
um <i>sentido de desassossego </i>marcado pela tensão entre uma missão ética e social
da arquitectura e a possibilidade (in)adiada da sua efectualização enquanto
projecto de todos para todos — cidade, <i>locus architectonicus</i>; mas
também, um <i>sentido de desassossego</i> presente na relação entre a
disciplina e a profissão, na tensão entre as condições locais da prática, do
atelier, e da <i>língua universal</i> do saber disciplinar da arquitectura. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Para Fernando Távora, como para Álvaro
Siza ou Souto de Moura, a arquitectura não tem simplesmente a forma de uma
prática, mas tem a forma de um saber. Na entrevista à <i>Electra</i>, Eduardo
Souto de Moura sintetiza esse princípio na expressão: «<i>não há desenho sem
cultura</i>». E a mesma advertência relativamente à escola e ao ensino
encontrava-se já em Távora, em 1971, quando este dizia, tão candidamente como
lapidarmente, que «<i>a ideia de que um arquitecto deve ser sobretudo um lápis
maravilhoso é uma ideia ultrapassada, pois não há lápis maravilhosos sem
cabecinhas maravilhosas</i>».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Se Álvaro Siza, Eduardo Souto de Moura
são, entre os arquitectos reconhecidos, os poucos, os únicos, em Portugal, que
têm aproveitado a sua visibilidade para expressar dúvidas relativamente às
condições actuais da arquitectura é porque guardam consigo uma ideia de
«arquitectura como projecto» que está hoje definitivamente posta em causa. Mas
é também porque guardam intacto consigo uma condição de <i>homme des lettres</i>
— como fazia questão de se designar a si mesmo Le Corbusier — que os define não
apenas como arquitectos, mas como intelectuais. <i>Ah, intelectuais, que
palavra tão fora de moda!</i> E, no entanto, foi precisamente essa figura do <i>arquitecto
como intelectual </i>que marcou e construiu a herança disciplinar do século XX.
E é essa condição que Siza e Souto de Moura transportam, cada um à sua maneira:
uma vocação de permanente interpelação, reflexão sobre si mesmo, não naquilo
que os faz <i>ser singular,</i> mas naquilo que os faz <i>ser plural</i>. Não
apenas <i>introspecção</i>, mas <i>extrospecção</i>.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Uma vocação de desassossego para o
mundo, poderíamos dizer, que ambos devem indubitavelmente a Fernando Távora; um
<i>principio de desassossego</i> que animou todo um modo de ser arquitectura
que está, no entanto, cada vez mais longe daquilo que é a condição actual da <i>escola
do Porto.</i> É que o problema da <i>escola </i>não é — como se ouve tantas
vezes dizer — o estar parada no tempo, é antes o de ter perdido a relação
crítica com o tempo: com o tempo passado, com o tempo presente, com o tempo
futuro. É um pouco como em<i> O</i> <i>Castelo </i>de Kafka: os mensageiros
continuam a circular incansavelmente de um lado para outro com as suas
mensagens, mas já ninguém sabe verdadeiramente o que elas significam e a quem
se destinam. É que a tradição, a herança, como escreve algures Jacques Derrida,
não é um dado, mas uma tarefa.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">É por isso que o problema que a <i>co-memoração</i>
nos coloca é tão fundamental como decisivo. Porque o risco que impende sobre
toda a comemoração é sempre o de ir ao encontro do passado, quando se trata
precisamente do movimento contrário: aquilo que é preciso é fazer com que o
passado vá ao encontro do presente, que interpele a nossa condição presente, a
nossa imersão contínua na passividade do tempo do agora. Em suma, fazer do
passado o nosso fiel contemporâneo — foi isso, aliás, que procurei fazer no texto
sobre o Mercado de Vila da Feira.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Co-memorar</span></i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";"> Fernando Távora deve, por isso, servir inevitavelmente para
re-reconhecer a sua obra, para re-conhecer a sua biografia e o seu legado
histórico, mas deve igualmente servir para re-conhecer o presente: confrontar
um modelo de ser arquitecto — um modelo que Távora não se cansou de animar e
mobilizar — e que hoje parece definitivamente a caminho da extinção;<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>confrontar um modelo de profissão e um
sentido social e político da disciplina que está hoje em crise; confrontar um
modelo de ensino universitário, de <i>escola</i>, de aprendizagem da
arquitectura que está em profunda agonia. Mas significa também — por último e
não menos importante — confrontar todo um modelo — que é hoje absolutamente
dominante — de desqualificação e desvalorização do trabalho intelectual, da
investigação e do estudo — um trabalho a que Távora também se dedicou de forma
tão apaixonada ao longo da sua vida. E esta é uma responsabilidade inadiável
que cabe, em primeiro lugar, a instituições como esta onde estamos aqui hoje. Mas,
sem providenciar as condições materiais mínimas e necessárias a todos aqueles
que se dedicam a este tipo de trabalho, são as próprias formas da <i>co-memoração</i>
que são definitivamente colocadas em causa. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">De que serve acumular o passado se ele
se transformou num <i>souvenir,</i> se nos tornamos incapazes de o conhecer? De
que serve erigir grandes arquivos, se as condições de possibilidade da
investigação escasseiam e esta é tratada como uma espécie de <i>hobbie</i>
voluntarista? Porque é preciso não esquecer, como o fez o Walter Benjamin em
plena expansão do nazismo e do fascismo, no início dos anos quarenta do século
passado, que a história não é um arquivo morto, mas um combate sem tréguas:<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12.0pt; margin-left: 4.0cm; margin-right: -.05pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -0.05pt 12pt 4cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">«<i>Cada
época </i>— diz Benjamin —<i> deve tentar sempre arrancar a tradição da esfera
do conformismo que se prepara para a dominar (…) Só terá o dom de atiçar no
passado a centelha da esperança aquele historiador que tiver apreendido isto:
nem os mortos estarão seguros se o inimigo vencer. E este inimigo nunca deixou
de vencer</i>»<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><br /></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></span></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Nota
do autor<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 5pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Cumpriu-se em 2023, o
centenário do arquitecto Fernando Távora, assinalado por um conjunto de
iniciativas organizadas pela Fundação Marques da Silva. A exposição «<i>Fernando
Távora. Pensamento livre</i>», comissariada por Alexandre Alves Costa, é um dos
eixos programáticos fundamentais deste centenário, propondo um percurso pela arquitectura
de Fernando Távora a partir de 7 obras<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>—
Mercado da Feira (1953/1959); Casa de Ofir (1957/1958); Pavilhão de Ténis da
Quinta da Conceição (1956/1960); Escola do Cedro (1957/1961); Pousada de Santa
Marinha da Costa (1972/1985); Anfiteatro da Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra (1993/2000) e Casa dos 24, (1995/2003) e 5 núcleos
temáticos com curadoria de 5 convidados: «<i>Referências</i>», Ana Tostões, «<i>Viagen</i>s»,
Sergio Fernandez, «<i>Tratados de Arquitetura</i>», Domingos Tavares, «L<i>iteratura
Modernista», </i>Celeste Natário, «<i>Aulas</i>», Manuel Correia Fernandes. O
catálogo da exposição, lançado no dia 25 de Janeiro, contém ainda «uma nota
interpretativa de críticos da nova geração» sobre cada uma das obras em
exposição. Foi nessa qualidade que participei com um texto sobre o mercado de
Vila da Feira, com o título «A solidão da arquitectura», apresentado numa
sessão de debate que decorreu no dia 20 de Janeiro na FIMS — uma sessão que
juntou também Eliana Sousa Santos (que apresentou a Escola do Cedro), José
António Bandeirinha (que moderou a sessão) e Alexandre Alves Costa. A
apresentação sobre o mercado foi concluída com uma breve nota de reflexão mais
ampla sobre o sentido da palavra comemoração. É essa nota que aqui se
reproduziu integralmente.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Editor
do Jornal Punkto, arquitecto, crítico e ensaísta, investigador no CEAU (Centro
de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Mercado
de Vila da Feira, Fernando Távora (1953-1959). Fotografia de autor desconhecido
(s/d), publicada na Revista <i>Arquitectura </i>nº 71 (Julho 1961) a acompanhar
o artigo que Nuno Portas escreveu sobre Fernando Távora. © Fundação Marques da
Silva, Arquivo Fernando Távora [FIMS/FT/0022-Foto15.1]<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«<i>Escola
do Porto: um princípio de desassossego (</i></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 10.5pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">— </span><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">a propósito do centenário de
Fernando Távora)</span></i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">»
• Pedro Levi Bismarck<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 25.01.2024<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#41 • Inverno 2024</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-90430939991871808882024-01-02T02:46:00.000-08:002024-03-16T12:26:28.593-07:00Palestina mon amour<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 35.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 35.45pt 6pt 2cm; tab-stops: 404.0pt;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: 0.1pt; mso-bidi-font-family: Helvetica; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"><o:p></o:p></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhnzvFRD7ZdtqQRTCkPK_6HxnYRhCy911LwV0Pv7BIOUS54-XS7IvKU-yhxB01Hija-S4N7nsDWSMTUuNH6i4PPcjOtQemXV07dpxXubyCwdPAn6_HhGNu5yY9VgPSje2eECXa-wKnioX6YIT7E7qRD8iRcq5ykdT9MQQS-XmQS09MM51KV8cL3TDi7DZz0/s3264/IMG_4257.JPG" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="3264" data-original-width="2448" height="625" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhnzvFRD7ZdtqQRTCkPK_6HxnYRhCy911LwV0Pv7BIOUS54-XS7IvKU-yhxB01Hija-S4N7nsDWSMTUuNH6i4PPcjOtQemXV07dpxXubyCwdPAn6_HhGNu5yY9VgPSje2eECXa-wKnioX6YIT7E7qRD8iRcq5ykdT9MQQS-XmQS09MM51KV8cL3TDi7DZz0/w470-h625/IMG_4257.JPG" width="470" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><p></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(13, 13, 13); line-height: normal; margin-bottom: 12.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 12pt 2cm; mso-background-themecolor: text1; mso-background-themetint: 242; tab-stops: 92.15pt 99.25pt;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 8pt; mso-themecolor: text1;">++<span style="letter-spacing: 0.5pt; mso-bidi-font-weight: bold; text-transform: uppercase;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm; tab-stops: 404.0pt; text-align: right;"><a name="_Hlk51669469"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 13pt;">#40 </span></b></a><span style="mso-bookmark: _Hlk51669469;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; mso-themecolor: text1;">•
Outono 2023 • <i>Palestina mon amour</i><o:p></o:p></span></b></span></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk51669469;"></span>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 0cm 0cm;"><a name="_Hlk90992586"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;"><o:p> </o:p></span></b></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk90992586;"></span>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 56.65pt 0cm 0cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;"><o:p> </o:p></span></b><b><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;">editorial</span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 56.65pt 0cm 2cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; line-height: 115%;">A segunda edição em papel do jornal<i> Punkto</i>
está disponível de agora em diante em mais livrarias graças à colaboração com a
editora </span><i><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"><a href="https://edcontracapa.blogspot.com/"><span style="color: #97694b;">contracapa</span></a></span></i><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">.</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; line-height: 115%;"> O número
2 / 40 pode ser adquirido por 3€ nas seguintes livrarias no Porto: Cinema
Batalha, Flâneur, Térmita, Trama e Utopia; e, em Lisboa, na Leituria, Snob e
Tigre de Papel. Encomendas devem ser feitas directamente à contracapa ou às
próprias livrarias.</span><b><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;"><o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 56.65pt 0cm 0cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;"><br /></span></b></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 56.65pt 0cm 0cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;">artigos<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><a name="_Hlk59291260"></a><a name="_Hlk98685053"></a><a name="_Hlk130226505"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></a><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/palestina-terra-devastada-pedro-levi.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Palestina:
Terra Devastada</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> •<o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya;"><span style="letter-spacing: -0.266667px;">Editorial</span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/o-silencio-de-gaza-giorgio-agamben.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">O
silêncio de Gaza</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> •<o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Giorgio
Agamben<o:p></o:p></span></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm; text-align: justify;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/sublevacao-na-palestina-tariq-ali.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">•
Sublevação na Palestina</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Tariq
Ali<o:p></o:p></span></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/o-estado-colonial-pedro-levi-bismarck.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">O
Estado Colonial</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: #7f7f7f; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; mso-themetint: 128;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><a name="_Hlk107142731"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></a></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/olho-por-olho-e-o-mundo-esta-cego.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Olho por olho e o mundo está cego</span></b></span></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></span></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"><span style="color: #7f7f7f; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; mso-themetint: 128;">Franco “Bifo” Berardi<o:p></o:p></span></span></span></span></span></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"></span>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/a-ruptura-do-confinamento-de-gaza-o.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">A
Ruptura do confinamento de Gaza, o Cadáver Israelita <o:p></o:p></span></b></span></span></span></a></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/a-ruptura-do-confinamento-de-gaza-o.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">e a
Esquerda perante a Palestina</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> •<o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: #7f7f7f; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; mso-themetint: 128;">Daniel
Lobato Bellido</span></span></span></span><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"><o:p></o:p></span></i></b></span></span></span></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"></span><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"></span><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"></span>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/12/a-palestina-e-academia-um-depoimento.html"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">A Palestina e a Academia: um
depoimento •</span></b></a><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> <o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Constança Viegas Martins<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/11/palestina-diario-retrospectivo-paulo.html"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Palestina — Diário Retrospectivo</span></b></a><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> •<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Paulo Ávila <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">•</span></b><span style="color: black; mso-themecolor: text1;"> </span><a href="https://www.revistapunkto.com/2021/05/o-ocupante-e-o-ocupado-ghassan-salhab.html"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">O Ocupante e o Ocupado</span></b></a><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • </span><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Ghassan Salhab<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/11/o-elixir-da-eterna-juventude-godofredo.html"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">O elixir da eterna juventude</span></b></a><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Godofredo Enes Pereira<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/11/lobby-lithium-pedro-levi-bismarck_9.html"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Lobby & Lithium</span></b></a><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> •<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Pedro Levi Bismarck<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/11/a-moralizacao-da-politica-pedro-levi.html"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">A moralização da política</span></b></a><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> •<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Pedro Levi Bismarck</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-2924340700960066652023-12-04T14:46:00.000-08:002023-12-05T00:36:04.551-08:00 A Palestina e a Academia: um depoimento • Constança Viegas Martins<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1Mb_UJPqLbbv_RfInyNr3O6NF21p0z9N5rilH4YWkKcAq_CRGrx3MI313GGtN2TDcYFEiGcGtXjrxa-J51VGbpSywcq9xjGoeqiTKtXvfCAgE5Yj3-l1jbKR6-G43faTp5vdAK1Yxatdg_v68K1LBEWriMU0ljoql5_mKFMhIbG3-KoiKbqFsNVqbInzO/s478/Intifada_PalestinaPoster.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="478" data-original-width="345" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1Mb_UJPqLbbv_RfInyNr3O6NF21p0z9N5rilH4YWkKcAq_CRGrx3MI313GGtN2TDcYFEiGcGtXjrxa-J51VGbpSywcq9xjGoeqiTKtXvfCAgE5Yj3-l1jbKR6-G43faTp5vdAK1Yxatdg_v68K1LBEWriMU0ljoql5_mKFMhIbG3-KoiKbqFsNVqbInzO/w289-h400/Intifada_PalestinaPoster.jpg" width="289" /></a></div>
<span style="mso-bookmark: _Hlk152621806;"></span>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">No dia 26 de
Outubro, recebi um email do departamento GRID </span><span style="font-family: Symbol; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-ascii-font-family: Alegreya; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-char-type: symbol; mso-fareast-font-family: Alegreya; mso-hansi-font-family: Alegreya; mso-symbol-font-family: Symbol;"><span style="mso-char-type: symbol; mso-symbol-font-family: Symbol;">-</span></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;"> Genderová rovnost, inkluze a diverzita
[Departamento de Igualdade de género, inclusão e diversidade] da Academia de
Belas Artes de Praga, AVU, onde estou a realizar mobilidade ao abrigo do
Programa Erasmus. O email referia que gostariam de reunir comigo para falar
acerca da «situação da Palestina – Israel». Fiquei especialmente alarmada, pois
nessa mesma semana estudantes no Reino Unido foram suspensos por fazerem parte
de uma sociedade de solidariedade para com a Palestina. Respondi ao email, num
tom irónico, escrevendo que «estava contente com a preocupação da faculdade
para com o genocídio do povo palestiniano». Depois disso marcamos a reunião.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">Na manhã do dia
2 de Novembro, fui à reunião e no começo da conversa a psicóloga da faculdade
perguntou-me como é que me sentia relativamente a «esta situação
Palestina-Israel», o genocídio, não tendo percebido o rumo que a conversa iria
tomar com esta pergunta. Não me vou concentrar na pessoa que falou comigo, pois
ela não é mais que uma peça na engrenagem de uma máquina maior que usa o peso
da instituição de ensino como um instrumento de repressão: como é óbvio acho
que ela está a ser indirectamente cúmplice, mas é assim que funciona a máquina
da propaganda.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">No início da
conversa tomei uma atitude muito ponderada no discurso, talvez por medo e um
certo receio, até ao momento em que me foi dito que uma colega minha, residente
em Jerusalém ocupada, estaria desconfortável com a partilha de um <i>post</i>
no meu Instagram, que considerava inclusive fazer um apelo à violência. A
partilha que eu fiz consistia num poster da resistência palestiniana, onde se
podia ver uma fisga e a bandeira, com a frase «<i>Intifada Continues</i>». «Intifada»
é um termo árabe que significa «agitado», esta expressão está ligada à
resistência palestiniana desde 1987, significa «Revolta civil palestiniana
contra a ocupação israelita», segundo o dicionário Priberam da Língua
Portuguesa.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">A </span><w:sdt id="-900129835" sdttag="goog_rdk_0"></w:sdt><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">conversa adquiriu assim um claro tom
repreensivo, com o pedido disfarçado de mostrar consciência relativamente ao sofrimento
do lado opressor e de ter cuidado com a exposição das minhas posições políticas.
A minha colega poderia ter falado abertamente comigo, no entanto escolheu usar
a instituição como instrumento de censura, porque todos sabemos que lado tomam
as universidades europeias perante determinados conflitos geopolíticos. A
funcionária referiu que queria manter a neutralidade neste assunto, pois
existem opiniões conflituantes. Apesar disso, esta mesma faculdade tem uma
bandeira da Ucrânia na janela, emitiu comunicados e realizou exposições, dando (e
bem) o seu apoio ao povo ucraniano. Mas agora a «política» é tabu, já não são
os «nossos»… Vêm-me falar de neutralidade, a neutralidade é a mais ignorante
posição política.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">Ela disse-me
que as minhas colegas ainda não estavam preparadas para falar sobre isso
publicamente. Respondi que seria normal, pois o colonialismo não é um tema
confortável para as pessoas brancas e para os privilegiados, sendo que contra
mim falo. Tenho colegas, principalmente brasileiras, que na FBAUP confrontam a
restante comunidade académica com questões relacionadas com a colonização e os
processos históricos envolventes e é normal que sintamos um mal-estar que advém
da tomada de consciência da violência da nossa história. Mas que aprendamos com
ela, mudemos os livros de história, tomemos consciência e sejam feitas as
devidas reparações.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">O privilégio é
uma questão fulcral nesta discussão, a minha colega pelo menos tem a liberdade
de vir para a República Checa, as pessoas na faixa de Gaza têm 365 km2 em que
se podem movimentar entre bombardeamentos. Outra pequena nota é que não temos
nenhum colega palestiniano em mobilidade, nem nos apercebemos do nosso
privilégio em algo tão simples como a liberdade que temos para nos movermos e
em segurança, enquanto outros não o podem.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">Tal como outros
países da Europa central, a República Checa sente uma dívida histórica para com
o povo judeu, e por isso a funcionária realçou que deveria ter cuidado com o anti-semitismo.
«Intifada» é sobre descolonização, não é anti-semita exigir o cessar-fogo, o
fim aos muros e à ocupação. </span><w:sdt id="2146386490" sdttag="goog_rdk_1"></w:sdt><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">Os colonos israelitas violentamente
ocuparam as casas dos palestinianos, logo é natural que o processo de
descolonização seja também resposta à força dessa mesma violência.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">Há umas semanas
fomos a uma visita de estudo à National Gallery, na qual nos deparámos com objectos
de origem indígena e africana, sendo que um dos meus colegas questionou a
docente se as peças iriam ser devolvidas. Na resposta houve uma certa
desvalorização: esta não seria actualmente a maior preocupação, mas sim o
estudo dos efeitos do colonialismo no país (por parte da Rússia). O sentimento
de europeísmo dos países da Europa Central deveria ser válido para tudo, e não selectivo:
ora vítimas numas coisas, ora orgulhosos de fazerem parte das grandes
instituições de repressão neocolonialista, a União Europeia. O genocídio na
Palestina, no Congo, a ocupação na Arménia e o Ecogenocídio que envolve as
várias comunidades indígenas um pouco por todo o mundo, tem culpados e
financiadores, a UE é um deles.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">A segunda consideração
que faço acerca desta situação é sobre o papel das faculdades: ao invés de
serem espaços críticos e políticos, são classistas e desprovidos de razão de
ser. Nos seus planos de actividades, lemos a expressão «terceira missão», actividades
e propostas que, de forma superficial e assistencialista, interagem com a
sociedade civil e as comunidades que as rodeiam. Mas enquanto tudo isso se
passa, aquilo que é verdadeiramente necessário é uma democratização da
educação. A relação da Universidade com a sociedade deveria ser real, no
sentido de haver um vínculo sério e um compromisso social. No entanto, as
instituições não querem dar lugar à escrita da história pelos oprimidos, muito
pelo contrário, ou a ocultam ou a fetichizam. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">Um pouco por
toda a Europa as Universidades reprimem a pouca consciência política que
respira dentro delas, os meus colegas da Academia de Belas Artes de Helsínquia
receberam uma notificação para não usar o email institucional com motivos
políticos depois dos protestos pró-Palestina. Os nossos colegas em Lisboa foram
detidos pela PSP por exigirem uma transição energética. Os colegas em Bolonha
vivem um aumento da violência policial contra os movimentos estudantis na rua.
A AEFBAUP, da qual faço parte, também foi intimidada em Setembro deste ano num
protesto no jardim da Cordoaria, onde estava ex-Primeiro-Ministro, tendo um
funcionário da Universidade prometido que se parássemos o protesto teríamos uma
reunião com o ex-PM. É óbvio que existe uma clara afronta ideológica nas
universidades à liberdade de discurso, à análise crítica e à acção fora dos
moldes legais e burocráticos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;">No futuro,
olharemos para a passividade e a inacção perante este genocídio. A culpa será pesada
sobre a funcionária que me disse que devia ter cuidado e que não deveria
promover discurso de ódio nas redes sociais ao usar a palavra <i>Intifada</i>. Mas
a culpa será mais um legado de vergonha para os povos da Europa que compactuam
com esta tragédia. Como disse um grande amigo meu «o melhor que temos a fazer
pelo povo palestiniano é lutar contra as instituições aqui», no sítio onde
vivemos, assim o farei.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya; mso-fareast-font-family: Alegreya;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: -.05pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm -0.05pt 0cm 0cm; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 18pt; line-height: 200%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-size: 22.0pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-theme-font: minor-fareast;">•</span></b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 18pt; line-height: 200%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-size: 22.0pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-theme-font: minor-fareast;"><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Constança Viegas Martins<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Nasceu em Évora, 2001. Estudante na Faculdade de Belas
Artes da Universidade do Porto e dirigente estudantil.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Cartaz “Intifada Continues” cuja partilha nas redes
sociais causou a situação relatada pela autora do texto<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Ficha Técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">«<i>A Palestina e a Academia: um depoimento</i>» • Constança
Viegas Martins<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Data de publicação: 04.12.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Edição #40 • Outono 2023 •</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-22171635923062011402023-11-23T12:01:00.000-08:002023-11-23T12:01:48.649-08:00A moralização da política • Pedro Levi Bismarck<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiMNnEOTm1BYrKMUUiiMf2iowAfzCnLG2gA-uZh5CbsI8TY_xAlJdRA7tbG5pTv_qUW1f-j5CQyANa3iDqa5grqBen27FeaBJjn9idw-th3ylE6Bsah5BrbX9bSEdZf5oGJpRensrSdZVfpfODiNXQFtMl4qh9daFgZSz4ki0eujKgcT6lIOl9ODyp15DNc/s783/unnamed%20(14).png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="783" data-original-width="693" height="618" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiMNnEOTm1BYrKMUUiiMf2iowAfzCnLG2gA-uZh5CbsI8TY_xAlJdRA7tbG5pTv_qUW1f-j5CQyANa3iDqa5grqBen27FeaBJjn9idw-th3ylE6Bsah5BrbX9bSEdZf5oGJpRensrSdZVfpfODiNXQFtMl4qh9daFgZSz4ki0eujKgcT6lIOl9ODyp15DNc/w547-h618/unnamed%20(14).png" width="547" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">1. <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/11/lobby-lithium-pedro-levi-bismarck_9.html"><span style="color: #97694b;">Num outro texto</span></a></span>, escrito na sequência
da «Operação <i>Influencer»</i>, procurei situar este caso a partir de dois
aspectos que apareciam já como fundamentais: a figura do <i>lobby </i>no quadro
da democracia liberal e o problema do lítio nas novas «economias verdes». Mas o
debate que entretanto foi suscitado, torna oportuno acrescentar mais algumas
notas de reflexão relativamente ao primeiro aspecto.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Podemos dizer que o <i>lobby</i> — ou <i>lobbying</i>
— é uma espécie de princípio constitutivo da democracia liberal, ao instaurar
um espaço onde o domínio do público e do privado se tornam indistintos e
intercambiáveis, isto é, <i>onde os interesses do privado se tornam os interesses
do público e os interesses do público se tornam os interesses do privado.</i> A
constituição do Estado moderno liberal assenta numa operação que consiste em
fazer do interesse económico privado do capitalismo o interesse público da
sociedade no seu todo. O Estado é o meio que legitima a vontade do capital
enquanto vontade geral — não por meio da violência — que seria apanágio de um
regime ditatorial — mas através desse jogo que dá pelo nome de <i>lobby </i>e
que define, com a ideia de consenso, o espaço político da governação.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Daí a grande atracção do capitalismo
pela figura arquitectónica do <i>lobby </i>(átrio). Walter Benjamin notara já
que o centro da Ópera de Paris não era o palco, mas o grande átrio onde a nova
burguesia recém-chegada ao poder observava e era observada. E, no entanto, a
especificidade desse <i>lobby </i>não estava apenas na capacidade de constituir
um regime de representação individual e colectivo da burguesia enquanto classe,
mas de instaurar um tipo específico de espaço — nem público nem privado — onde
a máxima visibilidade, longe de corresponder a um desejo de transparência,
fixava-se num jogo oblíquo de luzes e sombras, silêncios e murmúrios.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">2. Ora, o que a «Operação <i>Influencer</i>»<i>
</i>coloca como problema não é exactamente aquilo a que se tem vindo a chamar
uma «politização da justiça» ou uma «judicialização da política», mas algo mais
fundamental: é o paradoxo fundador de todo um modelo de democracia que se
legitima, na teoria, enquanto <i>representação política de todos</i>, mas que,
na prática, é a <i>representação económica dos interesses privados do
capitalismo</i>. A acusação segundo a qual o Ministério Público «não compreende
a dinâmica da governação» é interessante, porque aquilo que ela subentende é que
a governação só é possível na medida em que existe num espaço de indistinção que
não está nem dentro nem fora da legalidade: está para além de. E, de facto, como
poderia estar, se a governação assenta precisamente nessa transubstanciação divina,
nesse <i>comércio,</i> entre privado e público, obscurecendo a categorização
formal do espírito da lei? Se estamos numa «crise de regime» é porque aquilo
que se expõe neste caso é a contradição, de facto, entre a teoria e a prática
da democracia liberal, onde o «<i>power of the people for the people</i>» é, na
verdade, consumado como o «<i>power of the money for the money</i>».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">E, no entanto, aquilo que, também aqui,
se expõe irremediavelmente é a própria condição paradoxal de uma justiça que ao
interpelar directamente o poder que a legisla não pode senão deparar-se com o
vulto melancólico da sua sombra. A justiça, ainda antes de se fundar numa ordem
legal, funda-se num princípio de ordem moral. Ela é a consciência moral da
sociedade: garante o policiamento moral da ordem através da legalidade. Aquilo
que ela não pode é realizar um juízo crítico sobre o princípio de instauração da
lei, apenas a sua verificação <i>tout court</i>. E, por isso, está <i>condenada</i>
à esfera da moral: é certo que ela tem a função de verificar a relação entre
prática e teoria do quadro institucional democrático, mas apenas o pode fazer do
ponto de vista <i>interno,</i> isto é, do ponto de vista moral.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">3. Chegamos, então, ao entrelaçamento decisivo
desta <i>crise</i>: constituir a política como um campo estritamente moral e
não ideológico tem sido a tarefa fundamental da extrema-direita nos últimos
anos, não apenas em Portugal. Mas isso só é possível aí onde toda a política
foi já <i>desideologizada</i> e transformada na gestão técnica e colectiva dos
interesses privados do capitalismo enquanto interesse geral de todos. Não foi o
</span><span style="color: #97694b;"><a href="https://www.publico.pt/2023/11/11/politica/noticia/seguro-sanches-defende-galamba-nao-condicoes-manter-governo-2069871"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">discurso de António Costa</span></a></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";"> de sábado, dia 11 de Novembro, uma eloquente lição sobre
esse desígnio nacional? <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Dizer isto não significa estabelecer
uma simetria de interesses entre justiça e extrema-direita, significa, por um
lado, que ambos encontram a sua génese nesse paradoxo constituinte da democracia
liberal, mas, por outro, que estes só podem aparecer plenamente na força da ordem
moral, aí onde toda a política, toda a sociedade, se encontra no momento da sua
<i>desideologização</i> absoluta.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Ora, mais do que o desmantelamento das
instituições sociais do Estado, o grande princípio que tem estruturado o
programa neoliberal tem sido a dissolução das instituições democráticas, isto
é, a neutralização da potência de dissenso que a democracia guarda em si: algo
que é visível, por exemplo, na função a que as Universidades foram hoje
consignadas enquanto peças positivas estratégicas da optimização do mercado,
perdendo a sua função crítica e negativa — </span><span style="color: #97694b;"><a href="https://www.publico.pt/2023/10/17/culturaipsilon/entrevista/terry-eagleton-hamas-fez-obscenidade-moral-nada-israel-nao-palestinianos-vezes-conta-2066851"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">a este propósito vale a pena ler a entrevista
de Terry Eagleton ao jornal <i>Público</i></span></a></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">. Mas não só: estabelece-se no princípio de anulação de toda
e qualquer ideia de cisão política relativamente aos princípios do mercado;
estabelece-se no princípio de impossibilidade de qualquer outra política senão
aquela definida pela União Europeia. Em suma: trata-se de anular os atritos, os
obstáculos, que impedem a expansão financeira dos mercados: quer seja ao nível
da habitação, da saúde ou das energias verdes e da economia digital — lítio,
hidrogénio e <i>data center.</i><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">O neoliberalismo não consuma apenas a figura
do <i>lobbying, </i>nem a violência do consenso, ele impõe o princípio absoluto
de uma dominação do mercado sobre a própria democracia: aí onde todos os
sujeitos políticos se tornam sujeitos económicos. E esse não é um problema
moral, mas político e ideológico. Ou, melhor, ele só pode surgir na ordem da
moral aí onde a democracia se tornou, arquitectonicamente falando, o <i>lobby</i>
do mercado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";">Uma reflexão que talvez valesse a pena
fazer nos cinquenta anos do 25 de Abril.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Times New Roman";"><br /></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25.0pt; line-height: 150%;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Editor
do Jornal Punkto, arquitecto, crítico e ensaísta, investigador no CEAU (Centro
de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Georg
Grosz, <i>Demokratie </i>(1919)<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«<i>A
moralização da política</i>» • Pedro Levi Bismarck<i><o:p></o:p></i></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 23.11.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2023</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-34104663534255850772023-11-09T03:33:00.005-08:002023-11-13T03:02:42.467-08:00Lobby & Lithium • Pedro Levi Bismarck<p><br /></p><p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiS2-bijiLNjNKzDZJF3X0auF6uhsmQZkYnL__HTgjn1LdiZoBOvm7Cs9_eMItB5vhcZxlM1BKccVbt8WzJn2lM1y8ihG9GajvTs3eOemJU5MoUPED974Dn5KLeqf5N1RDCIJTOC86QVku7glthiF74xoZpGKWn23mn6VVqP3J-X_8uQT76ZvmhnC4qjwzV/s750/385530670_6705456002906327_6303980432557484107_n.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="750" data-original-width="750" height="425" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiS2-bijiLNjNKzDZJF3X0auF6uhsmQZkYnL__HTgjn1LdiZoBOvm7Cs9_eMItB5vhcZxlM1BKccVbt8WzJn2lM1y8ihG9GajvTs3eOemJU5MoUPED974Dn5KLeqf5N1RDCIJTOC86QVku7glthiF74xoZpGKWn23mn6VVqP3J-X_8uQT76ZvmhnC4qjwzV/w425-h425/385530670_6705456002906327_6303980432557484107_n.jpg" width="425" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">1.
<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
demissão de António Costa e o eventual envolvimento, entre outros, do anterior
ministro do ambiente e da acção climática — João Matos Fernandes — e do seu
secretário de Estado — João Galamba, que foi constituído arguido — em processos
relacionados com as concessões de exploração de lítio, levantam, mais uma vez,
dúvidas relativamente à transparência pública destes processos num tipo de
economia em que as categorias do chamado «interesse público» e do «interesse
privado» só parecem poder existir num grau de permanente indistinção; não porque
se trate de uma questão de ordem moral — passível de um determinado código de
ética — ou de ordem legal — passível de um determinado enquadramento jurídico —,
mas pelo papel que o próprio Estado desempenha enquanto <i>instituição da
instituição do consenso social, </i>e que no modelo das chamadas democracias liberais
opera através não do exercício da violência, mas das figuras do consenso e do <i>lobby.
<o:p></o:p></i></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Lobby</span></i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">, um curioso
termo, que significa, em inglês, tanto átrio de um edifício como o acto de
influenciar um legislador — provavelmente, remetendo para as salas</span><span style="font-size: 13pt; line-height: 150%;"> </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">do Parlamento inglês onde os deputados
se podem encontrar com os chamados «<i>members of the public</i>». Neste
sentido, poderíamos dizer que o <i>topos</i> que melhor caracteriza e elucida
toda uma ideia de democracia liberal é, precisamente, o <i>lobby</i>: esse
local onde privado e público não só se encontram, mas se tornam indiscerníveis
e quase, poderíamos dizer, intercambiáveis: <i>onde os interesses do público se
tornam os interesses do privado e os interesses do privado se tornam os
interesses do público.</i> <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Daí
a grande atracção do Capital pela figura arquitectónica do <i>lobby.</i> Talvez
o primeiro a notar uma certa afinidade entre este e a burguesia terá sido
Walter Benjamin, para quem o centro do edifício da Ópera de Paris (de Charles
Garnier) não era o palco ou a sala, mas o grande átrio onde a nova burguesia
recém-chegada ao poder observava e era observada. Um espaço de representação
individual certamente, mas sobretudo de representação — podemos acrescentar — da
união colectiva dos interesses privados enquanto soma geral do interesse do
Estado-Capital, sublimado pela monumentalidade gracioso-trágica da arquitectura
e da ópera. Trata-se de um máximo de visibilidade que, no entanto, não é sinónimo
de transparência, bem pelo contrário, torna impossível qualquer transparência
através de um jogo permanente de luzes e sombras, de silêncios e murmúrios. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
legalização e a instrução de um quadro legal para o <i>lobby,</i> como acontece
nos EUA, é uma tentativa de definir um <i>véu de nitidez</i> nessa relação entre
o privado e o público, estabelecendo regras próprias de conduta e limites
legais. Mas a aceitação do <i>lobby</i> não conduz a nenhuma transparência,
apenas institui a forma específica de uma relação monetária com a própria
democracia — onde o «<i>power of the people to the people</i>» é, na verdade, o
«<i>power of the money to the money</i>». Em certa medida, o <i>lobby</i>
institucionaliza e legaliza a própria corrupção, fazendo-a aparecer como o
motor da própria democracia. E não é preciso percorrer os «corredores do poder»
para perceber que tal coisa como uma separação do poder político e do poder
económico é uma quimera que só a moralidade burguesa no seu idealismo
transcendental pode aceitar como possível. Na Europa, esse grande reino da
moralidade, a institucionalização clara de um <i>lobby</i> permanece algo
difícil de aceitar, embora a estrutura da Comissão Europeia assuma já esse
formato como «<i>business as usual</i>» — a expressão, aliás, não poderia ser
melhor aplicada.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">2.
<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">As
virtudes do <i>lobby </i>para as democracias ocidentais serão certamente objecto
de um debate que alimentará as certezas e as dúvidas do «comentariado». Mas há um
tema sobre o qual já poucas dúvidas restam: as consequências devastadoras da
extracção mineira do lítio — tanto para as populações locais, como para os
ecossistemas naturais. Não vale a pena explicar aqui — já muitos o fizeram — os
impactos ambientais: contaminação dos recursos hídricos, poluição sonora,
destruição de culturas e degradação ambiental generalizada. No caso do Barroso,
onde o processo avança, tudo isso é mais grave porque estamos dentro de um
perímetro considerado «património agrícola mundial», designação atribuída pela
FAO. A extracção do lítio, mais ou menos controlada e regulada, não traz nenhum
efeito positivo ou «mais-valia» para as comunidades afectadas por essa
exploração, essas são consideradas, aliás, dispensáveis em nome do — e cito a
APA — do «<span style="color: #97694b;"><a href="https://www.publico.pt/2023/11/07/economia/noticia/quatro-negocios-centro-demissao-costa-2069380"><span style="color: #97694b;">interesse estratégico do lítio para o cumprimento das metas
da neutralidade carbónica e transição energética</span></a></span>». Que <i>transição
verde</i> é essa para quem as populações são apenas números na estatística dos
Estados, podemos perguntar? Enquanto a «mais-valia» essa, é sempre para as
empresas que tem a cargo a exploração.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
há nada de «verde», de «limpo», de «ecológico», na extracção do lítio. A
chamada «economia verde» tem servido para muitas coisas, mas muito poucas tem
que ver com a crise ambiental em que vivemos — e que não pode, e não deve, ser
reduzida à questão específica das alterações climáticas, mas a todo um processo
de destruição brutal e violento da natureza na era do Capitaloceno — mais do
que do Antropoceno — e que tem vindo a significar uma redução exaustiva dos
ecossistemas com a extinção acelerada de múltiplas espécies vegetais e animais:
como se de um movimento de exaustão da própria Terra se tratasse. Mas até nisso
o Barroso é paradigmático: aquilo que poderia ser o território de uma
experiência política de sustentabilidade ambiental capaz de articular agricultura,
pecuária, comunidades locais, paisagem e outros modelos de produção e
cooperação, corre o risco real de se tornar numa terra estéril e devastada,
despovoada e esquecida, mas tudo em nome do princípio sagrado e da promessa verde
da «neutralidade carbónica». <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Ora,
é preciso voltar a dizê-lo, o princípio da transição energética não é mais que
a fórmula mágica que a Europa encontrou para garantir a sua autonomia energética
e fugir da dependência do petróleo árabe e do gás russo, a fórmula que permite
assegurar o funcionamento e o crescimento da sua indústria —nomeadamente
automóvel — e das suas cadeias logísticas de produção e circulação num mercado
global em reconfiguração acelerada, a fórmula que permite à Europa salvaguardar
o seu poder político sobre a economia mundial no seu todo. Se o princípio da «economia
verde» fosse o de responder à actual crise ambiental — como escreve Godofredo
Pereira em <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/11/o-elixir-da-eterna-juventude-godofredo.html"><span style="color: #97694b;">O elixir da eterna juventude</span></a></span> — haveria muitas
outras medidas que poderiam ser, desde já, tomadas e levadas a cabo. Mas trata-se
de iniciativas que colocam em causa, de uma maneira ou de outra, os princípios
constitutivos da economia capitalista. É o Capital aquilo que a economia
verde procura salvar, não o ambiente, não a vida humana, animal e vegetal, não
a própria Terra. É a sua voragem, é a sua condição de desterritorialização infinita,
que se exprime de forma lapidar no modo como toda uma ideia de PIB — produto
interno bruto — continua a definir e a mobilizar políticas económicas que dizem
mais respeito à felicidade dos Estados do que das suas populações. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Ora,
nada disso é colocado em causa pela economia verde. Godofredo Pereira relembra
apropriadamente uma velha máxima: «<i>É preciso que tudo mude para que tudo
fique como está</i>». Mas esta frase — conhecida sobretudo por representar o espírito
sagaz e prático do herdeiro do Príncipe de Salina na Sicília de <i>Il Gattopardo</i>,
perante a revolução burguesa italiana — é, na verdade, o princípio do próprio Capital.
E é preciso citar a frase de Marx no <i>Manifesto</i> que dá ainda título ao
fabuloso livro de Marshall Berman: «<i>All that is solid melts into the air</i>»
e que condensa todo o princípio constitutivo da burguesia e do capitalismo: a necessidade
de renovação incessante dos instrumentos de produção, a abertura e a expansão permanente
de novos mercados, o processo intensificado de exploração e apropriação de
todas as coisas do mundo de forma a convertê-las em mercadorias, o processo de
desagregação e recomposição de todas as formas e relações sociais. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
é por acaso que «revolução» seja um termo especificamente burguês. Ele exprime
a ordem técnica e política do Capital: a <i>revolução</i> — que significa dar
uma volta completa — é a imagem paradoxal de toda uma ordem que assenta na
capacidade de um movimento puro permanente e sem fim, mas, ao mesmo tempo,
estável e universal. É esse o termo, precisamente, que Copérnico usa em 1543 no
<i>De revolutionibus orbium coelestium </i>para descrever o movimento dos
planetas em torno do Sol. Neste sentido, a <i>revolução</i> é o dispositivo que
permite a resolução política de um paradoxo: mobilizar o avanço do movimento
desterritorializante do Capital, mas assegurando simultaneamente um controlo
absoluto sobre este, assegurando que a burguesia mantém o seu domínio político,
isto é, que tudo possa permanecer como está, ainda que tudo esteja em movimento,
ainda que tudo mude. Progresso e Revolução: o movimento linear infinito <i>sans
rêve et sans merci</i> do Capital e a sua estrutura cíclica de recomposição e crise.
É que o Capital funciona por crise, precisa da crise, precisa da revolução. Precisa
da revolução para que tudo possa ficar como está.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">3.<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Podemos dizer que chegamos ao momento histórico de desenvolvimento do
capitalismo em que é o próprio planeta que corre o risco de se<i>
dissolver no ar</i>. Todos os que colocaram no seu horizonte político a luta pelo
clima, não podem senão pôr em causa todo este princípio revolucionário do
Capital, o princípio substancial da sua <i>economia de guerra</i>: da guerra
que o Capital declarou contra o mundo. Ora, talvez tenha sido Walter Benjamin,
entre todos, aquele que melhor intuiu que uma verdadeira concepção de revolução
só poderia supor um gesto de interrupção do movimento da história, do movimento
do Capital. Como escreve numa pequena nota paralela às suas teses «Sobre o
Conceito da História»:<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 12pt 2cm; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 115%;">«<i>Marx diz que
as revoluções são a locomotiva da história universal. Mas talvez as coisas se
passem de maneira diferente. Talvez as revoluções sejam o gesto de accionar o
travão de emergência por parte do género humano que viaja nesse comboio</i>»<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 12pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Editor
do Jornal Punkto, arquitecto, crítico e ensaísta, investigador no CEAU (Centro
de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Silvy
Crespo,<span style="color: #96654b;"> </span></span><a href="https://silvycrespo.com/the-land-of-elephants-1"><i><span style="color: #96654b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">The Land of
Elephants</span></i></a><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p></o:p></span></i></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«<i>Lobby
& Lithium</i>» • Pedro Levi Bismarck<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 09.11.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2023</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-17179040789353052592023-11-07T12:12:00.002-08:002023-11-07T14:53:45.813-08:00 O elixir da eterna juventude • Godofredo Enes Pereira<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjfSD8HdVKeAPnM3CgEitfbPSI1kxTKsu2TjNu2_Xn6an23Q6W_CvHG4aMw2EBjsJr0Jj7LJsWV-ATTzP3GPGUP-DtfDe8x7o_4ps95k0dZSqqGcGzxrDR1BEBy4aVy1uFkF2PgImK1H2t2ZpNKwGRd5iRkn66gQwwV8R_lQehpKoAVEnbBu1gROe-ZDwii/s750/367480196_1396851677882841_2967893087038954570_n.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="750" data-original-width="750" height="524" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjfSD8HdVKeAPnM3CgEitfbPSI1kxTKsu2TjNu2_Xn6an23Q6W_CvHG4aMw2EBjsJr0Jj7LJsWV-ATTzP3GPGUP-DtfDe8x7o_4ps95k0dZSqqGcGzxrDR1BEBy4aVy1uFkF2PgImK1H2t2ZpNKwGRd5iRkn66gQwwV8R_lQehpKoAVEnbBu1gROe-ZDwii/w524-h524/367480196_1396851677882841_2967893087038954570_n.jpg" width="524" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><p></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">No
dia 31 de Maio, a APA – Agência Portuguesa do Ambiente emitiu uma Declaração de
Impacte Ambiental (DIA) favorável condicionada ao projecto da Mina do Barroso,
de 593 hectares, pela Savannah Lithium, Lda. Tratando-se do principal projecto
para a mineração de lítio em Portugal, são urgentes algumas observações.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
justificação ‘ecológica’ da mineração assenta na ideia de que o lítio é
importante para a transição energética na medida em que propõe substituir a
dependência fóssil no sector dos transportes pela electromobilidade. Contudo, é
sabido que a aceleração global na procura de lítio resulta principalmente da
expansão do mercado do carro eléctrico (EV) individual (em 2022, 80% do lítio
extraído mundialmente foi usado em baterias, onde mais de 60% corresponde a
EVs).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Diversos
estudos indicam que ao longo do seu ciclo de vida, um EV individual é menos
poluente que um carro a combustão interna. Contudo, estes cálculos dependem do
modo como é produzida a electricidade usada para carregar as suas baterias – se
tem origem renovável, ou em gás ou carvão. Enquanto não se descarbonizar a
produção de electricidade, as reduções a nível de emissões de um EV serão
mínimas. Pior ainda, falar em reduzir emissões faz pouco sentido quando ao
mesmo tempo se promove uma indústria assente no aumento de vendas de carros
individuais: pois para cada EV é necessária a extracção de lítio, mas também de
cobre, cobalto, grafite, aço, alumínio, plásticos, borrachas e muitas outras
matérias-primas!<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Parece-me
óbvio que se o caso fosse de justiça climática, a UE e seus governos estariam a
tentar identificar qual o mínimo possível de extracção necessário para a
transição energética – visto que não há nada de sustentável na destruição de
ecossistemas pela mineração. Mas não é esse o caso. A corrida ao lítio é
exclusivamente geopolítica, uma luta pelo controlo de uma matéria-prima com
elevado valor de mercado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Relativamente
à importância do investimento, não deixa de ser curioso que em Portugal estejam
a investir apenas companhias juniores, tais como a Savannah Resources,
Lusorecursos, Felmica ou Aldeia e Irmão, todas estas com experiência mínima em
mineração. Nenhuma das ‘<i>majors</i>’ como Gangfeng, Albemarle ou Rio Tinto se
dignou a investir no lítio de Portugal.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Noto
também que frequentemente se diz que Portugal tem enormes ‘reservas’ de lítio.
Ora aqui há uma confusão, que me parece propositada, entre ‘reservas’ e
‘recursos’. Por ‘recursos’ entenda-se o facto geológico da presença de lítio no
subsolo. Mas não é lícito que tenha assim tantas ‘reservas’ – o nome que se dá
à quantidade desses recursos que será de facto economicamente viável explorar,
e cujo valor se vai ajustando à medida que avançam os processos de prospecção.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Além
disso, os principais fabricantes de baterias, como a BYD e CATL, têm investido
no desenvolvimento de baterias de sódio. A péssima taxa de reciclagem das
baterias de lítio (actualmente uma média de 5% apenas), os seus custos de
produção e reconhecidos impactos socioambientais são as principais razões para
procurar alternativas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Quanto
aos impactos compensarem a longo-prazo, é preciso notar a pressão que têm
sofrido as populações para que vendam as suas terras, gerando conflitos
internos difíceis de sarar. Desde o momento em que se anuncia a prospecção, a
possibilidade de captar investimento para outros futuros fica severamente afectada:
valorização dos recursos existentes? Apoio à produção agrícola local? Apesar de
ter sido declarada Património Agrícola Mundial pela FAO (Organização das Nações
Unidas para Alimentação e Agricultura), a região do Barroso enfrenta não um –
mas dezenas de projectos de mineração! Pensemos: depois da mineração, o que
fica para trás é um território qualificado social e ecologicamente – ou
desqualificado? Com população capaz de atrair investimento sustentável – ou
dependente de novos empregos industriais?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">E ao
começar a operação da mina, então aí falamos de explosões diárias por vários
anos que terão consequências graves sobre a saúde mental das pessoas; impactos
sobre os solos e sobre a biodiversidade devido à necessária decapagem dos
solos, terraplanagem e abertura de<i> cortas</i> para a mineração a céu aberto;
apropriação de centenas de hectares de terrenos baldios desconsiderando o
sustento económico que permitem às populações; destruição de ecossistemas
vegetais e aquáticos; retenção de enormes quantidades de água num país em seca;
elevados riscos para os rios e aquíferos, entre outros. Por mais medidas de
monitorização que se proponham, garantir dezenas de anos de operações sem
fugas, infiltrações, acidentes ou imprevistos é uma raridade no mundo da
mineração.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Notemos
também que os impactos ambientais de uma mina não se fazem sentir apenas ao
nível local ou nacional, pois as emissões de CO2 resultantes da extracção e de
toda a cadeia logística de produção de baterias não ficam no local: elas vão
para a atmosfera, adicionando-se às demais emissões de CO2 globais, de uma
forma que nos afecta a todos, assim como às gerações futuras.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Em
vez do lítio, o Governo deveria dar prioridade à reabilitação do parque
habitacional, por forma a menorizar os consumos e a situação de tantas famílias
em pobreza energética – incluindo apoios ao autoconsumo eléctrico; em vez de
apostar em baterias para transportes individuais, um plano sistemático de
transportes colectivos; em vez de constantes movimentos pendulares, um
planeamento urbano adequado, complementado pela redução da semana de trabalho;
em vez de deflorestação, monocultura e destruição dos solos, investimento na
regeneração de ecossistemas, silvicultura e permacultura; em vez de mineração
de novos metais, desenvolvimento de tecnologias para minerar aterros; em vez da
actual dependência do agronegócio, apoio à transição para dietas à base de
plantas. Há muitas mais medidas a considerar. Mas a mineração descontrolada não
é uma delas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Sem
enfrentar as causas que levam à actual dependência do carro individual, e sem
transformar uma indústria assente no aumento da produção de veículos
individuais, não é possível justificar, ecológica ou eticamente, a destruição
de ecossistemas, de territórios e das vidas das pessoas. Infelizmente, fica
claro que a UE vê o lítio como um elixir da eterna juventude. Como dizia Sérgio
Godinho, permitindo<i> que tudo mude para que tudo fique igual.</i><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Godofredo
Enes Pereira<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Godofredo
Enes Pereira é arquitecto e investigador. É director do <i>MA Environmental
Architecture</i> no <i>Royal College of Art</i>, em Londres.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Nota
da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Artigo publicado
no Jornal Público em Julho de 2023 e incluído no Punkto no contexto do caderno
especial em construção sobre lutas ambientais.</span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><br /></span></b></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Silvy
Crespo,<span style="color: #96654b;"> <i><a href="https://silvycrespo.com/the-land-of-elephants-1"><span style="color: #96654b;">The
Land of Elephants</span></a></i></span><i><o:p></o:p></i></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">O elixir
da eterna juventude • Godofredo Enes Pereira <o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 07.11.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2024</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-55925861451439904412023-10-31T03:42:00.005-07:002023-10-31T03:51:57.185-07:00O silêncio de Gaza • Giorgio Agamben<p class="MsoNormal"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 8.0pt; margin-left: 63.8pt; margin-right: 63.7pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 63.7pt 8pt 63.8pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMKfec7RNjp01knU8-vmmYneh02Y0kUVYYWlZEY3fCArbvwwX1zhmmWmVRkxxwMzh5J_OPV4m1I-r7fIqJIECsx0JCMkkpBtfGd8a9boIyKSkhiZAbwzSuQewBCEOaYUXZ90f6TvfSXjPJHkJZNE9NPqg9LhUeevgkRS41hwqEAsKCCilmrF55YrEuEfAw/s800/Gaza+Ghetto+still.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="450" data-original-width="800" height="233" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMKfec7RNjp01knU8-vmmYneh02Y0kUVYYWlZEY3fCArbvwwX1zhmmWmVRkxxwMzh5J_OPV4m1I-r7fIqJIECsx0JCMkkpBtfGd8a9boIyKSkhiZAbwzSuQewBCEOaYUXZ90f6TvfSXjPJHkJZNE9NPqg9LhUeevgkRS41hwqEAsKCCilmrF55YrEuEfAw/w414-h233/Gaza+Ghetto+still.jpeg" width="414" /></a></div><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 8.0pt; margin-left: 63.8pt; margin-right: 63.7pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 63.7pt 8pt 63.8pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 8.0pt; margin-left: 63.8pt; margin-right: 63.7pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 63.7pt 8pt 63.8pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"> </span><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 18pt; line-height: 48px;">•</span></b></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm 77.9pt 8pt 78pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm 77.9pt 8pt 78pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Por estes dias,
cientistas da <i>School of Plant Sciences</i> da Universidade de Telavive
anunciaram que gravaram, com microfones especiais sensíveis a ultra-sons, os
gritos de dor que as plantas emitem quando são cortadas ou quando lhes falta
água. Em Gaza, não há microfones<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"> </span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin: 0cm -0.05pt 0cm 0cm;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 18pt; line-height: 200%;">•</span></b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 18pt; line-height: 200%;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"> </span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Giorgio Agamben<o:p></o:p></span></b></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Filósofo. Nasceu em Roma em 1942. É fundamentalmente
conhecido pela sua obra magna Homo Sacer, publicada parcialmente em português,
nomeadamente “Poder Soberano e Vida Nua” e “Estado de Excepção”. É autor também
de “Ideia da prosa” e “A comunidade que vem”.<o:p></o:p></span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"> </span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Nota da edição<o:p></o:p></span></b></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Este texto foi publicado na coluna de Giorgio Agamben <i>Una
voce </i>no site da editora </span><a href="https://www.quodlibet.it/giorgio-agamben-silenzio-gaza"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Quodlibet</span></a><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"> </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">a 30 de Outubro de 2023.<o:p></o:p></span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"> </span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Imagem do filme <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.palestinefilminstitute.org/en/pfp/archive/gaza-ghetto-portrait-of-a-palestinian-family"><span style="color: #97694b;">Gaza Ghetto: Portrait of a Palestinian Family</span></a></span>
(1985). Filmes disponíveis no <i>Palestine Film Institute.</i> <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;"> </span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Ficha Técnica<o:p></o:p></span></b></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">«O silêncio de Gaza» • Giorgio Agamben<o:p></o:p></span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Data de publicação: 31.10.2023<o:p></o:p></span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-size: 13.0pt;">Edição #40 • Outono 2023 •</span></p></div><p></p><p></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-19820834773628545732023-10-26T01:20:00.001-07:002023-10-26T01:20:45.221-07:00A Ruptura do confinamento de Gaza, o Cadáver Israelita e a Esquerda perante a Palestina • Daniel Lobato Bellido<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p></o:p></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj12QrcxpT_89rzpKKrwZulK5ifkfO9xOokt3KpxQGTUG4X-dZdfxWiYysX4YSIAphF2MebS4QC1OmwATObWiOyOjJgj_-FzPVWHrq6gsqz95h689w7QwTmGmjLxa1K7zP9SUansw9djzL0Zpni36E7UvE_8woNxEFRE7GZuOh0E2aSswKT2oE7fVi5LRq5/s1201/Tala-7-plays-sleeping-princess-in-a-ridge-in-the-earth-marked-from-a-tractor-on-her-familys-farm-land-December-2019.-From-the-series-Sacred-Space-Oddity.-Tanya-HabjouqaNOOR.jpeg.jpg" imageanchor="1" style="font-size: 13pt; margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="800" data-original-width="1201" height="386" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj12QrcxpT_89rzpKKrwZulK5ifkfO9xOokt3KpxQGTUG4X-dZdfxWiYysX4YSIAphF2MebS4QC1OmwATObWiOyOjJgj_-FzPVWHrq6gsqz95h689w7QwTmGmjLxa1K7zP9SUansw9djzL0Zpni36E7UvE_8woNxEFRE7GZuOh0E2aSswKT2oE7fVi5LRq5/w581-h386/Tala-7-plays-sleeping-princess-in-a-ridge-in-the-earth-marked-from-a-tractor-on-her-familys-farm-land-December-2019.-From-the-series-Sacred-Space-Oddity.-Tanya-HabjouqaNOOR.jpeg.jpg" width="581" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><p></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">As
imagens do dia 7 de Outubro de 2023, com os nativos palestinianos a derrubarem a
cerca do gueto de Gaza onde estão confinados à força há 75 anos — após terem
sido desapossados de tudo — terão um efeito histórico na aceleração do colapso
do regime colonial, que já era inevitável. Entretanto, nos últimos meses, têm
surgido alguns novos termos no discurso estagnado que a esquerda vinha
utilizando há décadas sobre a Palestina. Resta ainda saber qual será o efeito
do histórico <i>Prison Break </i>do mega-campo de confinamento de Gaza nesse
discurso, mas os primeiros sintomas são de confusão na esquerda institucional.
Têm os palestinianos direito a escapar ao seu confinamento? Apoiamos a causa
palestiniana mas ao mesmo tempo classificamo-los como terroristas? Sofrem com o
apartheid e o colonialismo, mas devíamos limitar-nos a conceder-lhes leite e
açúcar através das nossas ONGs? Seria compreensível, mesmo que não desejável,
que os nativos americanos atacassem e até sequestrassem as caravanas de colonos
brancos que avançavam pelas suas pradarias do oeste americano? E o que dizer
então dos nativos palestinianos que raptaram colonos israelitas quando estes
dançavam numa rave <i>techno</i> nas terras dos que estão encarcerados no gueto
de Gaza?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
esquerda europeia e latino-americana, salvo raras excepções, reproduziu a
linguagem confusa imposta pelos opressores do povo palestiniano: o vocabulário
contido nos Acordos de Oslo de há 30 anos. Acordos fraudulentos, como se
explicará mais adiante. Este discurso fossilizado parecia estar a mudar nalguns
sectores da esquerda, com a precipitação dos acontecimentos na Palestina. Uma
parte da esquerda parecia estar a ser capaz de reconhecer o aceleramento do
tempo histórico. Outra parte, não. Não associava os elementos: a intensificação
da opressão desde 2021 e, especialmente, o resultado do confronto com Gaza em
Maio deste ano, a multiplicação das acções da resistência armada palestiniana e
o terror crescente no seio do regime face a um confronto total com o Líbano e
com outras forças regionais. E, no entanto, tudo faz parte de um processo rumo
a um horizonte. O derrube da jaula de Gaza no sábado de 7 de Outubro deixou uma
boa parte da esquerda ainda mais deslocada e desarticulada na linguagem, facto
que será analisado mais adiante neste artigo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Tudo
isto ocorre em simultâneo com a crise interna do aparelho israelita: convulsões
e espasmos sob a forma de repetidas eleições antecipadas, grandes manifestações
da facção da sociedade colonizadora que defende uma democracia supremacista
contra aquela que defende a autocracia supremacista de Netanyahu, o autogolpe
institucional, etc. Tudo isto já demonstrava o início da decomposição do regime
israelita, arrastando consigo a elite do seu departamento indígena
subcontratado, chamado Autoridade Palestiniana. Na realidade, estará a
Palestina em contagem decrescente, tal como a Argélia colonizada das décadas de
40 ou 50, ou a África do Sul da década de 70? A uma geração de distância – ou
menos – do fim da sua opressão?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
cadáver israelita que ainda caminha<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
regime israelita aparenta manter um papel de protagonismo na Ásia Ocidental,
assinando acordos com os regimes árabes circundantes, até ao último dia,
continuará a contar com o apoio dos EUA e da UE, e possui um exército muito
poderoso e, inclusive, dezenas de bombas nucleares. Poderia pensar-se que a
actual crise institucional israelita não é diferente das de muitos países
ocidentais. Cinco eleições em quatro anos, ou grandes manifestações contra um
governo que propõe reformas institucionais, não deveriam ser um alarme quanto à
solidez de um regime. É significativo que a disputa política entre as facções israelitas
resida na preservação ou na supressão do verniz de democracia liberal do seu
Estado, mas ambos os sectores partilham um consenso na continuação da limpeza
étnica e do apartheid dos povos indígenas. O assassinato de crianças
palestinianas – como reflectiu o autor Yossi Klein no jornal israelita Haaretz
em Maio passado – produz uma geminação na sociedade dos colonos israelitas, e
este pilar ideológico comum proporciona, teoricamente, maior robustez ao
aparelho israelita. Democratas supremacistas <i>versus </i>autocratas
supremacistas, com os nativos nos seus guetos correspondentes.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">No
entanto, há vários muros intransponíveis que cercam Israel, muros que o
impedirão de se ser uma entidade colonial triunfante contra os nativos, do tipo
que evolui para a “democracia liberal”, como a Austrália, o Canadá ou os
Estados Unidos, após terem conseguido saquear todo o território aos seus donos
indígenas. Este não será o seu destino e, por isso, o que observamos é uma
sociedade colonial israelita consciente disso e que se revolta contra si mesma.
<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
projecto supremacista dos colonos na Palestina está destinado a ser um
empreendimento falhado em menos de duas décadas, tal como foram a Argélia,
Rodésia, Angola ou África do Sul. As bases desse triunfo palestiniano remontam
à Nakba de 1948, quando a população palestiniana foi forçada a um êxodo
massivo, sofrendo despossessão e limpeza étnica. No entanto, a grande maioria
dos nativos, ainda que desapossados e deslocados, conseguiu permanecer no
território palestiniano e lançar as bases para a actual vitória demográfica. Este
é o primeiro e mais decisivo muro: o da demografia. Apesar das sucessivas vagas
de imigração judaica ao longo de cem anos para a Palestina, rebaptizada como
Israel nessas décadas, os povos nativos representam hoje 52% da população,
frente aos 48% da sociedade colonizadora israelita. Somando a estes os nativos
que possuem cidadania israelita de terceira classe, e os que sobrevivem sob
ditaduras militares de diferentes graus em Jerusalém, nos guetos da Cisjordânia
e em Gaza, esse número supera a totalidade dos colonos. Aceitando o melhor
censo-ficção israelita, que continua a incluir centenas de milhares de colonos
que já voltaram para o Ocidente, 7,6 milhões de palestinianos (38% com menos de
15 anos de idade) excedem os 7,1 milhões de judeus israelitas (28% com menos de
15 anos de idade). Até os demógrafos israelitas falam de um rácio inferior a
47%. Em menos de duas gerações, será atingida a proporção de dois terços para
os palestinianos. Estes números demográficos nunca são mencionados nos meios de
comunicação ocidentais, pois são um retrato que permite compreender
instantaneamente o que está a acontecer e o que vai acontecer. Perante estes
números, é óbvio que o regime entrará em colapso, a menos que leve a cabo um
genocídio em massa ou uma limpeza étnica de milhões de palestinianos. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Para
além da fuga de colonos, a fuga de capitais israelitas para os bancos
ocidentais atingiu níveis recorde. É sabido que o dinheiro é o elemento mais
cobarde. No futuro, será alcançado um ponto crítico de pânico, multiplicando
ambas as fugas: a económica e a demográfica.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Há
ainda outros muros que aprisionam o regime israelita. A sua superioridade
militar não é suficiente para proteger as suas frágeis infra-estruturas vitais
e a sua sociedade de colonos, que vive concentrada e vulnerável numa faixa
limitada entre Acre e Jerusalém. Em 2021, Israel levou a cabo um ataque de
grande escala contra Gaza e ao décimo dia teve de anunciar um cessar-fogo. Em
2022 e 2023, novos ataques foram reduzidos a escassos dias, apesar de famílias
inteiras terem sido intencionalmente despedaçadas enquanto dormiam. Pelo
contrário, há quase dez anos, em 2014, Israel não teve necessidade de suspender
os seus bombardeamentos sobre Gaza durante dois meses de massacre e 2.300
pessoas assassinadas (500 crianças). A diferença dos últimos anos face a 2014
explica-se pelas maiores capacidades da resistência palestiniana. Em 2021, as
defesas aéreas israelitas foram esgotadas em dez dias contra os rockets de
Gaza, e os EUA tiveram de as reabastecer meses mais tarde. O espaço aéreo
controlado por Israel foi encerrado e os portos, aeroportos e zonas industriais
foram atingidos por rockets palestinianos. Por outro lado, desde 2014 que os
tanques e os soldados israelitas não ousavam entrar em Gaza.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Agora,
a contra-ofensiva da resistência palestiniana, rompendo o cerco de Gaza,
mostrou, não apenas que os tanques israelitas já estavam a ser destruídos
dentro do gueto, mas que os palestinianos os estão a destruir também do lado de
fora, com mísseis e drones. Tudo mudou em relação a 2014. É claro que os
palestinianos e os seus rockets não podem derrotar militarmente o exército
israelita, mas podem provocar custos exorbitantes à sociedade colonizadora, que
os próprios israelitas não estão dispostos a suportar, o que equivale de facto
a uma derrota.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">É
por isso que Israel tem tentado manter a frente de Gaza adormecida, enquanto
dirige o seu foco para o seu sonho de expulsar os quase quatro milhões de
palestinianos de Jerusalém e da Cisjordânia. Esta tem sido a sua estratégia:
elevar ao máximo a opressão na Cisjordânia e em Jerusalém e controlar a frente
norte do Líbano. A tentativa de deixar eternamente congelado o campo de
confinamento de Gaza falhou: os nativos confinados em Gaza derrubaram o
tabuleiro, e aos deputados do partido de Netanyahu só lhes resta o clamor
desesperado por outra Nakba impossível, outra limpeza étnica em massa
impossível como em 1948.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">No
passado sábado [7 de Outubro], Netanyahu afirmou que Israel estava em guerra,
embora tenha omitido que está em guerra há 75 anos contra os nativos
palestinianos, e revelou os três pontos da sua retaliação: encerrar de novo no
gueto os nativos armados que conseguiram humilhar Israel, arrasar Gaza como
vingança, e advertir o Líbano para não se envolver. O segundo e o terceiro
pontos são mais a expressão de um desejo do que da realidade, o que revela a
sua fraqueza. Exigiu então que os palestinianos do gueto abandonassem Gaza se
não quisessem morrer todos. Uma promessa de genocídio aceitável para a Europa e
para os Estados Unidos, que também não será cumprida, mesmo perante a
necessidade de aliviar a sua aterrorizada sociedade colonizadora.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Se
Israel já não consegue lançar um confronto total com o campo de concentração de
Gaza, menos ainda o pode fazer com o Líbano. Os túneis libaneses de centenas de
quilómetros escondem um poder de fogo em rockets, mísseis, drones e
anti-tanques milhares de vezes superior ao de Gaza. Estas ameaças a poucos
quilómetros das urbes coloniais israelitas não se podem resolver com bombas
atómicas. Um dos momentos mais reveladores desta incapacidade contra a frente
norte ocorreu em Abril de 2023, quando foi alvo de vários rockets do Líbano em
resposta à opressão em Jerusalém. Israel não se atreveu a culpar o Hezbollah e,
</span><span style="font-family: "Cambria Math",serif; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Cambria Math";"></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">portanto, n</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">ã</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">o se atreveu a iniciar um confronto de grande escala contra o L</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">í</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">bano devido ao pre</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">ç</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">o a pagar pelos
israelitas. Levou a cabo uma manobra de distrac</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">çã</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">o, bombardeando
de forma limitada o gueto de Gaza e n</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">ã</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">o o L</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">í</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">bano.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Na
próxima retaliação do regime contra Gaza, durante os próximos dias, na qual
certamente serão assassinados centenas de palestinianos, o limite será ditado
pelos mísseis e drones lançados desde o Líbano na direcção da sociedade
colonizadora israelita. O impasse israelita é irresolúvel e não será possível
apaziguar o terror dos israelitas. Cada rocket e cada míssil palestiniano com
impacto significará um incremento no número de colonos que desejam fugir para
outro país. Considerando ainda o lançamento de mísseis desde o Líbano, isto
levará ao pânico entre os colonos. Uma escalada para uma via militar
desenfreada só poderá conduzir a uma dor desconhecida para a sociedade
colonizadora israelita, que nunca pagou o preço do sofrimento que os civis dos
países da região pagaram pelas agressões israelitas. As estratégias militares
falharam, assim como as estratégias para isolar e fragmentar os palestinianos.
Em 2021, a opressão em Jerusalém provocou, não só a resistência armada de Gaza,
mas uma resistência civil global em toda a Palestina em mobilizações e greves
gerais, incluindo os dois milhões de palestinianos com a cidadania de terceira
classe do regime.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
impasse israelita<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Israel
está num impasse militar e tem optado por estratégias de fio da navalha:
massacres selectivos de líderes da resistência em Gaza e das suas famílias sem
entrar numa guerra total (Agosto de 2022, Maio de 2023) e execuções incessantes
de combatentes na Cisjordânia. Tudo calculado para não provocar demasiado a
resistência armada palestiniana. Paralelamente, há a tentativa de impedir o
reforço militar regional, através do bombardeamento do território sírio. A
geopolítica também não é favorável a Israel, com o progressivo enfraquecimento
dos EUA-UE na Ásia Ocidental e no resto do mundo, ao qual acresce o
reposicionamento dos actores regionais. Apesar de serem cúmplices na opressão
do povo palestiniano, os regimes árabes não são estúpidos. Embora os seus
regimes estabeleçam relações oportunistas com Israel e lhe concedam
oportunidades fotográficas nos enterrados e vazios Acordos de Abraão. Os
regimes árabes não receberão os F35 e os mísseis dos EUA que esperavam com
estes acordos, e o dispositivo colonial não conseguiu criar uma NATO
árabe-israelita que funcionasse como escudo protector de Israel. Mais ainda, as
oligarquias árabes historicamente subordinadas aos Estados Unidos e a Israel
estão agora a reposicionar-se umas contra as outras a nível regional e global.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Aos
gigantescos acordos económicos assinados com a China e a Rússia, junta-se a
diplomacia destes dois países, que já concretizou o impensável reencontro entre
a Arábia Saudita e o Irão. A Liga Árabe tem tido um papel infame nas últimas
décadas, mas as declarações, as palavras e os termos podem mudar de um dia para
o outro. Isto pôde ser reconhecido no comunicado do regime saudita sobre a
operação palestiniana que rompeu o cerco de Gaza, em que culpa inequivocamente
Israel pela sua política de opressão e colonização: “É o resultado da ocupação
contínua e da privação do povo palestiniano dos seus direitos legítimos por
Israel.” Nestas voltas e reviravoltas da história, as mesmas oligarquias árabes
que têm sido inimigas do povo palestiniano e de outros povos da região serão as
primeiras a apresentar-se em Jerusalém no futuro para felicitar os
palestinianos no dia seguinte à queda do regime. Os EUA e o Reino Unido também
o fizeram com Mandela, depois de o terem considerado terrorista até 2008 e
apoiado o regime do apartheid sul-africano durante décadas. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
extremismo israelita é a natureza de um regime colonial<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Finalmente,
há que compreender que tudo isto não resultou de uma deriva de Israel rumo a um
extremismo descarado, conduzida por Netanyahu ou por Ben Gvir. Toda a
colonização de colonos contra nativos na sua terra é extremista e fascista,
ainda que se disfarce de democracia, como os EUA do século XIX. A despossessão
e expulsão pelas armas é fascismo. Que se revele a autêntica ideologia fascista
de um regime colonial é a consequência, e não a causa, do seu fracasso. Este
não é diferente do extremismo tardio dos colonos franceses na Argélia (OEA) ou
da sociedade de colonos europeus brancos na África do Sul (Movimento de
Resistência Afrikaner). A Argélia e a África do Sul padeceram de colonizações muito
mais extensas do que a Palestina, e nos últimos anos de opressão, os seus povos
indígenas sofreram uma violência acrescida por parte de grupos para-estatais,
como a nova milícia de colonos extremistas do ministro Ben Gvir.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
encruzilhada da resistência palestiniana<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
resistência palestiniana também se debateu com dilemas até à secreta e massiva
operação militar de ruptura do cerco de Gaza. O maior deles é como minimizar o
custo humano. Embora um povo determinado a descolonizar-se, como os
palestinianos, os argelinos ou os vietnamitas, não calcule qual será a conta
final do seu sofrimento nesta luta de décadas, é óbvio que tentam sempre
minimizar esse preço. Não se deve cair no extremo de fetichizar a resistência
do povo palestiniano nem, desde a nossa zona de conforto, pensar que os
palestinianos são irresponsáveis </span><span style="font-family: "Cambria Math",serif; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Cambria Math";"></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">e loucos pelas
vidas palestinianas que agora se v</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">ã</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">o perder.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Até
agora, o objectivo foi forçar a sociedade colonial a tomar consciência da sua
fragilidade e de induzi-la a pensar, a temer, que essa guerra total e o preço
que terá de pagar se aproximam cada vez mais. Que isto aumente o pânico, para
que prossiga a sua decomposição, multiplicando a fuga dos colonos e ao mesmo
tempo tentando pagar o menor preço possível em sangue palestiniano. Dentro da
tragédia e da raiva provocada pelos massacres israelitas, há também estratégia.
A operação de ruptura da prisão de Gaza elevará a níveis nunca antes vistos a
sensação de fragilidade e de terror entre os israelitas, embora implique um
custo muito elevado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
esquerda e a sua linguagem face à Palestina<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Este
cenário do declínio israelita e da histórica operação de resistência em Gaza
coincide com o desmoronamento do cenário e da linguagem construída há 30 anos
através dos fraudulentos Acordos de Oslo. No início dos anos 90, nos primeiros
anos da efémera hegemonia global dos Estados Unidos, ocorreram três derrotas
simultâneas das lutas de descolonização: os Acordos de Oslo para a Palestina, o
incumprimento da autodeterminação do povo saharaui, e a solução negociada de
não-descolonização da África do Sul, na medida em que nela são mantidas a forma
estatal e as estruturas económicas e de propriedade herdadas do apartheid
branco. A esquerda ocidental não analisou devidamente o caso palestiniano,
mantendo um apoio aparente à descolonização do Sahara.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Os
acordos de Oslo atrofiam o discurso da esquerda<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
flagrante processo de colonialismo através do povoamento de colonos e a
substituição demográfica forçada dos indígenas palestinianos foram
transformados pelos Acordos de Oslo num falso acordo entre supostas partes
iguais. Com isto, transformou-se também a linguagem internacionalmente empregue
para definir a relação entre opressor e oprimido. Todo o vocabulário da
esquerda utilizado na segunda metade do século XX, como invasão, libertação
nacional, descolonização, luta, apartheid, despossessão, substituição
demográfica forçada, limpeza étnica, resistência, combatentes, confinamento em
guetos, tortura, crimes contra a humanidade, crimes de guerra, direito de
regresso e até direito internacional foram largamente abandonados. Estes
conceitos foram substituídos por outros, como reconhecimento, ambas as partes,
mesa de negociações, diálogos, acordos, processo de paz, dois Estados, governo
palestiniano, compromisso, garantias de segurança para o colonizador, pedido de
moderação ao colonizador e ao colonizado, coordenação, terrorismo, islamismo, anti-semitismo,
direito de Israel a existir e a defender-se, ocupação que se refere apenas à
Cisjordânia e a Gaza, foco exclusivo nos direitos humanos, omissão sistemática
do direito ao regresso de milhões de palestinianos, etc.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Para
impor a nova linguagem, os Acordos de Oslo contaram com a cumplicidade da elite
política palestiniana, que tentava reerguer-se após ter sido destituída de toda
a liderança durante a Primeira Intifada, exilando-se, a milhares de
quilómetros, na Tunísia, entre outros factores. O partido signatário
palestiniano tinha um histórico que aparentemente o legitimava para assinar
esta traição aos direitos do povo palestiniano. Esta elite política
palestiniana da OLP era apoiada, ou pressionada, pela oligarquia interna
palestiniana, ansiosa por normalizar as transacções económicas e os negócios
com os colonizadores israelitas. A conjunção de ambas as oligarquias
palestinianas – a política, ausente do território, e a económica, presente –
assegurou o consentimento gramsciano dos povos subjugados. Ghassan Kanafani
determinou que a oligarquia indígena reaccionária era um dos três inimigos do
povo palestiniano, porque a colonização também tem uma dimensão interna de luta
de classes. Como resultado desta análise errónea, a esquerda concedeu à elite
nativa e ao departamento subcontratado que foi criado, a Autoridade
Palestiniana, uma legitimidade que nunca foi dada à camarilha indígena
sul-africana que sustentava o apartheid de Pretória, que governava os bantustões
criados pelo regime supremacista branco.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
sofisticação dos guetos palestinianos é maior do que a dos guetos da África do
Sul, com ministérios, embaixadas, empregos que proporcionam alívio económico a
uma multidão de palestinianos, e uma virtual estatalidade internacional. Além
disso, este departamento dos guetos, cuja principal função é a repressão
interna, com custos superiores ao da agricultura, da educação e da saúde
juntas, incorpora um certo nível de denúncia e crítica ao regime israelita, e
possui inclusivamente um departamento para prisioneiros e prisioneiras
palestinianos. Isto aumenta a confusão sobre o que é realmente a Autoridade
Palestiniana. Gramsci analisou estes processos de submissão há muito tempo,
situando o elemento da corrupção entre a força e o consentimento para
neutralizar, neste caso, o povo palestiniano. E esta confusão é a que persiste
até hoje na esquerda, quanto ao tipo de relação a ser mantida com a estrutura
colonial chamada Autoridade Palestiniana, embora a representação dos oprimidos
deva estar naqueles que resistem à opressão, e não nos que se sujeitam a ela ou
nos intermediários. O exemplo claro viu-se em Gaza. Quem representa os
oprimidos? Os resistentes que romperam o cerco ou a camarilha de Mahmoud Abbas?
Na Argélia e na África do Sul a esquerda foi clara.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
discurso humanitarista e a aceitação dos guetos<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Outro
elemento que reforçou a adopção deste vocabulário pela esquerda foi a
transformação da economia colonial na Palestina decorrente dos Acordos de Oslo.
A partir desse momento, um exército de ONGs dos Estados Unidos e da Europa
irrompeu na sociedade nativa, organizações cujas actividades e programas foram
financiados pelos mesmos países que patrocinam a colónia israelita. As ajudas
tiveram como condição a supressão, por parte dos palestinianos, da sua
linguagem de libertação, e até da simples linguagem da legalidade
internacional, em troca da concessão de alguns direitos humanos através dessas
ONGs. Esta lei do silêncio imposta pelo Ocidente aos nativos inclui a UNRWA, a
agência da ONU para os refugiados palestinianos. Para receber os fundos, teve
de mutilar a sua linguagem que era, inclusive, a da mera legalidade
internacional, e o seu mandato existencial para ajudar os refugiados
palestinianos está agora condicionado pela posição política dos nativos sobre
se querem receber leite ou tratamento médico.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Muitos
dos membros europeus destas ONGs financiadas participaram, por sua vez, no
Ocidente, em redes de solidariedade com a Palestina, ou até fizeram parte de
partidos de esquerda. Portanto, estas pessoas ligadas às ONGs trouxeram de
volta para a Europa ou para os EUA a linguagem que impunham aos palestinianos
no terreno, e tem sido o vocabulário que têm utilizado no Ocidente em artigos,
relatórios ou reuniões relacionadas com a Palestina.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
medo da acusação de anti-semitismo<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Outro
elemento que tem manietado a esquerda ocidental relativamente à Palestina tem
sido o medo de uma possível acusação de judeofobia ou, mais frequentemente, do
termo manipulado de anti-semitismo. À insegurança discursiva de muitos partidos
de esquerda sobre a causa palestiniana, devido à confusão, à ignorância ou à
crença em que a questão colonial foi resolvida no século XX, acresce o
sentimento de culpa culturalmente inoculado em cada uma das pessoas ocidentais,
e não só nelas, pelo genocídio alemão contra o povo judeu há 80 anos. Um
sentimento selectivo de culpa que foi imposto universalmente e com o seu termo
próprio, Holocausto.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Isto
não acontece no caso do mesmo genocídio perpetrado pela Alemanha contra milhões
de civis soviéticos ou ciganos, por exemplo, apesar de estes três grupos
sociais (soviéticos, ciganos e judeus) terem ocupado o mesmo nível de
infra-humanidade e de extermínio máximo para os dirigentes alemães. Israel sabe
obviamente como esta acusação opera no subconsciente ocidental e estabeleceu o
anti-semitismo como a sua última trincheira defensiva. Lançou os seus lobbies
em todo o mundo para tentar impor um contrato de lealdade com o regime
israelita. Instituições, parlamentos, governos, câmaras municipais,
administrações públicas e até a própria ONU estão a ser pressionados por
agentes israelitas para adoptarem a definição de anti-semitismo da IHRA, que
nada mais é do que a tentativa de censurar e perseguir a solidariedade com a
Palestina e de blindar o regime contra os crimes que comete.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Os
últimos trinta anos foram um longo período de retrocesso nas posições da
esquerda ocidental, que aceitou os quadros de referência impostos pelo poder,
também em relação à questão palestiniana. Não se trata apenas de ter de
explicar sucessivamente que não é anti-semitismo ou judeofobia combater o
sionismo e o seu artefacto colonial na Palestina. É ainda pior. Passámos do
ponto em que a Assembleia Geral da ONU declarava o sionismo como uma ideologia
criminosa e racista, à possibilidade de esta adoptar o sionismo através da IHRA
e de alargar a proibição da solidariedade com a causa palestiniana que já foi adoptada
pela Alemanha. A esquerda ocidental é a esquerda da metrópole colonial da
Palestina. A Europa e os EUA são a metrópole do regime israelita e isso
obriga-nos a ter uma responsabilidade maior na análise e na linguagem.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">O
uso do quadro narrativo imposto pelos colonizadores<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
social-democracia já se tinha rendido ao colonialismo israelita na conferência
internacional da Internacional Socialista de 1960, na cidade de Haifa. A cidade
tinha sido alvo de uma limpeza étnica doze anos antes, com massacres terríveis
e os poucos palestinianos indígenas que restavam em Haifa a viver sob uma
ditadura militar a poucos metros do conclave. Nesse evento, a Internacional
Socialista emitiu uma declaração final defendendo as descolonizações em todo
mundo, mas legitimando a colonização da Palestina. É por isso que, no sábado
passado, Pedro Sánchez chamou repetidamente terroristas aos nativos
palestinianos que ousaram forçar a saída do gueto de Gaza, pisando de novo as
terras que lhes foram roubadas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Além
dessa social-democracia que hoje se tornou social-liberal, todo o espaço à sua
esquerda caiu, em maior ou menor grau, no erro ou na ignorância de usar grande
parte do vocabulário dos Acordos de Oslo ou daquele forjado pela hegemonia
mediática e cultural ocidental, que inclui conceitos fraudulentos e mitológicos
como o de povo judeu. Pior ainda é a narrativa adoptada por alguns sectores da
esquerda ocidental, com um sucessivo lamento trágico e doloroso pelas crianças
palestinianas massacradas, mas desprovido de qualquer denúncia colonial. É uma
narrativa idêntica à das ONGs que tentam proporcionar algum alívio em matéria
de direitos humanos dos povos indígenas. Igualmente prejudicial é o abuso do
termo “ocupação”, já que o mesmo se devia referir a algo temporário,
evidenciando uma incompreensão, ou uma ocultação, do processo gradual de
invasão permanente de toda a Palestina.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Para
além disto, na infinidade de proclamações da esquerda ocidental que reclamam
ser o culminar da reivindicação, ouvimos a exigência do “fim da ocupação” e do
“reconhecimento do Estado da Palestina”. Quem diz isto nunca explica em que
consistiria este Estado da Palestina: se seriam centenas de guetos nativos
desconexos, ou no máximo, um Estado baseado em dois macro-guetos como a
Cisjordânia e Gaza, se ocorresse um improvável abandono da Cisjordânia pelos
600.000 colonos. Ou seja, o que ouvimos nestes discursos é a petição da
esquerda para que os guetos menores ou os guetos maiores, em suma, os guetos,
sejam identificados como o Estado da Palestina, como enclaves indígenas dentro
do regime que colonizou toda a Palestina. Isto significa que se perdeu a noção
essencial de que a Palestina continua a ser todo o território desde o Rio
Jordão até ao Mar Mediterrâneo, mesmo que durante algumas décadas tenha sido rebaptizada
pelos colonos como Israel, tal como o Zimbabué foi renomeado pelos colonos como
Rodésia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Por
estas razões, é vergonhoso que as ONGs israelitas e ocidentais tenham
ultrapassado vários sectores da esquerda ocidental na definição do artefacto
israelita como um regime de apartheid e, portanto, um crime contra a
humanidade. A denominação apartheid é inclusive insuficiente para descrever
Israel, e chega demasiado tarde, quando os palestinianos já a utilizam há
muitas décadas e, no entanto, a esquerda não a utiliza massivamente.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 6.0pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
não-violência como axioma absoluto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Estes
impasses da esquerda continuam a operar noutras categorias. Um deles é a acção
de boicote total ao Estado israelita, que muitas organizações de esquerda ainda
têm pavor de considerar, admitindo apenas de forma muito concreta. É claro que
deve haver um boicote, não apenas a um grupo restrito de empresas, mas a todo o
artefacto colonial. É uma exigência que as mulheres palestinianas já lançaram
em 1929 e que até nasceu antes, mas que continua a ser ignorada no Ocidente.
Por exemplo, os partidos políticos e os sindicatos mantêm fóruns e reuniões
conjuntas com organizações racistas israelitas equivalentes.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Outro
impasse é o totem da não-violência, enraizado há décadas no Ocidente. Mas as
guerras capitalistas são uma coisa e as lutas de libertação e a auto-defesa são
outra. A isto soma-se o conceito do <i>white savior</i>, que mantemos, por
exemplo, ao acreditar que foi o nosso boicote ao povo europeu branco que
conseguiu derrubar o regime do apartheid na África do Sul. Trata-se de um
desprezo pela resistência indígena na África do Sul, Palestina, Vietname,
Angola, etc., e de uma amnésia perante as lições do século XX. Foi esquecido
que toda a colonização é violenta e que, como tal, o processo histórico de
descolonização também é violento. É preciso recuperar a compreensão de que a
ingovernabilidade de um regime colonial diante da resistência em todas as suas
formas por parte de uma maioria nativa é o que derruba essas construções em
terras do ultramar. Não se trata de uma sublimação ou de um fascínio pela
violência, trata-se de compreender que a violência é a linguagem da realidade
quotidiana que os colonizadores israelitas impuseram com a ajuda dos EUA e da
UE. Trata-se de compreender que, se a sociedade colonial israelita não pagar um
preço com o medo e não for forçada a tal, não renunciará ao seu privilégio nem
à sua supremacia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
resistência sob todas as formas por parte dos palestinianos nativos é um
exercício legítimo que a esquerda não ousa proclamar, apesar de ter aplaudido
Zelensky e apoiado o envio de armas para a Ucrânia. A luta armada contra a
opressão e a colonização é reconhecida no direito internacional, implicitamente
no preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos e explicitamente em
diferentes textos, como a Resolução 3070 da ONU. Dos três níveis de resistência
do povo palestiniano – a exigência de direitos humanos, a mobilização não
violenta e a resistência armada –, apenas os dois primeiros foram
manifestamente apoiados pela maior parte da esquerda ocidental nas últimas
décadas. Declarar apoio à luta armada significava cair no <i>trompe l'oeil</i>
do terrorismo. Há que recordar que o regime israelita declarou como terrorismo
todos os três níveis de resistência, incluindo as ONGs palestinianas de
direitos humanos. A esquerda da metrópole colonial entrou numa contradição com
a luta armada indígena na Palestina que ainda não foi resolvida, paralisada na
teia do “terrorismo”.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">Foi
por isso que os Verdes europeus fizeram uma declaração infame sobre a operação
a partir de Gaza, chamando-lhe terrorismo. Já era de esperar, já que se
converteram no braço esquerdo da NATO. O Podemos cedeu no uso de uma
equivalência horrível entre os actores (Israel e Hamas) e da equidistância na
“escalada de violência” que mais tarde quis corrigir noutras declarações. A
tibieza do Sumar ou da CCOO nas suas contas no X/Twitter foi ainda mais
transgressora. O PCE oscilou entre a mensagem clara anticolonial da sua
juventude e a vaga mensagem humanitária do seu Secretário-Geral.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">No
entanto, como referi no início do artigo, a linguagem parece ter começado a
mudar, tanto em espaços como o Parlamento Europeu, como nos novos meios de
comunicação social. A linguagem da esquerda relativamente à Palestina tem de
ser redireccionada para este quadro, para a recuperação da narrativa
anti-colonial. Até agora, grande parte da esquerda ocidental silenciou os
nativos palestinianos e a sua mensagem política ao aceitar, durante 30 anos, o
quadro narrativo de Oslo estabelecido pelos colonizadores da Palestina, e
legitimando a Autoridade Palestiniana como representação dos colonizados, isto
é, naqueles que se submeteram, e não nos que resistem. A esquerda da metrópole
ocidental tem uma obrigação ainda maior de situar o discurso anticolonial no
centro das explicações sobre a Palestina e, portanto, das acções a levar a
cabo. É imprescindível retomar a radicalidade, nas suas raízes, na compreensão
e na expressão de apoio à causa palestiniana. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">A
esquerda ocidental deve assumir que a última colónia europeia no mundo árabe,
depois da Líbia, da Argélia, de Marrocos ou da Tunísia, onde milhões de colonos
europeus se fixaram durante várias gerações, não tem o direito de existir. E os
cidadãos israelitas não-indígenas continuarão a ser colonos enquanto
continuarem a apoiar o seu artefacto colonial contra os nativos,
independentemente das suas disputas políticas internas, enquanto a grande
maioria não questionar o seu regime supremacista. Os Estados não têm o direito
intrínseco a existir, e os regimes coloniais ainda menos. São as pessoas que
habitam um território, juntamente com a que dele foram expulsas, que têm
direito a uma existência com direitos e obrigações iguais. Se os actuais
colonos assumirem direitos iguais aos dos palestinianos nativos, terão um lugar
na futura Palestina com as estruturas coloniais desmanteladas. Tal como fizeram
os poucos colonos franceses, <i>Pieds Noirs</i>, que decidiram renunciar ao seu
supremacismo e permanecer na Argélia independente face à maioria dos colonos,
que os consideraram intoleráveis </span><span style="font-family: "Cambria Math",serif; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: "Cambria Math";"></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">e decidiram
regressar </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">à</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"> metr</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%; mso-bidi-font-family: Alegreya;">ó</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;">pole francesa.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12.0pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25.0pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Daniel
Lobato Bellido</span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Daniel
Lobato Bellido é ativista pelos Direitos Humanos especializado na Causa
Palestiniana, comentador na Hispan TV, colunista e brigadista internacional da
Unadikum.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Nota
de Edição</span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">O texto
original, em castelhano, foi publicado no jornal espanhol <i>El Salto</i> a 9
de Outubro de 2023, sob o título <i><span style="color: #97694b;"><a href="https://www.elsaltodiario.com/analisis/ruptura-del-confinamiento-gaza-cadaver-israeli-izquierda-palestina"><span style="color: #97694b;">La ruptura del confinamiento de Gaza, el cadáver israelí,
y la izquierda ante la Palestina</span></a></span></i>. A tradução para
português é de Paulo Ávila.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagens</span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Tala,
de 7 anos, brinca à “princesa adormecida” numa saliência deixada por um trator
nas terras agrícolas da sua família. Imagem da série <i>The Sacred Space Odity</i>,
da fotógrafa palestiniana Tanya Habjouqa.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13.0pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«<i>A
Ruptura do confinamento de Gaza, o Cadáver Israelita e a Esquerda perante a
Palestina</i>» • Daniel Lobato Bellido<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 26.10.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2023<o:p></o:p></span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-74302796657043619032023-10-18T00:10:00.000-07:002024-01-05T03:11:09.787-08:00Palestina: terra devastada • Pedro Levi Bismarck<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgV7b4SUi9W1HZcM78VM-8ycxpNyLQgKZ-kjiYwfQWUsippN2CqjK3Lv7kr3-VW4gDmYYDUM-_uqS2LDNKgdjK6jmiVtQdYYLhvzlhxnvBejQ2kSD61JetYdIho3e65O61ytk2C8TBFVki7i0UchmwiJ-wG6ZexTbPGgmHhg8hyWSfeI-kmVyUIs2q6rbqs/s1457/unnamed%20(9).png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1072" data-original-width="1457" height="406" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgV7b4SUi9W1HZcM78VM-8ycxpNyLQgKZ-kjiYwfQWUsippN2CqjK3Lv7kr3-VW4gDmYYDUM-_uqS2LDNKgdjK6jmiVtQdYYLhvzlhxnvBejQ2kSD61JetYdIho3e65O61ytk2C8TBFVki7i0UchmwiJ-wG6ZexTbPGgmHhg8hyWSfeI-kmVyUIs2q6rbqs/w553-h406/unnamed%20(9).png" width="553" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><p></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">1. O
Estado de Israel funda-se, em 1948, enquanto gesto violento de ocupação de um
território com o assassínio e expulsão dos seus habitantes palestinianos. Este
evento tem um nome: a <i>Nakba</i> [<i>Catástrofe</i>].<o:p></o:p></span><p></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">2. O
Estado de Israel nunca se constituiu como um Estado laico multiétnico: este é a
unidade <i>indesdobrável </i>da máquina biopolítica e tanatopolítica da figura
do Estado Moderno, da ordem legitimadora e agregadora de uma Religião e do
destino histórico de um Povo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">3. O
Estado de Israel é um Estado Colonial: assenta, desde logo, na colonização
intensiva e progressiva de todo um território e, consequentemente, num racismo
de Estado que incorpora a figura do palestiniano como inimigo único e total,
precisamente na medida em que o <i>sub-humaniza</i>. O paradoxo constitutivo do
Estado de Israel é precisamente esse: <span style="color: black; mso-themecolor: text1;">«</span></span><i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Toda a política
israelita revolve em torno da afirmação e da negação dessa figura, dessa mesma
entidade </span></i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">[o palestiniano] <i>que só pode </i>existir não existindo,<i> mas de cuja
</i>existência<i> depende a própria identidade lógica do Estado de Israel,
enquanto máquina de guerra infinita e perpétua</i></span><i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">».</span></i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;"> </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 150%;">[</span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/o-estado-colonial-pedro-levi-bismarck.htmlhttps:/www.revistapunkto.com/2023/10/o-estado-colonial-pedro-levi-bismarck.html"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 150%; text-decoration: none; text-underline: none;">Pedro Levi Bismarck, <i>O Estado
Colonial</i></span></a><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 150%;">]</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">4. É,
portanto, como máquina de guerra que o Estado de Israel encontra um dos seus
últimos elementos constituintes: ele nasce da guerra e faz da guerra o seu <i>modus
vivendi </i>permanente. Para este, tudo está em vias de se constituir como objecto
e alvo militar. É por isso que se pode falar de uma Guerra Civil: primeiro,
porque esta é uma guerra que acontece no interior de um Estado-Nação — porque Israel
coloniza efectivamente o território dos palestinianos e administra tecnicamente
mesmo aqueles territórios que se mantêm no limiar do seu exterior —, mas também
porque esta é uma guerra que se instala no domínio do<i> civil</i>: <i>ela visa
e generaliza-se a todos os aspectos da vida dos palestinianos</i>. Trata-se de
uma guerra militar, social, económica, biológica, tecnologicamente sofisticada
e altamente cruel na sua permanência e na sua omnipresença, na sua estratégia
dissimuladora e invasiva: as colheitas palestinianas que são envenenadas e destruídas
com herbicidas, as crianças palestinianas que são assassinadas
indiscriminadamente, a construção ilegal dos colonatos na Cisjordânia, os
processos sumários de despejo dos palestinianos em Jerusalém, já para não falar
em todo o tipo de restrições à liberdade de movimentos e em todo o tipo de
estratégias de segregação que fazem de Israel um apartheid colonial. É uma
guerra total e sem tréguas que tem como objecto a gestão da vida na sua
dimensão biopolítica, sonegando e minando as condições de vida dos
palestinianos. Este é o ponto inescapável: não há nesta guerra nenhuma distinção
possível entre o <i>militar</i> e o <i>civil</i>, foi sempre a população
palestiniana, a gestão do seu corpo colectivo e da sua vida individual, que se
constituiu como objecto militar da máquina de guerra do Estado israelita.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">5. Ora,
por mais cruéis que os ataques do Hamas possam ser, e são-no de facto, eles não
fazem mais nada do que continuar a lógica de guerra israelita<i>: a guerra civil,
a guerra contra civis</i>, <i>a guerra contra os palestinianos como cidadãos
sem direitos e como povo sem existência ou em sub-existência</i>. É condenável
o ataque do Hamas, como são condenáveis todas as formas de violência que Israel
tem exercido incessantemente. O cinismo ocidental está precisamente aí: <i>condenar
o Hamas por fazer aquilo que Israel não cessa de fazer. </i>Ora, isto não
significa legitimar a acção do Hamas, significa situá-la no contexto de uma
guerra que fez da <i>vida civil</i> uma <i>vida nua</i> — para tomar de
empréstimo o conceito cunhado por Giorgio Agamben —, uma <i>vida sem direitos </i>reduzida
ao limiar da subsistência e que está sempre perante a possibilidade de ser
tomada enquanto objecto da violência militar, <i>vida exposta à morte</i>. Um
Estado que lança herbicida sobre as colheitas de um outro «território», um
Estado que mata sumariamente, ao arrepio de qualquer legalidade, crianças,
mulheres, jornalistas, é um Estado que mobiliza tácticas de terror, é um Estado
terrorista. Terrorismo de Estado não deixa de ser terrorismo. E é isso que a «comunidade
internacional» prefere não ver, tem pudor em aceitar.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">6. Neste
sentido, aquilo que é exasperante no acompanhamento por parte dos <i>media </i>deste
conflito é toda uma leitura enviesada da História e da realidade: é esse jogo
de linguagem subtil e permanente que estabelece uma diferença ética e um grau
de valor entre uns e os outros: os «ataques» do Hamas são «cruéis», «brutais», «carnificina»,
enquanto sobre as «acções militares de Israel» cai o poder de sublimação do
eufemismo e são apenas caracterizadas como «injustificadas» e «problemáticas». As
cerca de 50 crianças palestinianas assassinadas desde 1 de Janeiro até 7 de
Outubro deste ano de 2023 não mereceram a indignação generalizada dos <i>media</i>.
De acordo com as Nações Unidas, são 6407 os palestinianos mortos desde 2008 até
ao final de Setembro (308 é o número de israelitas).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">7. E
aqui impõe-se uma outra reflexão: os <i>media</i> transformaram-se, eles
próprios, em instrumentos de guerra e assumiram — com a morte do jornalismo — a
função de autoridade moral e policial da sociedade, definindo todos os limites
a partir dos quais um problema é efectivamente apresentado como passível de ser
discutido. Não se trata apenas de «construir opinião pública» ou de construir
uma narrativa onde se joga o círc(ul)o da legitimidade política, mas porque ao
fazê-lo são as próprias condições de possibilidade dos valores que os <i>media</i>
reclamam como seus — a liberdade de expressão e a democracia — que são postos definitivamente
em causa. Não há democracia sem a possibilidade de constituir com a informação
e o conhecimento uma relação crítica. O <i>pathos</i> emocional trágico-<i>thriller</i>
do noticiário é a negação do jornalismo, que qualquer jornalista digno deste
nome se deveria recusar a fazer, é a negação da própria democracia como
possibilidade de instauração de um regime de racionalidade mínimo sobre o mundo
das coisas. Os <i>media,</i> enquanto complexo político-ideológico-mediático, são
o não-lugar onde se consuma o êxtase e a morte da política ocidental europeia.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">8. Mas
o cinismo ideológico não está apenas na ignorância da história ou na forma como
a política ocidental transforma sublimemente os seus objectivos económicos
estratégicos e militares em valores ou imperativos morais, ele está igualmente
na mobilização desta tragédia para tentar encurralar a própria esquerda. É a
esta que se apontam todos os danos morais, todas as contradições políticas, todas
as falhas éticas, apenas porque afirma o óbvio: <i>é primeiro que tudo a
violência do Estado de Israel </i>—<i> </i>o aprisionamento sumário de dois
milhões de habitantes num «campo de concentração» onde os direitos de
existência humana básicos são negados — <i>que gera e mobiliza todas as outras
formas de violência</i>, sobretudo quando, como bem refere </span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/10/sublevacao-na-palestina-tariq-ali.html"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Tariq
Ali</span></a><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">,
todas as formas de resistência não-violentas que foram tentadas nos últimos
anos — e décadas — <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>não receberam
qualquer atenção por parte das instituições políticas ocidentais. Onde estava a
direita e a sua autoridade moral no dia 6 de Outubro? Enfim, qualquer discussão
sobre Israel e sobre a Palestina tem de partir deste ponto: Israel é uma
potência colonial e a Palestina é um território ocupado e é sobre este que Israel
administra uma guerra civil permanente.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">9. A
ambiguidade moral não está à esquerda, mas sim à direita: é esta última que
escolhe <i>selectivamente</i> onde estão as formas de violência e de injustiça
que a chocam. Para a direita, a violência do Estado de Israel é apenas a luta
pela sua sobrevivência legitimada pelo seu destino e pelo seu <i>Capital</i> —
aqui no duplo sentido da palavra. Para a esquerda, a violência do Estado de
Israel não justifica, não pode justificar, o assassínio e a limpeza étnica de
todo um outro povo que não por acaso é, ele próprio, também semita. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">10. Mas
numa altura em que se fala tanto de descolonização, em que se discute a
responsabilidade histórica das potências imperiais, é ainda mais vergonhoso o
grau de alienação do Ocidente relativamente às suas próprias responsabilidades históricas
em todo este processo. Escrevia </span><a href="https://expresso.pt/internacional/2017-11-02-Uma-promessa-impossivel"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Gideon
Levy</span></a><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">,
no diário israelita <i>Haaretz</i>, não há muito tempo: «<i>Um império</i>
[britânico]<i> prometeu uma terra que ainda não tinha conquistado a um povo que
não vivia lá, sem nada perguntar aos seus habitantes. Não há outra forma de
descrever a inacreditável temeridade colonialista que clama de cada letra da
Declaração Balfour</i>». Quem esteve no Médio Oriente sabe que há um ódio ao Ocidente
e que este tem raízes históricas bem justificadas. É todo um ódio a um passado —
e a um presente — colonial que faz da Palestina não apenas a <i>terra devastada</i>
do Estado israelita, mas de todo o imperialismo ocidental. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Aquilo
que as declarações de grande parte dos líderes europeus, após o dia 7 de
Outubro — particularmente de Ursula von der Leyen — exprimem com perturbável
clareza não é apenas marasmo diplomático ou cinismo político, nem mesmo ignorância
histórica, mas a substância de uma política que é, e continuará a ser, enquanto
política externa do Capital, essencialmente colonial, racial e militar, sempre
vestida, no entanto, com as roupas do Humanismo e da Humanidade. <i>Nakba!</i></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEivrTyVt4eVYzFcVVMM48FycRoIb3D9H-lfL01lryJVhTIwJaFE3UNQfwLwaSZca0FaSwlSHV7zEY0I54-la5cqQEXPiKfdJnTKbl8snFfwRiyDSDOaSXVYknBFSh_BaQ4dsYOKXHlkkrCKU67qXUJljt9SQp2cnIk0SgJ5hRc4Kplk1BOHwXXMQycACrp1/s1461/unnamed%20(4).png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1072" data-original-width="1461" height="235" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEivrTyVt4eVYzFcVVMM48FycRoIb3D9H-lfL01lryJVhTIwJaFE3UNQfwLwaSZca0FaSwlSHV7zEY0I54-la5cqQEXPiKfdJnTKbl8snFfwRiyDSDOaSXVYknBFSh_BaQ4dsYOKXHlkkrCKU67qXUJljt9SQp2cnIk0SgJ5hRc4Kplk1BOHwXXMQycACrp1/s320/unnamed%20(4).png" width="320" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh5JiEmummIBo0pW7ukO7u__wGea0agm2GsxOeQTsmk8eHf68VyKsp_-0_2kyN8SL4oJJnSHYu1-aFfitGc_LNrKDzpk5PkpRYdNa9AjzHAdwueqOTSKWoRxiZ35IKdU032Qcxy6Za8_IbdFjiPDeLocO6IMg8Pj97aacpXR_gDYRDQaIxdkufjnaoaPobi/s1462/unnamed%20(5).png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1063" data-original-width="1462" height="233" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh5JiEmummIBo0pW7ukO7u__wGea0agm2GsxOeQTsmk8eHf68VyKsp_-0_2kyN8SL4oJJnSHYu1-aFfitGc_LNrKDzpk5PkpRYdNa9AjzHAdwueqOTSKWoRxiZ35IKdU032Qcxy6Za8_IbdFjiPDeLocO6IMg8Pj97aacpXR_gDYRDQaIxdkufjnaoaPobi/s320/unnamed%20(5).png" width="320" /></a><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjzZsrnAptfeOrElKfbBWLTPZNUnwA40KGN58YPko-P2FDspa0R4WOyuhN3Zh2bCE0GJi-tlTmvkho2sS5CFlwPo4-3oZuCNduut9Y8E7S-2vzNxe5I_xIHoaXPY7A6stlfEg7NkVTBlQm2LQD5ZaeetacBhfPLg4_9OXAty90Gcyq0Tiuur6IMVtXBVYoB/s1458/unnamed%20(7).png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1063" data-original-width="1458" height="233" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjzZsrnAptfeOrElKfbBWLTPZNUnwA40KGN58YPko-P2FDspa0R4WOyuhN3Zh2bCE0GJi-tlTmvkho2sS5CFlwPo4-3oZuCNduut9Y8E7S-2vzNxe5I_xIHoaXPY7A6stlfEg7NkVTBlQm2LQD5ZaeetacBhfPLg4_9OXAty90Gcyq0Tiuur6IMVtXBVYoB/s320/unnamed%20(7).png" width="320" /></a></div></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><p></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Editor
do Jornal Punkto, arquitecto, crítico e ensaísta, investigador no CEAU (Centro
de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagens
do documentário de<i> Scenes of the Occupation from Gaza</i> (1973) de Mustafa
Abu Ali. O </span><a href="https://www.palestinefilminstitute.org/en/pfp/archive/scenes-of-the-occupation-from-gaza"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Palestine Film
Institut</span></a><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">
disponibilizou no seu site entretanto uma série de documentários e filmes sobre
Gaza.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«Palestina:
<i>terra devastada</i>» • Pedro Levi Bismarck<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 18.10.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2023</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-50765517020721922122023-10-16T13:32:00.004-07:002023-10-16T14:22:17.015-07:00Olho por olho e o mundo está cego • Franco “Bifo” Berardi<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1cxft2s4OXJ-SK6khGUetdKO_uhLGIlyXyYrllt4vzNC8hzLJntO9QaWio54-rqPs4Y5CpTF1LQEEYEjWbBbAx4EYluRWP3_29DoyhxzfkI04BqA4yIJ6HrnAOrXfdJxuV1qjeBBzHdNg4pXbAh8JbHif9j1b8OtqlPLn-I0pNsWBukKRsEMFK5dTFfBs/s1200/%E2%80%9CCounter-terrorism%E2%80%9D-training-for-sport-and-tourism-is-on-rise.-From-Sacred-Space-Oddity.-Tanya-HabjouqaNOOR.jpeg.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="800" data-original-width="1200" height="383" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1cxft2s4OXJ-SK6khGUetdKO_uhLGIlyXyYrllt4vzNC8hzLJntO9QaWio54-rqPs4Y5CpTF1LQEEYEjWbBbAx4EYluRWP3_29DoyhxzfkI04BqA4yIJ6HrnAOrXfdJxuV1qjeBBzHdNg4pXbAh8JbHif9j1b8OtqlPLn-I0pNsWBukKRsEMFK5dTFfBs/w577-h383/%E2%80%9CCounter-terrorism%E2%80%9D-training-for-sport-and-tourism-is-on-rise.-From-Sacred-Space-Oddity.-Tanya-HabjouqaNOOR.jpeg.jpg" width="577" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><p class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">«Numa noite de Inverno, coube-me fazer o
turno de vigia com Efraim Avneri... a penumbra não me permitia ver o seu rosto,
mas denotei uma sombra de ironia subversiva na sua voz quando me respondeu:<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">— Assassinos? Mas o que esperas deles?
Do ponto de vista deles, somos extraterrestres vindos do espaço para nos
espalharmos nas suas terras... E que, com astúcia, nos apropriámos, pouco a
pouco, de cada parcela do seu território. Então, o que pretendias? Que eles nos
agradecessem pela nossa bondade de espírito? Que nos recebessem com cerimónias
de boas-vindas? Que nos oferecessem respeitosamente as chaves de todo o país só
porque houve um tempo em que os nossos antepassados viveram cá? Será mesmo
surpreendente que tenham pegado em armas contra nós? E agora que lhes
infligimos uma derrota esmagadora, e que centenas de milhares deles vivem em
campos de refugiados desde esse dia, esperas que partilhem da nossa alegria e
nos desejem felicidades?<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">Respondi-lhe:<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">— Sendo assim, porque é que ainda estás
aqui a fazer a ronda, armado? Porque não sais do país? Ou levas a tua arma para
combater do lado deles?<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">Na escuridão, senti o seu sorriso
triste:<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">— Do lado deles? Do lado deles não me
querem, em lado nenhum do mundo me querem. Ninguém me quer. A questão está
precisamente aí. Já há demasiada gente como eu em toda a parte. Essa é a única
razão pela qual estou aqui. Essa é a única razão pela qual ando armado, para
que não me expulsem daqui. Mas a palavra “assassinos”, não a usaria jamais para
descrever os árabes que perderam as suas aldeias.<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">Dos nazis, digo-o sem vacilar. De Stalin
também. E de todos aqueles que expropriam terras de outros»<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 107%;">— Amos Oz, <i>Uma história de amor e
trevas.</i><o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">«Atalya olhou-o de soslaio, desde a sua chaise
longue, e como se cuspisse as palavras entre os lábios disse: “Querias um
Estado? Querias a independência? Bandeiras e uniformes e notas de banco e
tambores e trombetas. Derramaste rios de sangue inocente, enterraste uma
geração inteira. Expulsaste centenas de milhares de árabes das suas casas,
enviaste navios inteiros de imigrantes que sobreviveram a Hitler directamente
das tendas de acolhimento para os campos de batalha. Tudo para ter aqui um
Estado de judeus. E vê o que conseguiste».<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 107%;">— Amos Oz, <i>Judas.<o:p></o:p></i></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">O <i>pogrom </i>organizado
pelo Hamas (um <i>pogrom </i>de facto, não uma acção de guerra) não foi
dirigido contra o Estado de Israel, contra o exército de Israel, mas sim contra
os <i>ravers</i>, as mulheres e as comunidades das aldeias. Foi uma acção
abominável, mas não podemos condená-la sem, ao mesmo tempo, compreender o
contexto em que teve lugar. Este contexto é o da vingança de todos contra
todos. Este contexto é o de uma guerra fragmentária e global, em que neste
momento apenas se enfrentam nazis contra nazis. É o fruto envenenado da vitória
do nacionalismo contra o internacionalismo. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Desde 7 de Agosto
de 2023, tenho acompanhado os ataques dos colonos israelitas contra os
agricultores palestinianos e a violência dos soldados do Tsahal contra os
jovens encarcerados nos territórios ocupados ou no campo de concentração de
Gaza, bem como as profanações levadas a cabo pelos ultra-ortodoxos contra os
lugares sagrados do Islão na Esplanada das Mesquitas. A principal fonte de
informação é a agência <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.anbamed.it/"><span style="color: #97694b;">ANBAMED</span></a></span>,
editada por Farid Adly.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">A imprensa
italiana, que define como “terroristas” os militantes do Hamas, jamais chamou
terroristas aos israelitas que assassinam a sangue-frio civis desarmados, que
destroem diariamente casas e arrancam oliveiras. Eu sei que o Hamas é uma
organização islâmica apoiada por tiranos iranianos. Sei muito bem que as suas acções
se fundam numa ideologia violenta de vingança. Mas sei também que a vingança é
tudo o que resta para aqueles que são objecto de violências e humilhações
sistemáticas. Aqueles que vivem sob ameaça constante, que viram as suas casas
destruídas, que têm um irmão encarcerado sem justificação, não podem senão
desejar a vingança.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">A humilhação
gera monstros, como já devíamos saber. A humilhação dos proletários alemães
após o Tratado de Versalhes gerou o monstro de Hitler. A humilhação dos judeus
exterminados por Hitler e abandonados por todos os Estados europeus gerou o
monstro do Estado étnico militarista e colonialista de Israel. A humilhação dos
palestinianos esmagados pela preponderância militar dos sionistas gerou o
Hamas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Mas a história
do século XX já nos deveria ter ensinado que, se aplicarmos o princípio
bíblico: olho por olho, o resultado é que ficamos todos cegos. Cegos estão os
palestinianos, cegos estão os israelitas. Cegos estão os russos e cegos estão
os ucranianos. No entanto, não. Após o fim do internacionalismo, movemo-nos sem
rumo num mundo de cegos que lutam na eterna escuridão do nazismo omnipresente.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Livro do Êxodo:<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">«<i>Se dois
homens brigarem entre si e nessa luta ferirem uma mulher grávida, provocando o
aborto, não havendo maior dano, ao culpado será imposta uma indemnização pelo
marido da mulher, a ser paga de acordo com a aprovação dos juízes. Mas se
resultar na morte, terá de ser paga vida por vida: olho por olho, dente por
dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida,
nódoa negra por nódoa negra</i>»<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Em seguida,
poderão ler as notícias que a imprensa ocidental (cega) não vos deu nos dois
meses que antecederam a vingança do Hamas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">7 de Agosto de
2023<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Execução
pública. Três jovens palestinianos foram executados dentro de um automóvel
completamente destruído por uma saraivada de balas, em Arraba, a sul de Jenin.
O comando das tropas de elite israelitas emboscou o carro num cruzamento, no
meio do trânsito da cidade. O Crescente Vermelho Palestiniano denunciou que o
exército impediu a assistência dos feridos e aguardou que estes morressem por
sangramento, levando o carro destruído com os corpos no seu interior num
reboque, numa já habitual e horrenda operação de sequestro de cadáveres. O
comunicado do exército israelita fala de uma operação preventiva contra uma
célula que estava prestes a levar a cabo um ataque contra cidadãos israelitas. Noutro
incidente, um colono atropelou deliberadamente um rapaz palestiniano perto de
Belém, provocando a sua morte. O comportamento das forças de ocupação face à
agressão dos colonos caracteriza-se por uma discriminação abnormal. Não há
detenção dos agressores, mas antes a sua protecção contra as pedras dos
palestinianos. Em caso de assassinato, são mantidos em prisão domiciliária e,
nos julgamentos, são absolvidos por "legítima defesa contra um perigo
evidente". Foi o que aconteceu com os dois colonos acusados do assassinato
do jovem de Burqa, Qusai Maatan, de 19 anos, assassinado a tiro durante uma
manifestação palestiniana contra a apropriação de terras por colonos judeus
israelitas.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Os dois assassinos,
identificados através de vídeo, permanecem em liberdade. Este caso foi
classificado, pela primeira vez, numa declaração do Departamento de Estado dos
EUA como «um acto de terrorismo contra a população palestiniana», apelando a
que os responsáveis sejam punidos pelo crime.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">9 de Agosto <o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Um jovem
palestiniano de 27 anos foi assassinado esta manhã, quinta-feira, pelas tropas
de ocupação durante uma operação de busca em Zuwata, a oeste de Nablus. De
acordo com o Ministério da Saúde palestiniano, Amir Khalifeh, de 27 anos, foi
atingido na cabeça e no peito por balas militares quando atirava pedras para lutar
contra o avanço das tropas. Uma execução pública que goza de impunidade. Por
outro lado, a justiça libertou os dois colonos responsáveis pelo assassinato do
jovem palestiniano Qusai Maatan, de 19 anos, durante uma incursão para ocupação
dos terrenos agrícolas em Burqa, perto de Ramallah, na passada sexta-feira. Os
dois arguidos admitiram ter disparado, «porque tiveram medo do lançamento de
pedras por parte de uma multidão de palestinianos». O juiz pôs em liberdade um
dos dois arguidos e decretou a prisão domiciliária para o segundo, «uma vez que
não se reuniam provas suficientes que justificassem a sua culpabilidade e a sua
detenção na prisão». A incursão dos colonos em Burqa ocorreu com a protecção do
exército, que não interveio para impedir a agressão armada. Só após a morte de
Maatan no hospital é que os assassinos foram detidos, tendo sido posteriormente
libertados com recurso a conjecturas jurídicas. Mais um caso de apartheid colonial.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">10 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Na madrugada de
hoje, mais um jovem palestiniano foi assassinado às mãos de soldados israelitas
em Tulkarem, na Cisjordânia ocupada. O exército de Telavive cercou e invadiu a
cidade com veículos blindados, posicionando atiradores especiais em edifícios
altos. Várias casas e edifícios escolares foram ocupados para serem convertidos
em bases militares. Trata-se de uma operação de busca que se repete quase
diariamente nas cidades da Cisjordânia sob administração da ANP. É a terceira
agressão armada num mês contra uma cidade que resiste à arrogância dos
militares e dos colonos. Há alguns dias, os soldados mataram um jovem de 17
anos com um golpe na cabeça. O Crescente Vermelho denunciou que os soldados
impediram as ambulâncias de socorrer os feridos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">14 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">No campo de
Aqaba Jabr, perto de Ariha (Jericó), soldados do exército de ocupação
assassinaram dois jovens palestinianos esta manhã, terça-feira, com tiros no
peito. A operação relâmpago durou menos de uma hora e encontrou a resistência
de jovens que atiraram pedras aos soldados. O hospital de Jericó informou que
os dois jovens tinham vinte e poucos anos e que morreram pouco depois de darem
entrada. Os soldados retiraram sem prender ninguém. O exército israelita não
forneceu qualquer informação sobre esta operação.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">18 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">As forças de
ocupação israelitas demoliram uma escola primária em Ain Samyia, na
Cisjordânia. Apenas algumas semanas antes do início do ano lectivo, a
destruição da escola, que assegurava o ensino primário aos filhos dos pastores
nómadas da região, teve como objectivo expulsar a população palestiniana destas
terras para dar lugar à colonização judaica. Em 2023, foram demolidas três
escolas nas mesmas condições. De acordo com um relatório da ONU, o plano
israelita ameaça demolir mais 58 escolas primárias.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">21 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">O estado de
alerta das tropas de ocupação israelitas agrava-se em toda a Cisjordânia, com
operações de busca e interrogatórios, para identificar o autor do ataque armado
em Hawwara, que causou a morte de dois colonos numa estação de serviço. Estas
acções repressivas do exército são acompanhadas por ataques armados de colonos
contra aldeias palestinianas, com o objectivo de aterrorizar as populações e de
as forçar a fugir e a abandonar as suas terras agrícolas. O exército israelita
admitiu ter atingido um colono por engano, confundindo-o com um palestiniano. O
incidente teve lugar perto da aldeia de Allubban, entre Nablus e Ramallah,
quando um grupo de colonos atacou agricultores palestinianos atirando pedras, com
soldados encurralados no meio. Os soldados confundiram os colonos com
palestinianos e dispararam. Quando se aperceberam do seu erro, chamaram
imediatamente as ambulâncias da Estrela de David vermelha e o ferido foi
hospitalizado. Um caso exemplar de apartheid colonial.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">22 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">A polícia
israelita, a norte de Jerusalém, divulga um vídeo que mostra a estrela de David
gravada, com um instrumento afiado, no rosto de um detido palestiniano sob
interrogatório. Vinte agentes israelitas estão implicados neste crime. Urwa
Sheikh, do campo de refugiados de Shaafat, foi detido na quarta-feira, 16 de Agosto,
por delitos comuns e, segundo o seu advogado, foi apresentado perante o juiz na
quinta-feira, 17 de Agosto, em condições degradantes, com a Estrela de David tatuada
no lado esquerdo do rosto. Muitos comentadores israelitas recordaram a
obrigação imposta pelos nazis aos judeus alemães de usarem uma Estrela de David
no lado esquerdo do casaco. Um ataque armado palestiniano na província de
Al-Khalil (Hebron) matou uma colona israelita e feriu outro. Os dois atiradores
conseguiram escapar e numerosas forças militares israelitas estão a vasculhar a
zona. A província foi declarada zona militar fechada, com postos de controlo em
todas as estradas principais. 650.000 palestinianos estão impedidos de sair das
cidades e aldeias, que se encontram isoladas e sem possibilidade de
abastecimento alimentar. Este é o segundo ataque armado de palestinianos contra
colonos numa semana. É uma resposta às rondas do exército de ocupação que
invadiu muitas cidades e aldeias palestinianas, matando dezenas de pessoas. A
política agressiva do governo de Netanyahu revelou-se um <i>boomerang.</i> Para
encobrir o fracasso da sua política de segurança na Cisjordânia, o
primeiro-ministro responsabilizou o Irão pela ascensão da resistência armada
palestiniana contra a ocupação. Hoje de madrugada, em Beita, um jovem
palestiniano foi baleado na cabeça quando fugia depois de ter atirado pedras
aos soldados. Está hospitalizado e em estado grave.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">23 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Um jovem de 17
anos foi morto por balas de soldados israelitas em Zababda, a sul de Jenin.
Othman Abu-Kharaj foi baleado na nuca enquanto fugia depois de atirar pedras
aos soldados da ocupação militar. Foi o 53º menor de idade morto pelo exército
israelita na Cisjordânia desde o início do ano. Ontem, 50 palestinianos foram
detidos em várias operações de captura levadas a cabo especialmente na
província de Al-Khalil, onde há dois dias ocorreu um ataque armado palestiniano
que causou a morte de uma mulher israelita e o ferimento de um homem.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">25 de Agosto <o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Campanha de
operações de captura sistemáticas pelo exército israelitas em várias cidades da
Cisjordânia ocupada. Foram detidos quarenta palestinianos apenas no dia de
ontem. Desde os últimos três dias, o número de detidos ascendeu aos 120 e, e
são já 5 mil a contar do início do ano.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">27 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Além de
operações de captura nas cidades e aldeias da Cisjordânia, ontem foram
registadas incursões de colonos armados em áreas agrícolas perto de al-Khalil,
Nablus e Jerusalém Oriental. Os colonos destruíram terras cultivadas e
arrancaram árvores de fruto e oliveiras. Em Tulkarem, 5 palestinianos foram
feridos quando tanques do exército israelita entraram na cidade. No Mar de
Gaza, unidades da marinha israelita impediram os pescadores palestinianos de
trabalhar, atingindo os seus barcos com tiros de metralhadora, forçando-os a
recuar para o porto.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">29 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Um relatório da
HRW denuncia a escalada israelita contra os jovens palestinianos e em
particular contra os menores de idade. No ano de 2022 foi atingido um recorde
face aos últimos 15 anos, e nos primeiros meses de 2023, o número de vítimas
menores de idade superou o número total do ano anterior: 34 menores de idade
palestinianos morreram assassinados por balas militares disparadas por soldados
israelitas. Na sua maioria, os jovens foram atingidos na cabeça e no tórax,
sinal de que os atiradores dispararam para matar. Todos os casos ocorrem
durante a repressão de manifestações e não em confrontos armados. Em 2021, o
exército israelita foi autorizado pelo governo de Tel Aviv a disparar contra manifestantes
em fuga. Impunidade criminosa.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">31 de Agosto<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Quatro jovens
palestinianos foram mortos ontem. Dois pelas mãos de soldados israelitas, em
Nablus e em Jerusalém Oriental; um pelas mãos de agentes da polícia do Presidente
Abbas e o quarto numa explosão acidental de uma bomba artesanal que estava a
fabricar em casa. Em Nablus, um oficial e três soldados israelitas foram
feridos pela detonação de uma bomba que afectou o camião militar em que se
deslocavam. A incursão dos soldados na cidade administrada por autoridades
palestinianas deu-se para garantir que os colonos judeus extremistas pudessem
visitar o denominado “Túmulo de José”. Centenas de jovens impediram o avanço
dos camiões militares atirando pedras e cocktails <i>molotov,</i> mas a força
militar esmagadora prevaleceu. Cerca de cinquenta jovens foram presos. Em
Jerusalém, o assassinato de um jovem foi justificado pelas autoridades da
ocupação israelita com uma tentativa de esfaqueamento num posto de controlo. Em
Tulkarem, as tensões acentuam-se após a morte de um jovem baleado por agentes
da ANP. Como sempre, o governo de Ramallah fala em criar uma comissão de
inquérito (para encobrir o caso). As forças de segurança tinham tentado remover
as barreiras dispostas pela resistência armada, para impedir o avanço dos
soldados israelitas. O colaboracionismo com os ocupantes corre o risco de
quebrar a solidariedade da frente palestiniana. Todos os partidos
palestinianos, excepto a Al-Fatah, condenaram a perigosa evolução do confronto
interno.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">1 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">O exército
israelita reprimiu de forma sanguinária as manifestações contra a colonização
em diversas localidades da Cisjordânia. Os soldados dispararam directamente
contra os activistas “armados” com bandeiras e pedras palestinianas. Um jovem
foi morto em Aqqaba, no norte do território ocupado. Segundo o Ministério da
Saúde da AP, cerca de uma centena de pessoas foram feridas por disparos de
balas militares nas várias localidades onde decorreram as manifestações. Em
Gaza, os militares israelitas dispararam contra a concentração pacífica de
palestinianos que se preparavam para uma marcha com bandeiras, perto do arame
farpado erguido em torno da grande prisão ao ar livre que é a Faixa de Gaza. A
manifestação foi convocada em solidariedade com os lugares islâmicos de
Jerusalém Oriental, ameaçados pela ocupação dos colonos extremistas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">6 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Um rapaz
palestiniano, Mohammed Zbeidat, 17 anos, foi perseguido e morto por soldados
israelitas no norte de Ariha (Jericó). As tropas de ocupação invadiram a aldeia
de Zbeidat e ergueram postos de controlo militar. Num comunicado, o exército
israelita refere uma tentativa de disparo contra os soldados, mas testemunhas
oculares palestinianas que assistiram à perseguição e ao assassinato dizem que
o jovem, que foi deixado a sangrar até à morte sem assistência, não estava
armado. A operação militar israelita de ontem na aldeia de Nur Shams, perto de
Tulkarem, que também culminou no assassinato de um jovem palestiniano, não se
limitou ao patrulhamento e às buscas, mas destruiu infra-estruturas, casas e
espaços públicos, causando enormes danos à população e provocando graves
consequências na sua vida quotidiana. Foram destruídos os principais motores
municipais da rede de água, a central local de distribuição de energia eléctrica
e uma bomba de combustível. Crime de guerra impune.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">11 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Dois palestinianos
gravemente feridos no campo de al-Oroub durante o funeral do menino assassinado
na véspera pelas balas dos soldados israelitas. Os comandos militares não
queriam que o funeral se realizasse em público, mas os familiares e a população
desafiaram a ordem absurda. O exército posicionou atiradores especiais à volta
do cemitério e montou postos de controlo com camiões blindados, disparando
balas militares contra um cortejo fúnebre. Em diversas aldeias e cidades da
Cisjordânia, o exército realizou operações de captura. 5 militantes foram
presos. A oeste de Jenin, um grupo de resistência anunciou que tinha disparado
um rocket caseiro contra um assentamento israelita. Imagens e vídeos do
lançamento foram publicados nas redes sociais, mas os efeitos não são
conhecidos. Segundo a imprensa israelita, caiu em área livre e não causou
danos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">16 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Um
bombardeamento israelita em Gaza durante a noite. A área bombardeada é uma
localidade a norte da Faixa, onde se realizavam manifestações de protesto
próximas da rede de demarcação estabelecida pelo exército ocupante. Segundo
fontes em Gaza, só houve feridos. Nos últimos dias, ocorreram protestos em
massa ao longo da linha de demarcação com queima de pneus e lançamento de
balões incendiários. O exército israelita disparou sobre a multidão. Ontem, 12
pessoas foram feridas, incluindo um jornalista que estava a cobrir a iniciativa
para uma televisão árabe.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">19 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">As tropas de
ocupação israelitas cercam a cidade de Nablus há mais de 24 horas. A operação
de vingança foi motivada por disparos contra um posto de controlo do exército,
feitos a partir de um carro palestiniano em movimento. Em Jerusalém Oriental,
um jovem palestiniano foi atingido por uma bala das forças de ocupação. Foi
hospitalizado sob detenção. Tinha tentado esfaquear um soldado. Também
continuam as demolições de casas palestinas, sob o pretexto da falta de
autorizações. Ontem, três foram demolidas na região do Vale do Jordão. Um
relatório da organização israelita B'Tselem acusa o governo de Tel Aviv de
pretender a expulsão violenta dos palestinianos das suas terras na Cisjordânia
para atribuí-las aos colonos judeus, concedendo liberdade a estes últimos para
agir impunemente com ataques à mão armada contra a comunidade palestiniana,
queima de colheitas, destruição de poços e arrancamento de árvores. Segundo o
relatório, no ano passado, 6 comunidades palestinianas na Cisjordânia foram
forçadas a abandonar as suas terras para escapar à violência dos colonos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">20 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Enésima operação
militar em Jenin. Três palestinianos mortos e 30 feridos. Um grupo de soldados
à paisana entrou no campo de refugiados durante a noite, entre segunda e
terça-feira, para capturar dois combatentes da resistência, mas foram
descobertos e cercados por activistas que lhes atiraram pedras e garrafas de
vidro. O exército enviou tanques em seu auxílio, lançou <i>drones</i> <i>kamikaze</i>
e sobrevoou a área com helicópteros. Para bloquear o avanço das tropas, grupos
de combatentes dispararam rajadas de metralhadoras e lançaram bombas
rudimentares de fabricação artesanal. Um tanque israelita foi incendiado. Ontem
à tarde, as tropas de ocupação retiraram-se. Uma declaração do exército fala na
captura de dois homens da resistência.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">21 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Seis jovens
palestinianos assassinados ontem em ataques israelitas na Cisjordânia e em
Gaza. As tropas de ocupação realizaram ontem duas operações militares no campo
de Aqabat-Jabr, perto de Ariha (Jericó) e Jenin. Na primeira operação, um
menino foi morto a tiro quando atirava pedras aos soldados para tentar bloquear
o seu avanço. Segundo o Ministério da Saúde palestiniano, o jovem foi atingido
na cabeça e chegou ao hospital já morto. Em Jenin, porém, foi uma carnificina:
4 pessoas morreram num único ataque. Nesta operação, o exército de Tel Aviv
recorreu a <i>drones kamikaze</i> de controlo remoto. Segundo testemunhas
locais, os soldados não conseguiram entrar no campo de refugiados de Jenin e o
primeiro grupo de soldados foi cercado por atiradores de pedras. O exército de
ocupação enviou reforços com tanques. A resistência armada destruiu dois
veículos com bombas caseiras e fez incursões com tiros de metralhadora. Os
soldados detiveram duas pessoas, que foram posteriormente libertadas, «devido à
falta de fundamento das suspeitas contra elas», segundo o mesmo comunicado
militar israelita. Tratou-se de uma operação para mostrar os músculos. Em Gaza,
soldados dispararam contra manifestantes palestinianos na linha de demarcação,
matando uma pessoa e ferindo outras 20.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">24 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Na madrugada de
hoje, tropas israelitas assassinaram dois jovens palestinianos no campo de Nour
Shams, a leste de Tulkarem. Os médicos do hospital sublinharam que as duas
vítimas foram atingidas na cabeça, sinal de que o atirador pretendia matar. As
tropas israelitas introduziram <i>bulldozers</i> no campo para destruir a superfície
das estradas e as redes de serviços (electricidade, água e esgotos), para
tornar a vida impossível para os habitantes do campo que não se renderam aos
ditames do colonialismo israelita. O avanço dos soldados enfrentou a
resistência através do lançamento de pedras e garrafas de vidro. O exército de
ocupação israelita anunciou o encerramento hermético da Cisjordânia e de Gaza
durante 48 horas, desde ontem (sábado) até à noite de amanhã (segunda-feira),
por ocasião dos feriados judaicos. Todos os pontos de passagem para o
território israelita foram encerrados ao tráfego de pessoas e mercadorias. Ontem
teve lugar, na cidade de Issawia, a leste de Jerusalém, uma operação militar na
qual três jovens palestinianos foram feridos a tiro. Em Kfar Qaddum, na Cisjordânia,
as tropas israelitas dispersaram a habitual manifestação anticolonial da
população, que se realiza uma vez por semana, contra a apropriação de terras
agrícolas por parte do exército em favor dos colonos judeus.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">27 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Caças israelitas
bombardearam Gaza ontem, na tentativa de dissuadir os palestinianos de se
manifestarem na linha de demarcação. Os principais alvos dos ataques aéreos
foram os postos de observação e monitorização. Não há relato de vítimas. Os
soldados de Tel Aviv dispararam directamente sobre os manifestantes perto da
cerca de separação, ferindo mais de 20 pessoas incluindo jornalistas e pessoas
responsáveis pela assistência médica. Entretanto, mantém-se o encerramento
total das passagens fronteiriças para passagem de pessoas e mercadorias de e
para a Faixa de Gaza. Na Cisjordânia, continua a ofensiva geral do exército
israelita contra a população a sul de Jenin. Tropas blindadas entraram em
Yaabad, a oeste da capital, e em várias outras aldeias. Os raides e os
bloqueios de estradas foram recebidos com pedras atiradas pelos jovens da nova
Intifada.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">29 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">O exército
israelita destruiu a aldeia de Al-Araaqeeb, a norte de Beersheba, no Negev,
pela 222ª vez. É a segunda vez neste mês de Setembro. A aldeia desértica
habitada por pastores palestinianos caiu na mira do governo israelita, que
pretende designar as suas terras para uma expansão da cidade judaica vizinha. A
aldeia foi construída com papelão, plástico e chapas metálicas, e as 22
famílias resistentes nunca abandonaram as suas terras desde que teve início o
seu calvário em 2010. Cada vez que os militares a destroem com um bulldozer, os
habitantes recuperam o material e reconstroem. O mundo está em silêncio sobre
estes crimes do Apartheid.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">30 de Setembro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Um jovem de 18 anos
foi assassinado por soldados israelitas em El-Bira e outro ficou gravemente
ferido. Foi decretado luto geral na cidade. O exército da ocupação disse que os
soldados dispararam sob a suspeita de que os dois jovens tentavam atirar
garrafas a um posto de controlo na entrada de uma colónia hebraica. Condutores
palestinianos que passavam pela área negaram a versão conveniente dos
ocupantes. O corpo da vítima foi apreendido pelo exército e não foi devolvido à
família; uma odiosa prática vingativa e desumana.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">5 de Outubro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Hoje de
madrugada, um raide policial em Tulkarem. Centenas de soldados e agentes
especiais à paisana invadiram o campo de refugiados e devastaram a
infra-estrutura. Um <i>bulldozer</i> israelita investiu contra uma carrinha de
trabalhadores palestinianos, destruindo-a, mas felizmente sem quaisquer
vítimas. Ontem, tropas israelitas entraram em Nablus, com cerca de quarenta
veículos blindados, <i>drones </i>e atiradores especiais, para garantir a
visita dos colonos judeus ao “Túmulo de José”. É um túmulo no interior de uma
mesquita de um homem palestiniano que morreu no século XIX, há dois séculos,
mas os fanáticos religiosos sionistas afirmam que é o do profeta José e
organizam visitas colectivas para reuniões de oração judaicas dentro de um
lugar de culto muçulmano. Depois da intervenção do exército para reprimir os
protestos dos jovens palestinianos, 40 autocarros carregados de fanáticos
entraram na cidade. Em Jerusalém Ocidental, repetiu-se pelo quinto dia
consecutivo a profanação da mesquita de Al-Aqsa. Mil judeus extremistas
entraram no local de culto, protegidos pelas forças de ocupação.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">6 de Outubro<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">É uma guerra não
declarada. Operações militares das forças da ocupação em Tulkarem, Belém,
Hawwara e Nablus. 3 jovens palestinianos foram assassinados e dezenas ficaram
feridos e outros tantos foram detidos. As operações mais sangrentas ocorreram
em Tulkarem, onde as tropas blindadas tentaram invadir o campo de refugiados
desde a madrugada de ontem, mas foram repelidas pela resistência dos jovens que
atiraram pedras e <i>cocktails molotov.</i> Um veículo militar foi incendiado e
houve feridos entre os soldados atacantes. Dois jovens palestinianos foram
baleados pelos soldados e morreram nas ruas da cidade antes da retirada das
tropas. O terceiro jovem foi assassinado em Hawwara, a cidade mártir,
incendiada meses antes pela fúria de colonos assassinos. As operações de busca
também ocorreram em Nablus e Belém. Na prática, o acordo de Oslo está morto
para o governo de Tel Aviv. As cidades sob controlo administrativo e de
segurança da ANP (zona A) também são palco de operações militares diárias. A
estas acções do exército somam-se as agressões armadas dos colonos. No Vale do
Jordão, lavraram terras palestinianas com um <i>bulldozer </i>para tomá-las.
Numa aldeia perto de Salfit, os colonos arrancaram 40 oliveiras. O Observatório
Euro-Mediterrânico, com sede em Genebra, apresentou um relatório sobre a
violência dos colonos contra os palestinianos à Comissão das Nações Unidas para
os Direitos Humanos. O relatório assinala que nos primeiros seis meses deste
ano ocorreram 1.148 agressões por parte dos colonos, todos os ataques ocorreram
sob a protecção do exército e com a cumplicidade do governo e do poder judicial
israelita. O relatório fala claramente do regime do Apartheid e da violação das
leis internacionais nos territórios ocupados.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Franco
“Bifo” Berardi<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Franco
“Bifo” Berardi foi uma figura de destaque no operaísmo italiano, em particular
na sua ala mais criativa e dedicada à experimentação com os média e a produção
cultural. Fundou a Radio Alice, primeira rádio livre em Itália (1976-1978), e a
revista <i>A/traverso (</i>1976-1981), que combinava maoísmo e dadaísmo numa
crítica anti-autoritária. Exilado em Paris, trabalhou com Felix Guattari em
esquizoanálise. Desde os anos 1990 que o seu trabalho tem incidido sobre a
relação entre psicopatologia, tecnologias da informação e capitalismo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Nota
da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Texto
publicado originalmente em <i>Effimera</i> com o título <span style="color: #97694b;"><a href="https://effimera.org/occhio-per-occhio-e-tutto-il-mondo-e-cieco-di-franco-berardi-bifo/"><span style="color: #97694b;">Occhio per occhio e tutto il mondo è cieco</span></a></span>,
posteriormente publicado no <span style="color: #97694b;"><a href="https://lobosuelto.com/ojo-por-ojo-y-el-mundo-esta-ciego-franco-bifo-berardi/"><span style="color: #97694b;">Lobo Suelto!</span></a></span>. A tradução para português
foi realizada por Paulo Ávila.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Turistas
americanos e franceses participam num workshop de “contra-terrorismo”, no
colonato Gush Etzion, na Cisjordânia ocupada. Imagem da série <i>The Sacred
Space Odity</i>, da fotógrafa palestiniana Tanya Habjouqa.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«<i>Olho
por olho e o mundo está cego</i>» • Franco “Bifo” Berardi<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 16.10.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2023</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-79235750305952313972023-10-12T02:00:00.003-07:002023-10-12T02:56:57.367-07:00O Estado Colonial • Pedro Levi Bismarck<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiRMTcII7khsu_cvZ_qiBoWnI0yvyH2C3v5jNqQIdFhTFxHzwcMIapdHKiWpSZC-kDp7pijWLLwo9qeLjiIpBWDJ2o4S2hTIhZIMhyphenhyphenGhwQGskdRJQsTVSc-6VAKEF5QETsKLhn5M8J2o85y1ZCvA1tMK_OWrryReFutIwxUZv8UfVoKPQw2wtfkNy35DNgI/s787/Screen-Shot-2019-09-09-at-12.56.35-PM_7f79c9961bc25cd6c87b496101c37916_2.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="639" data-original-width="787" height="371" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiRMTcII7khsu_cvZ_qiBoWnI0yvyH2C3v5jNqQIdFhTFxHzwcMIapdHKiWpSZC-kDp7pijWLLwo9qeLjiIpBWDJ2o4S2hTIhZIMhyphenhyphenGhwQGskdRJQsTVSc-6VAKEF5QETsKLhn5M8J2o85y1ZCvA1tMK_OWrryReFutIwxUZv8UfVoKPQw2wtfkNy35DNgI/w457-h371/Screen-Shot-2019-09-09-at-12.56.35-PM_7f79c9961bc25cd6c87b496101c37916_2.jpg" width="457" /></a></div><p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Certamente que
daqui a uns anos a Faixa de Gaza terá o seu memorial, venderá os seus <i>souvenirs</i>
e aprenderemos nos livros de história aquele que foi o destino trágico dos palestinianos.
Alguém chegará a perguntar mesmo: <i>«Como foi possível?»</i> E será dito que <i>aquele
que esquece a sua história, está condenado a repeti-la.</i> Haverá filmes,
colóquios, documentários. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Em 2023, no
entanto, a cegueira ideológica e política dos governos ocidentais está bem
patente na proposta da Comissão Europeia em acabar imediatamente com todo o
financiamento aos programas de apoio à Palestina </span><span style="font-family: Symbol; font-size: 13pt; line-height: 107%; mso-ascii-font-family: Alegreya; mso-char-type: symbol; mso-hansi-font-family: Alegreya; mso-symbol-font-family: Symbol;"><span style="mso-char-type: symbol; mso-symbol-font-family: Symbol;">-</span></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"> note-se: apoios
alimentares, de infra-estruturas, de salários. Nenhuma proposta de paz, de
negociação, de suspensão da escalada do conflito. Bem pelo contrário, os
Estados Unidos não só enviaram mais armamento para Israel, como enviaram,
inclusivamente, o seu maior navio de guerra. Por outro lado, a dualidade de
critérios na comunicação social é despudorada: num boletim informativo da rádio
podíamos ouvir, logo na sua abertura, uma psicóloga que notava com desânimo o
estado de trauma dos israelitas perante a surpresa do ataque do Hamas e dos
seus «assassinatos», tratando na notícia seguinte a morte de palestinianos — crianças,
incluindo — como simples baixas, inevitabilidades do ataque que estes
«terroristas» tinham lançando contra Israel, quando tudo estava bem e estes
viviam em paz o sonho da Terra Prometida.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Não. Não vale a
pena referir quantos palestinianos foram mortos pelas forças israelitas desde o
início do ano até ao dia 7 de Outubro — mais de 250, 47 eram crianças. Não, não
vale a pena detalhar as condições de vida e o regime de<i> apartheid</i> em que
vive a população da Faixa de Gaza: agora com bloqueio total a todos aqueles
elementos básicos da sobrevivência e da dignidade humana — água, comida, gás e luz.
Não, não vale a pena continuar a enumerar a lista de tácticas militares
dissimuladas que Israel utiliza para minar as condições de vida dos
palestinianos, como no caso do herbicida lançado na fronteira com Gaza para
destruir as colheitas palestinianas, como demonstrou explicitamente o <span style="color: #97694b;"><a href="https://forensic-architecture.org/investigation/herbicidal-warfare-in-gaza"><span style="color: #97694b;">Forensic Architecture</span></a></span>, que desde há
muito se dedica a denunciar as estratégias e crimes de Israel. E não,
certamente que não vale a pena voltar a olhar para a história para compreender
que, desde 1948, desde a <i>Nakba </i>[<i>Catástrofe</i>], que o Estado de
Israel assenta num programa contínuo e violento de expropriação e expulsão dos
Palestinianos, reduzindo-os à condição de prisioneiros de Estado. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">A Faixa de Gaza
não é apenas o território mais densamente povoado do mundo — para onde têm sido
empurrados e confinados os palestinianos nas últimas décadas — é a maior prisão
a céu aberto do mundo: o lugar onde todos os valores básicos da dignidade
humana e da existência política são diariamente postos em causa por um regime
policial e segregacionista. No entanto, todos esses valores, que foram, aliás,
elevados à condição de epítetos morais do Ocidente, com o início da Guerra na
Ucrânia, parecem ter deixado de fazer parte da retórica do <i>comentariado</i>
nacional e internacional na sua «análise» da situação em Israel.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Nunca como agora
se elevou tão alto o cinismo ideológico do Ocidente: como se o
Hamas tivesse agora e de repente iniciado um ciclo de violência, como se essa
violência já não existisse, como se as Forças Israelitas não fossem, elas
próprias, responsáveis por todo um ciclo de violência interminável, violência
que constitui, aliás, crimes de guerra — como os próprios israelitas chegam a admitir.
A análise terrorismo <i>versus</i> Estado não é apenas uma simplificação
demagógica, o que ela pretende é absolver e continuar a absolver Israel dos
crimes que cometeu e que continuará a cometer contra os palestinianos que estão
hoje efectivamente mais isolados do que nunca.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Israel é um
Estado colonial que assenta num racismo de Estado, um racismo que incorporou na
figura do palestiniano o seu inimigo único e total. A fundação do Estado de
Israel assenta numa profunda lógica de sobrevivência cujo destino não poderá
ser outro que o aniquilamento do seu inimigo. Uma das mais terríveis ironias da
história: aquele povo que foi nas mãos dos Nazis sujeito às piores atrocidades
imagináveis, objecto de um genocídio calculado e implacável, em nome de uma
superioridade moral e racial, em nome de um <i>lebensraum,</i> de um <i>espaço
vital</i> de sobrevivência, tomou para si a figura, os métodos e a lógica, do
seu próprio executor. Israel fez da Faixa de Gaza um «campo de concentração»,
tratando os palestinianos com o mesmo vocabulário que os Nazis usavam para
descrever os judeus nos anos trinta e quarenta. E se dúvidas há, basta ver as
declarações de Yoav Gallant, Ministro da Defesa de Israel, que ainda há poucos
dias não se coibia de dizer: «<i>Estamos a combater contra animais</i>». Essa <i>sub-humanização</i>
do palestiniano não é apenas fruto da retórica, é a operação discursiva que
legitima o emprego de toda a violência e que confirma todo o racismo de Estado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">O Estado de
Israel realiza assim aquela que era uma das utopias do nazismo: a unidade plena
de um Estado soberano e de um Estado racial. Mas ele é, em si mesmo, a figura
extrema da realização do Estado Moderno e da própria política moderna no seu
destino acelerado em direcção à biopolítica e à tanatopolítica: a gestão da
vida que é, e pode ser em qualquer momento, a gestão da própria morte; a consumação
extrema de uma forma política onde os fins acabam sempre por justificar os
meios.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">É por isso que
os acontecimentos do dia 7 de Outubro devem ser lidos à luz de um outro factor.
Se Israel é um Estado colonial não é apenas porque este vive e sobrevive a
partir da existência de uma ameaça, mas porque este já só pode viver e
sobreviver com essa ameaça, com esse inimigo, com o <i>espectro </i>da sua presença.
Aquilo que define a essência do Estado soberano israelita é o seu Outro
absoluto: o palestiniano. Toda a política israelita revolve em torno da
afirmação e da negação dessa figura, dessa mesma entidade que só pode <i>existir
não existindo,</i> mas de cuja existência depende a própria identidade lógica
do Estado de Israel, enquanto máquina de guerra infinita e perpétua.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">A confirmação da
extrema-direita na política israelita é apenas a afirmação dessa lógica levada
ao seu mais alto nível: nunca como antes a limpeza étnica dos palestinianos foi
afirmada de forma tão categórica e, no entanto, é a própria existência dos
palestinianos que se apresenta instrumentalmente necessária para a
sobrevivência do Estado de Israel na época da sua extrema-direita. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Por tudo isto, um
dos mais interessantes testemunhos que percorrem a vertigem das redes sociais é
aquele de um rabi para quem é essencial distinguir entre judeus e sionistas, porque
não se trata apenas da <i>Torah</i> proibir qualquer apropriação de terra, de
matar e roubar em nome dessa apropriação, mas porque é a própria ideia de uma
soberania política que é contrária aos seus princípios, é a própria ideia de
Estado que é contrária aos princípios do judaísmo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">E, no entanto,
como dizia antes, é o próprio Estado de Israel que se realiza enquanto
consumação plena do destino histórico dos pesadelos forjados pelo pensamento político
Ocidental: a unidade total entre Estado, Religião e Raça, onde toda a violência
é legitimada enquanto violência única e total sobre um território, sobre um
sujeito, sobre um povo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;">Talvez seja essa
a maior e a mais difícil de todas as ironias. Se, para Edmund Burke, «um povo
que não conhece a sua História está condenado a repeti-la», o que se passa
neste caso é precisamente o contrário: <i>é porque conhece a sua História que
Israel está condenado a repeti-la.</i><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 107%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Editor
do Jornal Punkto, arquitecto, crítico e ensaísta, investigador no CEAU (Centro
de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto).<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem mostrando a concentração de herbicida na fronteira Israel-Gaza. A
imagem pertence ao <i>Forensic Architecture</i>, coordenado por Eyal Weissman, que
denuncia através da produção de prova concreta e através de uma investigação
cuidada e recorrendo a múltiplas tecnologias e <i>softwares</i> as tácticas de
guerra usadas de forma dissimulada pelo exército de Israel. Neste caso
específico, <span style="color: #97694b;"><a href="https://forensic-architecture.org/investigation/herbicidal-warfare-in-gaza"><span style="color: #97694b;">herbicida é utilizado para destruir as colheitas dos
palestinianos</span></a></span><span style="color: black; mso-themecolor: text1;">.</span><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«O
Estado colonial» • Pedro Levi Bismarck<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 12.10.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2023</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-68522608667863347152023-10-11T01:33:00.000-07:002024-01-02T03:14:57.529-08:00Sublevação na Palestina • Tariq Ali<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9KRFICJK4d18pcakSfPuXMxGcQ5aH0cLs0joWF1yC_MNn3aeOo2u4cFESFz2PpYyWeKg9oy7lGvSUREJFZ1h0BdqtLPB3gWQNXnJlb50gF9Fb2YluhLKoMtdsjHx77XQy2H1hlrpYFLlch_oFNEDS2EHJByxRDPmvL2IYoqw1u67Ii2adeTqHZ0RZJLkt/s1500/Tria%CC%81ngulo%20de%20fuego_12.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1000" data-original-width="1500" height="265" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9KRFICJK4d18pcakSfPuXMxGcQ5aH0cLs0joWF1yC_MNn3aeOo2u4cFESFz2PpYyWeKg9oy7lGvSUREJFZ1h0BdqtLPB3gWQNXnJlb50gF9Fb2YluhLKoMtdsjHx77XQy2H1hlrpYFLlch_oFNEDS2EHJByxRDPmvL2IYoqw1u67Ii2adeTqHZ0RZJLkt/w398-h265/Tria%CC%81ngulo%20de%20fuego_12.jpg" width="398" /></a></div><p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
eclosão de uma nova intifada na Palestina em Dezembro de 1987, sacudiu as
fundações tanto de Israel como das elites do mundo árabe. Poucas semanas
depois, o grande poeta sírio Nizar Qabbani escrevia a <i>Trilogia dos Filhos das
Pedras,</i> onde denunciava a velha geração de dirigentes palestinianos, hoje
representada pela corrupta e colaboracionista (Não) Autoridade Palestiniana. Foi
cantada e recitada em inumeráveis cafés palestinianos:<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Os
filhos das pedras<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Desordenaram
os nossos papeis<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Derramaram
tinta sobre as nossas roupas<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Gozaram
com a banalidade dos textos antigos…<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Oh,
filhos de Gaza<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
façam caso dos nossos meios de comunicação<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
nos escutem<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Somos
o povo do cálculo frio<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Da
soma e da subtracção<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Façam
as vossas guerras e deixem-nos em paz<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Estamos
mortos e sem túmulo<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Órfãos
sem olhos.<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Filhos
de Gaza<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
prestem atenção aos nossos escritos<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
sejam como nós.<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Nós
somos os vossos ídolos<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
nos adorem.<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Oh,
loucos de gaza,<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Mil
saudações aos loucos<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
era da razão política há muito que se foi<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Agora,
ensinem-nos a loucura….<o:p></o:p></span></i></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Desde
então, o povo palestiniano testemunhou todos os meios possíveis para conseguir
algum tipo de autodeterminação significativa. ‘Renunciem à violência’,
disseram. Fizeram-no, tirando uma ou outra represália depois de tantas
atrocidades israelitas. Entre os palestinianos radicados no seu país, assim
como aqueles espalhados na diáspora, verificou-se um apoio massivo ao movimento
<i>Boycott, Divestement and Sanctions </i>[BDS]<i>:</i> um movimento pacífico <i>par
excellence</i> que começou a ganhar força em todo o mundo, entre artistas, académicos,
sindicatos e, ocasionalmente, entre alguns governos. Os Estados Unidos e a sua
família da NATO responderam procurando criminalizar o BDS, alegando, com a
ajuda de grupos de pressão pró-sionistas, que boicotar Israel era «antisemita»,
uma estratégia que se demonstrou muito eficaz. No Reino Unido, o Partido
Trabalhista de Keir Starmer proibiu qualquer menção ao «apartheid israelita» na
sua próxima conferência nacional. A Esquerda Trabalhista, com medo de ser
expulsa, tem guardado silêncio sobre esta questão. Uma situação lamentável.
Enquanto isso, a maioria dos Estados árabes uniram-se à Turquia e ao Egipto
capitulando perante Washington. A Arábia Saudita encontra-se actualmente em
negociações, com mediação da Casa Branca, para reconhecer oficialmente Israel.
O isolamento internacional do povo palestiniano parece que vai aumentar. A
resistência pacífica não chegou a lado nenhum.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Ao
longo desse período, as Forças de Defesa de Israel (FDI) atacaram e
assassinaram a população palestiniana a seu bel-prazer, enquanto os sucessivos
governos israelitas se esforçavam por sabotar qualquer esperança de criação de
um Estado palestiniano. Recentemente, um grupo de ex-generais das FDI e agentes
da Mossad admitiram que aquilo que se está a fazer na Palestina constitui crimes
de guerra. Mas eles só encontraram a coragem para o dizer já reformados.
Enquanto estiveram no activo apoiaram plenamente os colonos fascistas activos
nos territórios ocupados, permanecendo impassíveis enquanto estes se apressavam
a queimar casas, destruir culturas de oliveiras, atirar cimento para os poços,
atacar os palestinianos e expulsá-los das suas casas enquanto cantavam «morte
aos árabes». O mesmo fizeram os líderes ocidentais, que deixaram que tudo isto
acontecesse sem que dissessem uma única palavra. Como diria Nizzar Qabbani, a
era da razão política há muito que se foi.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Então,
um dia, os dirigentes eleitos de Gaza começam a contra-atacar. Saem da sua
prisão ao ar livre e cruzam a fronteira sul de Israel, atacando objectivos
militares e os colonatos. De repente, os palestinianos encabeçam os títulos
internacionais. Os jornalistas ocidentais surpreendem-se e mostram-se
horrorizados perante os seus actos de resistência. Mas, porque é que estes não
haveriam de o fazer? Os palestinianos sabem melhor do que ninguém que o governo
de extrema-direita israelita iria retaliar ferozmente, apoiado pelos Estados
Unidos e por uma Europa fraca. Mas, ainda assim, os palestinianos e
palestinianas não estão dispostos a ficar de braços cruzados enquanto Netanyahu
e os criminosos do seu gabinete expulsam ou matam gradualmente a maioria do seu
povo. Eles sabem que os elementos fascistas do Estado israelita não têm nem vão
ter nenhum pudor em sancionar o assassinato em massa da população árabe. E eles
sabem que é preciso resistir a todo o custo. No início deste ano, os
palestinianos observaram as manifestações de Tel Aviv e compreenderam que aqueles
que marchavam para «defender os seus direitos civis», não estavam interessados
nos direitos dos seus vizinhos ocupados. Decidiram então tomarem o assunto nas
suas próprias mãos. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Têm
os palestinianos o direito a resistir à agressão incessante a que estão
submetidos? Absolutamente. Não existe nenhuma equivalência moral, política ou
militar, entre ambas as partes. Israel é um Estado nuclear, armado até aos
dentes pelos Estados Unidos. A sua existência não está ameaçada. São os
palestinianos, as suas terras, as suas vidas, quem estão ameaçados. A
civilização ocidental parece disposta a permanecer impassível enquanto são
exterminados. Eles, por sua vez, levantam-se contra os colonizadores.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Tariq
Ali<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Escritor,
jornalista, historiador, realizador e activista britânico, de origem
paquistanesa. Escreve periodicamente para o jornal britânico <i>The Guardian</i>,
para a revista <i>New Left Review</i>, <i>CounterPunch,</i> <i>London Review of
Books</i> e <i>SinPermiso.</i><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Nota
da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Texto
originalmente publicado na </span><a href="https://newleftreview.org/sidecar/posts/uprising-in-palestine"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">New Left Review</span></a><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"> no dia 7 de Outubro e publicado
em espanhol no diário </span><a href="https://www.elsaltodiario.com/sidecar/levantamiento-palestina"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">El Salto</span></a><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">. </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">A tradução para português foi
realizada a partir das duas versões. <o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">A mãe de
Ezzedine Kanaan, de 21 anos, abraça o corpo do seu filho que morreu com um
disparo na cabeça durante a incursão de exército israelita no campo de
refugiados de Jenin. Fotografia de Bruno Thevenin, via </span><a href="https://www.elsaltodiario.com/palestina/triangulo-fuego-palestina-nablus"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">El Salto</span></a><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«Sublevação
na Palestina» • Tariq Ali<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 11.10.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#40 • Outono 2023</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-36346950769036532602023-09-21T13:06:00.002-07:002023-09-28T09:20:39.762-07:00A era da desordem<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 35.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 35.45pt 6pt 2cm; tab-stops: 404.0pt;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: 0.1pt; mso-bidi-font-family: Helvetica; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgRV7r7QDFDhV2gw_c7RNWmVt-tFWz9BsoK4_DCnif_Cum9tE8IkkGupUtHwG0BT3BFgrpqYy_2LdOIgHaY8na786V7NELn25Lms_hTAKBWSmRfVb-bJkEi6WrYSjZg9RpZWnH1i-82Oij3HJv52RQl-afxdsrKmPO3JgRlSivuXJVl3fSeg18IoWyIGdoG/s2867/IMG_2718.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="2867" data-original-width="2146" height="630" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgRV7r7QDFDhV2gw_c7RNWmVt-tFWz9BsoK4_DCnif_Cum9tE8IkkGupUtHwG0BT3BFgrpqYy_2LdOIgHaY8na786V7NELn25Lms_hTAKBWSmRfVb-bJkEi6WrYSjZg9RpZWnH1i-82Oij3HJv52RQl-afxdsrKmPO3JgRlSivuXJVl3fSeg18IoWyIGdoG/w474-h630/IMG_2718.jpg" width="474" /></a></div><o:p><br /></o:p><p></p><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 35.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 35.45pt 6pt 2cm; tab-stops: 404.0pt;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: 0.1pt; mso-bidi-font-family: Helvetica; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="background: rgb(13, 13, 13); line-height: normal; margin-bottom: 12.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 12pt 2cm; mso-background-themecolor: text1; mso-background-themetint: 242; tab-stops: 92.15pt 99.25pt;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 8pt; mso-themecolor: text1;">++<span style="letter-spacing: 0.5pt; mso-bidi-font-weight: bold; text-transform: uppercase;"><o:p></o:p></span></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm; tab-stops: 404.0pt; text-align: right;"><a name="_Hlk51669469"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 13pt;">#39 </span></b></a><span style="mso-bookmark: _Hlk51669469;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; mso-themecolor: text1;">•
Verão 2023 • A era da desordem<o:p></o:p></span></b></span></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk51669469;"></span>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 0cm 0cm;"><a name="_Hlk90992586"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;"><o:p> </o:p></span></b></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk90992586;"></span>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 56.65pt 0cm 0cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;">editorial<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">A edição de Verão traz uma novidade substancial: uma versão impressa. Mas mais do que uma publicação autónoma e completa,
trata-se sobretudo de um complemento, uma <i>adenda</i>, como aquelas que se
podem encontrar relativamente esquecidas num qualquer livro. Há, de facto,
sempre algo que fica por dizer. Por isso, o formato escolhido é aquele da <i>folha
de sala</i>, género sem dúvida estranho e, ainda, desprezado, mas que permite
de uma forma simples manter uma relação de proximidade com o <i>site</i> e com
os textos publicados ao longo dos meses antecedentes: uma espécie de animal de
companhia. É um modo de domesticar um arquivo de textos que se tornou, ao fim
de dez anos de actividade, monstruoso, mas também tão volátil como
fantasmagórico. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">A virtude do <i>agora-mesmo</i> do digital, isto
é, a sua capacidade de estar presente no presente e que permite publicar textos
numa relação imediata com um determinado acontecimento, tem vindo a significar,
por sua vez, um <i>desmemoriamento</i> progressivo, uma espécie de
homogeneização algorítmica do tempo e da história. Este número é, então, uma
tentativa de fuga relativamente a um destino digital-imaterial do humano que a
todos os níveis parece inevitável. E, neste sentido: fuga, absoluta, do reino
glorioso do algoritmo, mas mais, ainda, ao modo de ser do humano em algoritmo; enfim,
fuga à própria desqualificação do tempo de leitura, que se torna evidente no
ciclo acelerado das redes sociais. Antecipando o colapso ou catástrofe que vem,
talvez seja, afinal de contas, um modo de guardar a possibilidade de uma
memória, desde logo, a memória do próprio acto de leitura em papel.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">Esta primeira edição é, portanto, experimental,
serve para ensaiar as possibilidades deste formato. Por isso, apenas quatro
textos foram publicados em papel, tendo sido escolhidos, sobretudo, aqueles que
se posicionam dentro da constelação temática desta edição dedicada às lutas e
aos movimentos ecologistas. Procurou-se um formato que não implicasse um uso
excessivo de papel e de recursos. Ora, talvez seja um paradoxo voltar ao papel
num número que lança o seu olhar sobre a exploração extractivista da Terra pelo
Capital. Mas neste gesto frágil — que é o desta publicação — há algo mais que
se imprime: uma vontade de dar um outro uso ao tempo, de parar, de suspender o
passo inabitável da história. Como escreve Walter Benjamin, nas suas <i>Anotações
e Materiais </i>às «Passagens de Paris»: «<i>Que as coisas “continuem como
estão”, é isso a catástrofe</i>».<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">A versão impressa estará para já disponível na </span><i><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"><a href="https://termita.pt/"><span style="color: #97694b;">Livraria Térmita</span></a></span></i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">, no Porto, pela
módica quantia de 2€ — valor que servirá igualmente como contributo para a continuação
da actividade do Punkto. Em breve, haverá mais novidades sobre a sua
disponibilidade noutros locais. De resto, o Punkto continua a poder ser consultado
e lido no seu endereço habitual: <i>www.revistapunkto.com</i><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 56.65pt 0cm 0cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 3.0pt; margin: 3pt 56.65pt 0cm 0cm;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Helvetica;">artigos<o:p></o:p></span></b></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm; text-align: justify;"><a name="_Hlk59291260"></a><a name="_Hlk98685053"></a><a name="_Hlk130226505"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></a><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/09/a-dissolucao-dos-soulevements-de-la.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">A
dissolução dos Soulèvements de la Terre</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Christophe
Laurens<o:p></o:p></span></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/07/futuros-outros-godofredo-enes-pereira.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Futuros-outros</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> •<o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: #7f7f7f; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; mso-themetint: 128;">Godofredo
Enes Pereira<o:p></o:p></span></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/07/ecoterroristas-sao-os-outros-antonio.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">“Ecoterroristas”
são os outros</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: #7f7f7f; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; mso-themetint: 128;">António
Guerreiro</span></span></span></span><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"><o:p></o:p></span></i></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><a name="_Hlk107142731"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></a></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/07/cultura-de-direita-pedro-levi-bismarck.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Cultura de direita</span></b></span></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></span></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 6pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"><span style="color: #7f7f7f; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; mso-themetint: 128;">Pedro Levi Bismarck<o:p></o:p></span></span></span></span></span></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk107142731;"></span>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;">• </span></b></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/07/dizem-me-que-sou-estupido-porque-peguei.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Dizem-me
que sou estúpido porque peguei fogo à mediateca» — <o:p></o:p></span></b></span></span></span></a></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 1.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 1pt 2cm;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"></span></span></span><a href="https://www.revistapunkto.com/2023/07/dizem-me-que-sou-estupido-porque-peguei.html"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1; text-decoration: none; text-underline: none;">Uma
resposta a Carmo Afonso</span></b></span></span></span></a><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: text1;"> • <o:p></o:p></span></b></span></span></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 2.0cm; margin-right: 2.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm 2cm 6pt;"><span style="mso-bookmark: _Hlk130226505;"><span style="mso-bookmark: _Hlk98685053;"><span style="mso-bookmark: _Hlk59291260;"><span style="color: grey; font-family: Alegreya; font-size: 12pt; letter-spacing: -0.2pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-bidi-font-weight: bold; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-themecolor: background1; mso-themeshade: 128;">Luhuna
Carvalho</span></span></span></span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-32968740814455872292023-09-14T11:23:00.006-07:002023-09-14T11:23:57.214-07:00 A dissolução dos Soulèvements de la Terre • Christophe Laurens<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjJ0Z02jwzfZ3lgjjAubVLp25pQi3mRZ87Irq4uNOuNsZefj4OxSODkfpEQwXGHMYcTFiauw_MIPOnRcwruQ0qB1CgELbxmFF_xK6CD3yNzEky8UeUVy1FDO6KEGFuq1sHgp14vFEofhQu2ecsYyMHk1h6cY6sykLbSQtc1edsXgeNQs5K2IvsEqEvGUeWw/s1500/ba3b8d67-d0be-4140-a6b8-ee91c13c6593.jpeg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1000" data-original-width="1500" height="338" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjJ0Z02jwzfZ3lgjjAubVLp25pQi3mRZ87Irq4uNOuNsZefj4OxSODkfpEQwXGHMYcTFiauw_MIPOnRcwruQ0qB1CgELbxmFF_xK6CD3yNzEky8UeUVy1FDO6KEGFuq1sHgp14vFEofhQu2ecsYyMHk1h6cY6sykLbSQtc1edsXgeNQs5K2IvsEqEvGUeWw/w507-h338/ba3b8d67-d0be-4140-a6b8-ee91c13c6593.jpeg" width="507" /></a></div><p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Aí
está. Aquilo a que poderíamos chamar o momento Darmanin, em França, é a
continuação lógica do momento Trump, nos Estados Unidos, e do momento
Bolsonaro, no Brasil. São as primeiras ocorrências de uma longa sequência ainda
por vir em que os políticos e os industriais já não se contentam em fazer a
escolha cínica de uma economia capitalista injusta contra a da economia
ecológica e social necessária; encurralados pela situação, um após o outro
declaram abertamente guerra a todos os movimentos ambientais que, de uma forma
ou de outra, estão a tentar preservar uma Terra habitável para todas e para
todos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Acabado
de sair da pandemia de Covid-19 e menos de cinco anos após os primeiros sinais
tangíveis e recorrentes do aquecimento global na Europa, o Governo francês deu
um passo decisivo com o seu projecto de dissolução do movimento <i>Soulèvements
de la Terre.</i> </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[1]</span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;"> </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Com esta
decisão, junta-se explicitamente à linha da frente da guerra mundial aberta
contra os movimentos ecologistas pelas multinacionais, pelos bancos e pelos
políticos da maioria dos países industrializados. Esta decisão, que parece
precipitada e tomada sob pressão dessas lutas ecologistas, de facto,
inscreve-se numa agenda muito mais vasta e cada vez mais clara dos “decisores”
e “decisoras” do século XXI.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 14.0pt; margin-left: 9.0cm; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 14pt 9cm; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">1. [N.T.] Os <i><a href="https://lessoulevementsdelaterre.org/pt-pt."><span style="color: #97694b;">Soulèvements
de la Terre</span></a></i> [<i>Sublevações da Terra</i>] é um movimento
ecologista iniciado em 2021 por membros da ZAD [<i>Zone-À-Defendre</i>] de <i>Notre-Dames-des-Landes</i>,
França. Em Junho de 2023, o Ministro do Interior francês decretou a dissolução
forçada do movimento, ao qual<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>o
movimento respondeu afirmando: “Erguermo-nos a partir de cada lugar, cada uma à
sua maneira. O movimento dos <i>Soulèvements de la Terre</i> não pode ser
dissolvido porque é múltiplo e vivo. Não se pode dissolver um movimento, não se
pode dissolver uma revolta. Apelamos a todas e a todos para que se juntem a nós
nesta tentativa de asfixiar o movimento. Nós somos, todas e todos juntos, os <i>Soulèvements
de la Terre</i>”. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">“A
era da desordem está provavelmente diante de nós…”, escreveu o <i>Deutsche Bank</i>
num relatório privado de Setembro de 2020 </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[2] </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">sobre a
rentabilidade de activos a longo prazo, realizado para orientar os
investimentos dos seus principais clientes. E prossegue: “Nos próximos anos,
olhar para o futuro prolongando as curvas do passado poderá ser o seu maior
erro”. Fomos avisados e, sem surpresa, a chave para essas convulsões esperadas
reside nas consequências ecológicas, sociais e políticas da destruição
acelerada da vida na Terra em curso </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[3]</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">, a que chamamos
agora <i>aquecimento global.</i> O último capítulo deste estudo pode ser lido
como uma boa antecipação, mas também como uma boa explicação, da situação que
estamos actualmente a viver com os <i>Soulèvements de la Terre</i>. Fala da
preocupação crescente dos investidores com as expectativas políticas e
existenciais dos jovens do futuro. “À medida que esta geração jovem pró-clima
cresce naturalmente, (…) a pressão para agir aumentará e as implicações para a
economia global poderão ser significativas.” <o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 9.0cm; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 6pt 9cm; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">2. Publicado pela revista
<i><a href="https://d.docs.live.net/14f384b0134296f5/Documentos/:%20%20https:/www.epge.fr/wp-content/uploads/2020/09/The-age-of-disorder.pdf"><span style="color: #97694b;">Terrestres,</span></a></i> a 17 de Maio de 2021.<o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 14.0pt; margin-left: 10.0cm; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 14pt 10cm; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">3. Cf. Baptiste
Lanaspeze (2022). <i>Nature.</i> Ed. Anamosa.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas
aqui está o ponto crucial da análise dos investigadores do <i>Deutsche Bank </i>sobre
o conflito entre economia e ecologia. “Quando a Covid-19 se espalhou pelo
mundo, alguns meses depois muitos esperavam que os ecologistas fossem relegados
para a sombra. (…). Não foi o caso. Na verdade, muitos ecologistas consideram o
vírus não como um obstáculo à realização dos seus objectivos, mas pelo
contrário como a sua maior oportunidade. Este abriu caminho a anos de conflito
agressivo entre quem coloca a economia em primeiro lugar e quem luta pelo
ambiente. Este conflito irá alastrar-se pelos círculos políticos e estender-se
à sociedade em geral.”<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">E
finalmente, na última página deste relatório: “(…) A principal conclusão a
retirar deste debate deveria já ser óbvia. Ambos os lados estão a tornar-se
cada vez mais inflexíveis na sua posição e ambos têm inúmeras provas e a lógica
do seu lado. No fim de contas, o que está em causa é a ideologia – e essa é uma
divisão que pode ser impossível de ultrapassar. Por esse motivo, temos de estar
preparados”.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Tudo
isto tem o mérito de ser claro e de nos explicar o que os governos, os bancos e
as grandes empresas estão a preparar para as próximas décadas: uma guerra
aberta contra os jovens e todos os movimentos ecologistas, a fim de proteger a
rentabilidade dos seus activos, sobre os quais compreendem agora com clareza
que a ideia de longo prazo é mais do que incerta.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Por
seu lado, o que os movimentos de ecologia política de todo o mundo
compreenderam há várias décadas foi precisamente que o rendimento a longo prazo
de toda a actividade humana e de toda a biosfera estava a ser destruído pela
prioridade, constante e cegamente renovada, de desenvolver o sistema colonial
capitalista. Agora estamos a entrar na tempestade e as posições estão a tomar
forma. Séculos de dominação foram apanhados por secas, ondas de calor e
inundações, séculos em que os blocos de gelo derretem e que, em breve, serão
varridos pelos ciclones da revolta.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Das
especulações metafísicas às fundações, das fundações precárias aos andaimes e
dos andaimes às escadas rolantes, o grande bazar ecocida da modernidade subiu
muito depressa, e subiu muito alto desde a escravatura e a utilização massiva
de combustíveis fósseis (828m para a torre Burj Khalifa, coração e alma da
cidade do Dubai, oito mil milhões de habitantes na Terra e 415ppm de CO2 na
nossa atmosfera comum). Em menos de dois séculos, “nós, os ocidentais”,
urbanizámos esta Terra sem qualquer limite, fazendo da expansão das cidades e
da urbanidade globalizada dos modos de vida que a acompanha o cerne de um
crescimento económico que despreza a autonomia rural dos nossos antepassados;
porque o rural é o rústico!<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas
lá está, depois de alguns séculos dedicados à construção de uma civilização de
alta potência e à destruição de todas as formas de subsistência ligadas ao seu
meio, ou seja, de todas as economias locais verdadeiramente sustentáveis, agora
é preciso voltar a descer. Os escravos abandonaram a plantação e a extracção de
combustíveis fósseis está a tornar-se cada vez mais cara. Apesar das numerosas
premonições e avisos que nos foram dirigidos desde o século XIX, apesar de
Charles Baudelaire, Walter Benjamin, Hannah Arendt, Aldo Léopold, Rachel
Carson, Édouard Glissant, Vandana Shiva e mil outros... (quantas mais
inteligências brilhantes e singulares precisamos de citar para sermos ouvidos
por estes decisores que não lêem?), apesar do número crescente de avisos,
nenhum foi ouvido e o grande parque temático da modernidade está agora em
falência.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Com
os efeitos concretos do aquecimento global a começarem a fazer-se sentir mesmo
nos países com ar condicionado, toda a gente sabe, tal como o <i>Deutsche Bank,</i>
que a era da desordem está provavelmente a chegar. Inevitavelmente, alguma
coisa vai ter de mudar e, para usar as palavras de James Baldwin, estamos
envolvidos numa “vingança histórica e cósmica, baseada na lei que reconhecemos
quando dizemos: ‘Tudo o que sobe tem de descer’. (…). E aqui estamos nós, a
meio da curva, presos no escorrega mais conspícuo, mais dispendioso e mais
impraticável que o mundo alguma vez conheceu.” </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt; line-height: 150%;">[4]</span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="right" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 14.0pt; margin-left: 10.0cm; margin-right: -1.0cm; margin-top: 0cm; margin: 0cm -1cm 14pt 10cm; text-align: right;"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 10pt;">4. James Baldwin
(2018). <i>La prochaine fois le feu</i> (1962). Ed. Gallimard.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">O
escorrega evocado por James Baldwin não é outro senão o da modernidade e da sua
inversão, na qual a destruição acelerada da vida na Terra já nos embarcou a
todos. A descida energética em que nos encontramos não acontecerá sem grandes
transformações políticas, sociais e ecológicas. É claro que várias opções são
ainda possíveis, mas declarar abertamente guerra aos jovens e aos movimentos
ecologistas no meio desta curva é uma forma clara e determinada para os
políticos, os bancos e as empresas globalizadas nos dizerem que vão cumprir o
seu programa. Simplesmente, porque não conhecem outro modo de fazer,
continuarão a privilegiar a economia em detrimento da ecologia e, enquanto
puderem, o retorno dos seus activos em detrimento da juventude; isto é, até
afundarem a nossa arca comum, porque por falta de imaginação não há outra
perspectiva mais interessante a desenhar-se nas suas mentes.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Perante
o cinismo de quem opta por continuar a construir aeroportos, comboios de alta
velocidade, auto-estradas, turbinas eólicas industriais, centrais nucleares,
redes 5G, satélites, armas, inteligência artificial, <i>datacenters</i>,
pesticidas, fertilizantes químicos e mega-bacias para si próprios, para o seu
próprio uso e lucro, mas com os nossos braços, a nossa energia e contra o
futuro das comunidades humanas – por outras palavras, um mundo sem futuro,
porque é literalmente insustentável e ecocida – precisamos de nos organizar.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">A
outra grande alternativa para abrandar a descida e amortecer a queda é aquela
que é alimentada pelo movimento dos <i>Soulèvements de la Terre</i>, juntamente
com muitos outros movimentos anti-racistas, decoloniais, ecofeministas e
ecologistas, a do cuidado. Cuidar da Terra e da diversidade dos seus meios
ambientais, cuidar das comunidades vivas e de todos os seres que as habitam,
cuidar das nossas almas e das nossas crenças, cuidar de todas as tecnologias
vivas à nossa disposição, cuidar de todas as alternativas vivas que se ligam à
Terra e ao céu numa lógica de permacultura, tanto na cidade como no campo. E se
necessário, o desarmamento progressivo e o desmantelamento de todas as
infra-estruturas ecocidas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Senhor
Presidente [Macron], o projecto de dissolução do movimento dos <i>Soulèvements
de la Terre</i> produziu uma enorme deflagração; uma explosão tão forte que
despertou em nós algo de irreprimível. Reacendeu em nós esse algo que se recusa
a participar no vasto projecto industrial moderno, cuja consequência mais
decisiva não é a melhoria do conforto e da saúde para algumas e alguns de nós,
mas sim, a curto prazo, a conclusão da destruição dos ambientes vivos e dos
seus habitantes. Nós somos esses habitantes <i>e qualquer coisa em nós </i>indigna-se,
exigindo uma vida decente, uma vida com sentido, uma vida justa e bela, nada
mais, nada menos. A partir de agora, há <i>qualquer coisa em nós</i> que se
recusa obstinadamente a participar na destruição da vida na Terra.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Não
estamos aqui na Terra para matar pobres e destruir mundos vivos. Amanhã, de
manhã cedo, fecharemos a porta no nariz dos anos mortos, sairemos para as
estradas, da Bretanha à Provença, e diremos às pessoas: recusem-se a obedecer,
recusem-se a fazê-lo, não participem na guerra que estamos a travar contra a
Terra.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Senhor
Presidente, se vierem atrás de nós, avisem os vossos polícias que não teremos
armas e que eles podem disparar sobre nós. Mas se vierem atrás de nós, avisem
os vossos polícias que um dia estarão a disparar contra os vossos filhos.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 30pt; line-height: 150%;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Christophe Laurens<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Praticou arquitectura e paisagem durante mais de vinte anos, antes de
co-fundar o mestrado Alternativa Urbanas em Vitry/Seine. Desenvolve trabalho
sobre a emergência de urbanidades alternativas conviviais e populares. Publicou
o livro <i>Notre-Dame-des-Landes</i> ou <i>Le métier de vivre</i> (Éditions
Loco, 2018).<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Nota da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Este texto foi originalmente publicado em francês na edição #380 do
semanário <span style="color: #97694b;"><a href="https://lundi.am/Dissolution-des-Soulevements-de-la-Terre."><span style="color: #97694b;">lundimatin,</span></a></span> a 27 de Abril de 2023. A 21
de Junho de 2023, o Conselho de Ministros do Governo francês decretou a
dissolução do colectivo “<i>Les Soulèvements de la Terre</i>”, constituído nos
finais de Janeiro de 2021. Entretanto, por apelo do colectivo, assim como de
outras associações, partidos políticos e diversas personalidades, <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.conseil-etat.fr/actualites/le-conseil-d-etat-suspend-en-refere-la-dissolution-des-soulevements-de-la-terre."><span style="color: #97694b;">essa decisão foi provisoriamente suspensa pelo Conselho
de Estado</span></a>, </span>enquanto procede a uma análise profunda relativa à
legalidade da decisão. Em primeira instância, o Conselho de Estado decidiu
suspender a decisão por considerar, por um lado, que a dissolução do colectivo
põe em causa a liberdade de associação; e, por outro lado, por considerar que a
qualificação das suas acções por parte do governo, enquanto ameaça grave à
ordem pública, levanta sérias dúvidas. <o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Projecção do artista Joanie Lemercier sobre a fachada da Assembleia
Nacional em Paris, a 20 de Junho de 2023, foto ©Stéphane Burlot.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Ficha Técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">«A dissolução dos <i>Soulèvements de la Terre</i>» • Christophe
Laurens<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Data de publicação: 14.09.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Edição #39 •
Verão 2023 •</span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-32759424138189038102023-07-20T10:30:00.001-07:002023-07-23T23:57:20.963-07:00Cultura de direita • Pedro Levi Bismarck<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjryKOQAU6Y5Gsxn7lL2t5s630fJYRRKRzLNte_1GiTAoDG2pKmNoUX1pxY-4zo4ajWLSiYVwYwnyT3Y_-dC8J8m-0DQhURmp5eFt83rCQGlxaKD5Cu0FRpa2G_4ddBqaQ-CD7UC_pkdulw495oQmO0xVyYYUz5TbSpZeCBlXzP4JJgETIU01gBZmECP5vR/s1080/361641606_10220665963073367_4815929716215198463_n.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1080" data-original-width="1080" height="453" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjryKOQAU6Y5Gsxn7lL2t5s630fJYRRKRzLNte_1GiTAoDG2pKmNoUX1pxY-4zo4ajWLSiYVwYwnyT3Y_-dC8J8m-0DQhURmp5eFt83rCQGlxaKD5Cu0FRpa2G_4ddBqaQ-CD7UC_pkdulw495oQmO0xVyYYUz5TbSpZeCBlXzP4JJgETIU01gBZmECP5vR/w453-h453/361641606_10220665963073367_4815929716215198463_n.jpg" width="453" /></a></div><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 18pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Uma
a uma, Rui Moreira tem vindo a desmantelar algumas das instituições ou
formações culturais mais desafiantes que o Porto viu nascer nos últimos anos: o Fórum do Futuro, a Galeria Municipal,
o Museu da Cidade, o Centro Comercial STOP. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 18pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Desde
o dia um do mandato de Rui Moreira que a cultura foi um sector chave da sua
política de financeirização da cidade, isto é, de rentabilização máxima da
forma-urbana a partir da economia do turismo. A cultura assumiu um valor
político-económico fundamental: por um lado, como linha de força de
gentrificação da Baixa, trazendo para edifícios ou áreas à espera da
especulação imobiliária actividades culturais e artísticas, por outro lado,
como linha de legitimação política, ao afirmar um consenso entre elites
artísticas e políticas em torno de um Porto cosmopolita. Esse pacto em torno da
cultura tem uma explicação: na feroz competição pelo turismo mundial era crucial
afirmar uma especificidade cultural própria do Porto que fugisse do popularismo
<i>kitsch</i> e baratucho de Rui Rio. A reabilitação desse tecido cultural era
necessária na construção da marca «Porto Ponto» mesmo que isso implicasse abrir
concessões temporárias a um campo geralmente habitado pela «esquerda» e por
práticas artísticas e culturais «alternativas». Este foi um processo cirúrgico
que foi tolerando algumas presenças, mas basta lembrar os episódios em torno do
<span style="color: #97694b;"><a href="https://www.publico.pt/2018/05/31/local/noticia/o-adeus-ao-quiosque-do-piorio-ou-o-sonho-impossivel-de-uma-outra-cidade-1832693"><span style="color: #97694b;">Quiosque do Piorio</span></a></span> para reconhecer que
houve, desde o início, um profundo mal-estar relativamente a discursos e
práticas que punham em causa a política imobiliária da Câmara Municipal.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 18pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Ora,
o encerramento compulsivo do STOP assinala de forma evidente o fim desse pacto
cultural, isto é, o fim da função que foi consignada ao sector da cultura e da
arte no processo de gentrificação e <i>turistificação</i> da cidade, enquanto
gestores temporários da cidade no seu devir-mercadoria.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Num momento em que a especulação imobiliária
cobre gloriosamente a totalidade da cidade, tornou-se redundante seguir uma
política desse tipo. Será de recordar que mesmo ali ao lado do centro comercial
STOP, o <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.publico.pt/2022/07/13/local/noticia/cinzas-palacio-ford-nascera-novo-quarteirao-porto-2013440"><span style="color: #97694b;">quarteirão do Palácio Ford</span></a></span> tem já em
cima da mesa a construção de uma unidade hoteleira de luxo e habitação
turística, com as habituais quotas mínimas <i>éticas </i>de «habitação
acessível» e «espaços públicos». <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 18pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas
há um outro aspecto que deve ser considerado. O facto de Rui Moreira se manter como
vereador da cultura desde a morte de Paulo Cunha e Silva revela a necessidade deste
em dominar de forma directa as políticas da cultura, mas sobretudo revela um
complexo de inferioridade que se exprime na vontade de encontrar aquilo que se
poderia chamar uma «cultura de direita». Neste sentido, a transmutação do Museu
da Cidade em Museu do Porto — com a saída de Nuno Faria — é paradigmática: ao
manter uma forma (um<i> design</i>) cosmopolita e liberal num conteúdo marcadamente
provinciano e conservador, o liberalismo portuense de Rui Moreira encontra um
modelo de expressão que permite superar todas as contradições ideológicas da
sua própria política urbana. Ora, quanto maior a exaltação soberana da história
da cidade e dos seus valores <i>invictos,</i> mais esta se reduz à condição
anedótica de um parque temático para turistas. Não deixa de ser irónico que aqueles
que abriram a cidade à <i>tabula rasa</i> da especulação imobiliária, que
destruíram quarteirões atrás de quarteirões de património da humanidade, que
fizeram do centro histórico uma colecção <i>kitsch </i>de fachadas desmembradas,
se consignem hoje à posição de arautos da história e dos valores da cidade. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 18pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">A
história, como a cultura, tem para a direita apenas uma função: a de ser um mito.
E ser um mito significa transfigurar as condições reais da produção num
horizonte simbólico e transcendente. E é precisamente enquanto mito que a
cultura e a história permitem à burguesia do Porto — abusando de uma célebre
formulação de Walter Benjamin — <i>ver a sua própria decadência como um prazer
estético, </i>sonhando com um estatuto social e histórico que já não detém. Que
ambição cultural, aliás, poderia restar a uma classe que está hoje consignada à
condição de arrendatária <i>local </i>do grande capital universal, vivendo e
respirando ignorantemente os <i>slogans </i>da Iniciativa Liberal como a sua
mais magnífica hipótese de redenção?<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 18pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Mas
não há mito sem violência. E, neste sentido, a utilização soberana do
dispositivo legal e policial no encerramento do Centro Comercial STOP exprime
bem o outro lado de uma certa cultura de direita. Não deixa de ser curioso, também aqui, que sejam aqueles que mais falam de liberdade os primeiros a
outorgar-se ao direito de exercer a violência simbólica e física do Estado; os
primeiros a horrorizarem-se perante práticas culturais que escapam a uma certa
ordenação, a uma certa classificação, a um certo espaço-tempo, como de resto
escrevi a propósito do modelo rizomático do <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.revistapunkto.com/2022/11/um-estado-da-arte-pedro-levi-bismarck.html"><span style="color: #97694b;">Museu da Cidade.</span></a></span><o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 18pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 14pt; line-height: 150%;">Muitas
lições num único acontecimento onde aquilo que está em causa não é apenas o
encerramento de umas quantas salas de ensaio para músicos, mas uma <i>luta </i>por
um certo modelo de cidade, ou melhor, por um certo modo de poder fazer cidade —
<i>de poder estar-junto em cidade</i> — e que a todos os títulos parece cada
vez mais incompatível com a gigantesca máquina financeira especulativa que
tomou conta não apenas da cidade, mas da totalidade dos espaços da nossa existência:
da habitação à saúde, da educação à cultura e à música.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; margin-left: 63.8pt; margin-right: 56.65pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 56.65pt 12pt 63.8pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 30pt; line-height: 150%; mso-themecolor: text1;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 0cm; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 9pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">Pedro
Levi Bismarck<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><span style="background: white; color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Editor
do Jornal Punkto, arquitecto, crítico e ensaísta, investigador no CEAU (Centro
de Estudos de Arquitectura e Urbanismo da Faculdade de Arquitectura da
Universidade do Porto).<o:p></o:p></span></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><span style="background: white; color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><br /></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;"><o:p> </o:p></span><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Nota
de edição</span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Texto
publicado originalmente no </span><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><a href="https://www.publico.pt/2023/07/21/opiniao/opiniao/cultura-direita-2057559"><span style="color: #97694b;">Jornal Público</span></a></span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;"><br /></span></b></p><p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">Manifestação
em defesa do Centro Comercial Stop. Via </span><span style="color: #97694b;"><a href="https://www.facebook.com/photo?fbid=10220665963273372&set=pcb.10220665963993390"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Luís Monteiro</span></a></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">Ficha
Técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.55pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.55pt; text-align: center;"><i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">Cultura
de direita</span></i><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">• Pedro Levi Bismarck<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.55pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.55pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">Data
de publicação: 20.07.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 6pt 42.55pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-themecolor: text1;">Edição
#37 • Inverno 2023 •<o:p></o:p></span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-73652868570357240062023-07-17T04:05:00.003-07:002023-07-18T08:11:51.861-07:00Futuros-outros • Godofredo Enes Pereira<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPAbolHJgvIgz0Y8xTsRYeysvjHjBWdCgJ4FKvxno3hp4JRfiTBzejElw32Tcsx1KtXL1hpbwxDsanGKPYyPGoNkt8vbwALU6f_nIR_6MlYfzzspzCLcvTRxvwK6thiMgpe3_zuIYdp-NOfG1ob7hSs9572K1R05q96AENvi5hF_iqrUfSrcMSAuMfpEaq/s2119/VerdeBarroso_JVeloso.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1495" data-original-width="2119" height="338" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPAbolHJgvIgz0Y8xTsRYeysvjHjBWdCgJ4FKvxno3hp4JRfiTBzejElw32Tcsx1KtXL1hpbwxDsanGKPYyPGoNkt8vbwALU6f_nIR_6MlYfzzspzCLcvTRxvwK6thiMgpe3_zuIYdp-NOfG1ob7hSs9572K1R05q96AENvi5hF_iqrUfSrcMSAuMfpEaq/w479-h338/VerdeBarroso_JVeloso.jpg" width="479" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Tendo
em conta as bem conhecidas estruturas políticas e financeiras que subjazem ao
mundo das bienais e trienais de arquitectura, é impossível tentar uma reflexão
sobre os conteúdos de qualquer um destes eventos sem considerar as suas
condições de produção. São frequentes as contradições entre compromissos
ético-políticos patentes nas peças e discursos expositivos, e os processos que
lhes subjazem, quer seja ao nível laboral, de remuneração, práticas de
curadoria ou políticas das instituições que as promovem. Sendo que tais
contradições revelam uma boa dose de cinismo ou ‘<i>elite capture’</i>, não
deixa de ser verdade que as bienais são também palco de importantes lutas pelo
futuro do campo, pois tendo uma grande visibilidade pública, tornam-se espaços
a partir dos quais se podem promover mudanças alargadas. A mais recente Bienal
de Veneza de Arquitectura, inaugurada a 17 de Maio, é nesse sentido, um
interessante exemplo. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Com
curadoria de Leslie Lokko, a Bienal focou pela primeira vez a produção arquitectónica
africana e da diáspora africana, através do tema <i>Laboratório do Futuro</i>.
A ideia era que África é o continente com uma população mais nova, assim como
aquele a partir do qual se pode melhor pensar como enfrentar as principais
lutas do futuro, nomeadamente anti-racismo, descolonização e justiça climática.
E desde logo, por quase todos os espaços da bienal — desde exposição principal
a pavilhões nacionais — claramente se evidenciou uma atenção à dimensão
política e social da arquitectura. Se pelo mundo fora se reconhece uma
ressurgência da extrema-direita, há que notar que esta tem dedicado crescente
atenção ao campo da produção cultural, da academia, da investigação e da arte,
enquanto locais centrais de disputa sobre as subjectividades, sobre o
senso-comum, e sobre o futuro. Neste contexto, muitas das contribuições para a
bienal posicionaram-se directamente com estas lutas em mente. Não faltaram
reflexões e investigações sobre a participação histórica da arquitectura em
processos coloniais, de segregação e exploração racista, em diversos sistemas
prisionais, sobre o impacto ambiental negativo do planeamento urbano moderno ou
sobre a sua dependência da extracção de recursos florestais e minerais, entre
outros. E não apenas de uma perspectiva crítica, reconhecendo impactos
passados, mas principalmente através de especulações e reflexões sobre a
possível participação da arquitectura em processos com vista a gerar um outro
tipo de futuros. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
bienal pautou-se pela presença de arquitectos e artistas de gerações mais
novas, assim como de grupos tipicamente desconsiderados enquanto agentes de
pensamento arquitectónico ou artístico legítimo, nomeadamente comunidades
indígenas, organizações populares, artesãos, agricultores, ou claro, as mais
diversas diásporas, não só africanas, mas de todo o sul global. Talvez devido a
escolhas ditadas pela temática específica desta bienal, ou reflexo de uma real
mudança no campo da arquitectura, a maioria das propostas demonstraram estar
pouco interessadas em obedecer aos limites da encomenda pública e do mercado
imobiliário. Ao invés do discurso de ‘prestação de serviços’, notou-se a
vontade de pensar modos de coexistência neste planeta. Veja-se a colaboração da
Forensic Architecture com David Wengrow, a <i>Nebelivka Hypothesis,</i> que
continua o trabalho que este desenvolveu com David Graeber em <i>The Dawn of
Everything</i> investigando a arqueologia de povoados de grandes dimensões que
aparentemente conseguiram evitar a formação de hierarquias sociais ou de uma
classe administrativa. Ou vejam-se as reflexões sobre a dependência extractivista
do mundo da arquitectura patentes no pavilhão Espanhol e Alemão ou nos
trabalhos de Thandi Loewenson e Margarida Waco. Ou ainda as explorações de
ecologias colectivas, patentes nos trabalhos de Dele Adeyemo, de Arinjoy Sen ou
de Ibyie Camp, para referir apenas algumas das múltiplas linhas de fuga ao que
mais comumente se vê em exposições de arquitectura. A exibição da revista <i>The
Funambulist, </i>editada por Léopold Lambert, que tem nos últimos anos servido
como a principal infra-estrutura de apoio a pensamento e práticas anticoloniais
na arquitectura, captura muito do contexto e das tentativas de mudança de
paradigma que subjazem a esta exposição.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Também
o pavilhão de Portugal, que sob o título de <i>Futuros Férteis</i> foi
comissariado por Andreia Garcia, Ana Neiva e Diogo Aguiar, reconheceu a
importância de olhar para o território e para conflitos em torno da água e dos
solos, o que, do ponto de vista do que deveria ser o futuro da profissão, é
fulcral. Só que no melhor pano cai a nódoa, e neste caso, foi problemática a
decisão de convidar o ex-ministro do ambiente e clima João Pedro Matos
Fernandes para participar numa das equipas. Matos Fernandes foi o ministro que
promoveu o plano de fomento mineiro em Portugal, abrindo todo o país a mineração
do lítio. A sua actuação deixou poucos amigos em populações e grupos
ambientalistas. Mas, se esta escolha foi problemática, pior mesmo, foi a recusa
da equipa de curadoria em explicar a decisão, depois de ter sido informada por
múltiplas pessoas — incluindo o autor deste artigo e representantes de
movimentos populares — sobre o modo como tal decisão estava a ser recebida
pelas populações que há tantos anos estão em luta pela defesa de territórios e
ecossistemas (como são as populações do Barroso que estão a enfrentar dezenas
de projectos de mineração na região). Se remover a participação do ex-ministro
não era possível, ou não desejado (?), seria pelo menos possível reconhecer e
dignar aqueles cujas vidas vão ser dramaticamente afectadas, com uma resposta ou
uma declaração. Construir futuros férteis em arquitectura deveria implicar
reconhecer as comunidades em luta pela defesa dos territórios. Assobiar para o
lado quando não dá jeito chamar atenção negativa para uma exposição, não é
sinal de real interesse em mudar o modo como se fazem as coisas.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Não
se trata só deste caso no pavilhão português. Por toda a Bienal de Veneza não
será difícil encontrar exemplos de cinismo ou de apropriação de temáticas
‘políticas’ sem dedicação real às causas que lhes subjazem. Contudo, ressalto
que a atribuição dos dois prémios principais, não pode senão ser vista como o
reconhecimento de lutas reais, que existem muito para além do campo da arquitectura.
Ao nível do melhor projecto expositivo foi premiado o projecto <i>Ente di Decolonizzazione
— Borgo <s>Rizza</s></i><s> </s>de DAAR, de Sandi Hilal e Alessandro Petti.
DAAR, que tem vindo há mais de uma década a explorar pedagogias anticoloniais
na Palestina, e tendo-se mantido sempre fora dos principais circuitos
mediáticos, apresentam aqui um projecto no sul de Itália, onde exploram a
descolonização da arquitectura fascista, através da sua profanação e reuso. No
contexto do actual governo de extrema-direita em Itália, a atribuição deste
prémio não passou despercebida. Já o prémio para melhor pavilhão nacional foi
dado ao Brasil, com curadoria de Gabriela de Matos e Paulo Tavares, que sob o
tema de <i>Terra,</i> expôs as práticas espaciais e territorialidades dos
muitos mundos que fazem o Brasil, desde as arquitecturas dos povos originários,
aos quilombos e terreiros do candomblé de populações escravizadas, partindo da
terra para trazer para o mesmo palco lutas ecológicas e urbanas do Brasil, do
terreiro à terra preta, alianças estas necessárias para um futuro que se quer
ancestral — tal como enunciado por Ailton Krenak. Ao contrário do que muitas
vezes acontece, quando a arte e a academia desenvolvem uma relação extractiva
com o mundo, pouco depois da entrega dos prémios em Veneza este mesmo Leão de
Ouro foi apresentado ao Terreiro da Casa Branca, em Salvador, entregue a Iyá
Neuza de Xangô. Desta maneira se homenageou quem, no seu dia-a-dia, luta pela
possibilidade de outros mundos. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Bienais
e trienais de arquitectura, apesar de todos os seus problemas, permitem um
espaço de disputa sobre ideias e praticas que de outra maneira teriam mais
dificuldades em ser vistas, reconhecidas e por isso mesmo, em fazer comunidade
com tantas outras. Como sempre, os projectos mais interessantes são aqueles que
já estavam em andamento muito antes, e continuaram muito depois, da exposição
ela mesma: lutas por modos de existência, na sua dimensão ético-estética. Isto
porque no mundo, não faltam futuros férteis, futuros outros. Mas é preciso
querer vê-los, demonstrando <i>humildade,</i> no sentido original do termo, de
uma proximidade ao húmus, isto é, às pessoas e a todas as outras entidades,
humanas ou não, que cuidam a capacidade reprodutiva e criativa da terra. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><a name="_Hlk140246409"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></a></p>
<span style="mso-bookmark: _Hlk140246409;"></span>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Godofredo
Enes Pereira<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Godofredo
Enes Pereira é arquitecto e investigador. É director do <i>MA Environmental
Architecture</i> no <i>Royal College of Art</i>, em Londres.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">João Veloso<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Futuros-outros
• Godofredo Enes Pereira <o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 17.07.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#39 • Verão 2023<o:p></o:p></span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-39225045507855459572023-07-11T03:56:00.001-07:002023-07-13T03:04:43.204-07:00“Ecoterroristas” são os outros • António Guerreiro<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSQtFz0tzBB717RFg45lDy3Ytg393fRdwGH8ZOUgNiSrg7iV-3pXmxi-aatYGysCowExLHI3k5k_fJerrMOWYSyTWL2qig89PMU5kb9mpnn34sCK95KtpNYfFuY9XwecvwDO2189K6K54Cqu6wr_3PeIhwdljGu_qCdnaWLLaNCz98CJi2MjpvjpRpqlGC/s726/soulevements-de-la-terre-nantes_2.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="640" data-original-width="726" height="520" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSQtFz0tzBB717RFg45lDy3Ytg393fRdwGH8ZOUgNiSrg7iV-3pXmxi-aatYGysCowExLHI3k5k_fJerrMOWYSyTWL2qig89PMU5kb9mpnn34sCK95KtpNYfFuY9XwecvwDO2189K6K54Cqu6wr_3PeIhwdljGu_qCdnaWLLaNCz98CJi2MjpvjpRpqlGC/w590-h520/soulevements-de-la-terre-nantes_2.jpg" width="590" /></a></div><br /><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">O
antropólogo francês </span><a href="https://www.publico.pt/2023/06/01/culturaipsilon/entrevista/philippe-descola-olhar-indigena-poe-causa-universalidade-respostas-pensamos-2051553"><span style="color: #97694b; font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Philippe
Descola</span></a><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">, um dos representantes mais prestigiados da sua disciplina, a nível
internacional, professor emérito do Collège de France (pudemos ouvi-lo
recentemente na Culturgest, onde proferiu uma conferência), foi recentemente
incluído pelo governo francês numa lista de suspeitos e indesejáveis cúmplices
dos “ecoterroristas”, por ter apoiado publicamente o movimento chamado <i>Les
Soulèvements de la Terre</i>, que já conta com mais de cem mil
signatários. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
figura do “ecoterrorista” está em fase adiantada de construção pelo poder
político (que já conseguiu introduzi-la no léxico da nossa época), com a
colaboração de sectores importantes da opinião publicada nos <i>media.</i> O
“ecoterrorista” é um “activista” num grau mais efectivo e radical, alguém que
passa ao acto não apenas discursivo e simbólico. Não foi difícil deslocar para
este campo o conceito de terrorismo porque se trata de um conceito armadilhado,
desde sempre submetido a um uso flutuante e instrumental.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Atente-se
neste facto: mal foi sentida em Portugal a presença dos “ecoterroristas” que
esvaziam os pneus dos SUV (mas não os vandalizam) e deixam um aviso cordial ao
proprietário a explicar porque o fizeram, logo as forças policiais e os
serviços de <i>intelligence </i>entraram em acção e um clamor de perigo público
atravessou a cidade.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">As
máquinas predatórias de energia, dos recursos naturais e do espaço público, ao
serviço de prazeres gratuitos, essas, nem por sombras se considera que elas
relevam de um sistema, de uma maneira terrorista de habitar o planeta. Negá-lo,
reivindicar os prazeres mesquinhos e privados como se não houvesse uma
catástrofe ecológica em curso, é ser cúmplice de um crime de massa. Mas para
esses actos não se aplica a noção de terrorismo nem sequer de delinquência.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Haverá
hoje alguém mais terrorista do que o homem mais rico do mundo, Elon Musk,
dotado de um tal poder que convenceu quase o mundo inteiro de que os seus
carros de duas toneladas e umas centenas de quilos de baterias são a coisa mais
ecológica que há? Tal convicção, acrescente-se, ignora ou faz por ignorar,
entre muitas outras coisas, um recente relatório da Academia francesa das
Ciências e Tecnologias que estima que o programa de veículos eléctricos
franceses para as próximas duas décadas – só ele – reclama quantidades de lítio
e de cobalto que excedem as actuais produções mundiais.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Quem
não se cansa de denunciar esta impostura universal é o astrofísico francês
Aurélien Barrau, que há menos de um mês foi convidado a discursar no Parlamento
Europeu e disse, em tom enfático, ao seu selecto auditório: “Imaginem que
disporíamos um dia de uma energia quase limpa e quase infinita. Julgo que seria
o pior cenário imaginável. Ganhemos um pouco de distância e raciocinemos para
além dos nossos reflexos de engenheiros pavlovianos. </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt;">O
problema maior, insisto, tem que ver com o que fazemos da energia, não com a
sua origem. Enquanto a destruição sistemática da vida, a devastação dos fundos
marítimos e a erradicação das florestas forem o nosso horizonte (e imaginem que
essas actividades são designadas como “crescimento” pelas pessoas sérias que se
sentam neste Parlamento), continuaremos a transformar este planeta num dejecto
inabitável”. Em suma: mais energia limpa e “verde” significa mais destruição.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
necessidade de colocar a questão dos fins e não apenas dos meios deveria ser
evidente. Mas não é. Veja-se o modo como o projecto de dessalinizar a água do
mar, no Algarve, cria imediatamente a ideia de que um problema (a falta de
água) fica resolvido. Mesmo ignorando que a dessalinização é um processo
altamente poluente, o problema reside no que se faz com a água. E a lição que
podemos apreender é que a utilização que se faz da água, no Algarve em todo o
lado, tem servido em boa parte para destruir a biodiversidade, para fazer
crescer o deserto.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">A
água dessalinizada (tal como a extracção do lítio em Trás-os-Montes) seria uma
boa coisa se não servisse para alimentar os delírios da tecnoengenharia e
preservar o sistema de predação necrófila, ou seja, para ampliar tudo aquilo
que provocou o estado de catástrofe: a vida na terra está a desaparecer, dois
terços da população de insectos, dois terços da população de mamíferos
selvagens, dois terços das populações de árvores já desapareceram.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">Colocar
o foco, como está a acontecer, nas alterações climáticas e investir tudo nos
meios para prosseguir os mesmos fins, os de uma máquina exterminadora – isso
sim, é obstinação terrorista.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 24pt; line-height: 150%;">•<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">António
Guerreiro<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">É
ensaísta e crítico do Público/Ípsilon e editor da Revista Electra. Publicou um
volume de ensaios, O Acento Agudo do Presente (Cotovia, 2000) e, mais
recentemente, O demónio das imagens. Sobre Aby Warburg (Língua Morta, 2018).
Tem colaboração dispersa em revistas e volumes colectivos e editou, com Olga
Pombo e António Franco Alexandre, Enciclopédia e Hipertexto (Editora Duarte
Reis, 2006). Fundou com José Gil, Silvina Rodrigues Lopes a revista Elipse.
Walter Benjamin e Aby Warburg (sobre os quais tem vários artigos publicados)
são os dois pontos fortes do seu trabalho nos últimos anos.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Nota
da edição<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Este
texto de António Guerreiro foi publicado originalmente no </span><span style="color: #97684b; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><a href="https://www.publico.pt/2023/06/16/culturaipsilon/cronica/ecoterroristas-sao-2053151"><span style="color: #97684b;">Jornal Público</span></a></span><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"> a 16 de Junho de 2023.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Manifestações
do movimento </span><i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Les Soulèvements de la Terre. </span></i><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Imagem via </span><a href="https://d.docs.live.net/14f384b0134296f5/Documentos/:%20https:/actu.fr/pays-de-la-loire/nantes_44109/menaces-de-dissolution-les-soulevements-de-la-terre-appellent-a-un-rassemblement-a-nantes_59755682.html"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%;">Actu.fr.</span></a><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: 115%; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; line-height: 115%; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Ficha
técnica</span></b><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; line-height: 115%; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">«“Ecoterroristas”
são os outros» • António Guerreiro<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Data
de publicação • 11.07.2023</span><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="color: black; font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt; mso-bidi-font-family: Arial; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;">Edição
#39 • Verão 2023</span><span face=""Arial",sans-serif" style="color: black; font-size: 9pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT; mso-font-kerning: 0pt; mso-ligatures: none;"><o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-3549680862873178153.post-8873637447074708432023-07-04T08:10:00.003-07:002023-07-04T11:58:51.575-07:00 «Dizem-me que sou estúpido porque peguei fogo à mediateca» — Uma resposta a Carmo Afonso • Luhuna Carvalho<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiTL7G_Phz9JHTH2tUzegUTkr_y641Acw-G-YyKhjAC5svLcPHRqs_VuWbBKPK_4Biia_z4pNzOLFrLTgpszBkUTCCVOU6tGJSpVM-IPmZ3m3UuggFM513cXvmReTwgOz1ff42de1ofQDlbokKfL-8-q9LQOTjLLFw1AjJEWlkUtv3iMmmUlBrpeVXZTVsU/s1282/Screenshot%202023-07-04%20at%2009.09.21.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1282" data-original-width="964" height="800" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiTL7G_Phz9JHTH2tUzegUTkr_y641Acw-G-YyKhjAC5svLcPHRqs_VuWbBKPK_4Biia_z4pNzOLFrLTgpszBkUTCCVOU6tGJSpVM-IPmZ3m3UuggFM513cXvmReTwgOz1ff42de1ofQDlbokKfL-8-q9LQOTjLLFw1AjJEWlkUtv3iMmmUlBrpeVXZTVsU/w602-h800/Screenshot%202023-07-04%20at%2009.09.21.png" width="602" /></a></div><br /><p class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><br /></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">Um <span style="color: #97694b;"><a href="https://www.publico.pt/2023/07/03/opiniao/opiniao/assassinaram-nahel-comecaram-guerra-2055411"><span style="color: #97694b;">artigo recente de Carmo Afonso</span></a></span> sobre os
enésimos motins em França, desta vez após mais um assassinato de um jovem às
mãos da polícia, contém uma frase que poderia servir de resumo à crise da
esquerda. Carmo Afonso analisa os excessos da acção policial explicando a raiva
aparentemente selvagem e irracional dos insurrectos à luz da violência que lhes
é infligida quotidianamente. Até aqui tudo bem.<span style="mso-spacerun: yes;">
</span>Mas Carmo Afonso não resiste a acrescentar que “O instinto revolucionário
que [os manifestantes] demonstram ter peca por excesso na actuação e por
defeito no pensamento ideológico. É por isso que não conseguem fazer uma
verdadeira revolução, apenas motins.” </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt;">Se a
direita observa os motins e vê apenas “selvagens” e “criminosos”, há uma certa
esquerda que parece ver apenas “ignorantes”, demonstrando que não basta usar
terminologia “descolonizante” para evitar um certo paternalismo. A raiva, não
obstante ser justa e compreensível, é primária, porque se expressa de uma forma
destrutiva e não através do repertório político e organizativo que a esquerda
tem enquanto eficaz.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">Vale
a pena atentar com demora na frase. As acções pecam “por excesso”, ou seja, a
destruição e as pilhagens são contraproducentes. Antes de perguntar qual seria
a medida razoável da expressão da raiva cabe olhar para as últimas décadas,
onde uma e outra vez segmentos significantes das populações racializadas
escolhem confrontar a violência a que são sujeitas através de motins e
pilhagens. Watts em 1965, Newark em 1967, Brixton em 1981, Los Angeles em 1992,
Paris em 2005, Estados Unidos em 2021. Revoltas históricas que obrigaram as
suas sociedades a confrontar o seu racismo, que produziram formas de
solidariedade comunitária que persistiram para além delas, que criaram
imaginários artísticos que são ainda hoje hegemónicos. Todas elas foram na sua
altura consideradas irrupções da barbárie na racionalidade do discurso
político, todas elas foram na sua altura consideradas excessivas pela esquerda
do seu tempo.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">Comparemos
a inteligência colectiva e histórica que se expressa nessas explosões sociais
com a da esquerda contemporânea, incapaz de se expressar para além do ultraje e
da indignação nas redes sociais, ancorada a partidos que lutam para sobreviver,
a uma ideia de participação e representatividade hiper-institucional e a um
folclore activista auto-referencial e impotente. O pensamento conservador, e
também o progressista, sempre olhou com desconfiança para as insurreições. Vê
nelas a concretização da ameaça sempre presente da dissolução da ordem e do regresso
a um selvagem estado de natureza. É esse olhar que impede a apreensão do que
ocorre nesses momentos, na compreensão da filigrana de solidariedades,
cumplicidades, conspirações, decisões tácticas, e encontros que ocorre dentro
deles. Que as acções sejam “excessivas” não é sinal de ignorância, é sinal de
inteligência, de uma inteligência que parece ser hoje impossível de
compreender.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">Continuando,
Carmo Afonso refere que os manifestantes pecam também por defeito no
“pensamento ideológico”. Aqui o paternalismo latente torna-se ainda mais
evidente. Não é claro a que “pensamento ideológico” se refere Carmo Afonso.
Devia o proletariado racializado dos<i> banlieues</i> ler as sebentas
amareladas do materialismo dialéctico, as únicas onde ainda se usa a expressão
“pensamento ideológico”? Como sempre a afirmação da ignorância dos outros serve
apenas para deixar explícita a nossa própria ignorância. Todas estas formas de espontaneismo
proletário foram tema central da filosofia política dos últimos 50 anos. Toda a
filosofia política de esquerda do pós-guerra teve, de um modo ou de outro, de
se confrontar com o aumento das explosões sociais não mediadas por
instituições, ou seja, teve de encontrar modos de conceptualizar a inteligência
colectiva que surge nestes momentos de revolta. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">É
natural que para a esquerda portuguesa, cuja especificidade histórica e
política é a sua absoluta devoção anacrónica à ideia de estado e de progresso,
a destruição de equipamentos municipais seja vista enquanto um acto de niilismo
absoluto. É por isso que Carmo Afonso termina o seu artigo dizendo que é esta
ignorância plebeia a impedir “uma verdadeira revolução”. </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt;">Resta
perguntar o que seria essa “verdadeira revolução”. Carmo Afonso é omissa, mas
podemos presumir que esta passaria por um exercício mais humano e mais eficaz
da função repressiva do Estado. Lamentamos, mas se a “verdadeira revolução” é
pedir a regularização ética do funcionamento do capitalismo então que venham os
motins, as suas contradições, os seus perigos e os seus excessos — porque é
dentro das revoltas que são engendrados os caminhos de superação do presente. A
esquerda contemporânea, em geral, tem uma enorme simpatia pelos danados da
terra mas não consegue entender porque é que essa simpatia não é retribuída, ou
seja, não consegue compreender porque é que esse proletariado periférico permanece
absolutamente indiferente aos bons sentimentos da pequeno-burguesia
cosmopolita.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">Um
livro recente ajuda a compreender o que se passa entre as ruas barricadas e as
bibliotecas em chamas. O filósofo Dinamarquês Søren Mau publicou este ano “<i>Mute
Compulsion</i>” na editora britânica Verso, um resumo competente dos debates
contemporâneos sobre o exercício de um poder especificamente capitalista. O
capitalismo reproduz-se utilizando a violência, a alienação e a exploração,
certo, mas há um outro elemento que lhe é historicamente específico. O capital
perpetua-se criando infra-estruturas e meios que dirigem, controlam e organizam
a reprodução social dos sujeitos que nelas vivem. O que obriga cada um de nós a
apresentar-se cada manhã no seu local de trabalho não é uma arma apontada à
nuca mas a impossibilidade material de sobreviver fora do sistema capitalista,
é essa a “obrigação silenciosa” que dá título ao livro. Se esta infra-estrutura
de estradas, polícia, bibliotecas e planificação urbana serve a organizar a
exploração, ela serve também a organizar a exclusão. Se ela serve para gerir a
população activa, ela serve também para gerir a população excedentária. </span><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt;">O
que isto quer dizer é que a polícia e as bibliotecas municipais fazem parte do
mesmo aparato estatal de gestão das populações excedentárias. São duas faces de
um mesmo estado, de um mesmo sistema, de uma mesma organização sistemática da
repressão e da exploração.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">Sobre
isto cabe mencionar um artigo saído no mesmo dia do de Carmo Afonso, chamado <span style="color: #97694b;"><a href="https://blogs.mediapart.fr/heitor-odwyer-de-macedo/blog/030723/pourquoi-j-ai-brule-la-mediatheque"><span style="color: #97694b;">Porque é que queimei a mediateca</span></a></span>,
assinado por Heitor O’dwyer Macedo, psicanalista e encenador franco-brasileiro,
onde este cita um participante nas revoltas:<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 12.0pt; margin-left: 42.55pt; margin-right: 42.45pt; margin-top: 0cm; margin: 0cm 42.45pt 12pt 42.55pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 150%;">“Dizem-me que
queimar a mediateca foi um acto autodestrutivo. Dizem-me que sou estúpido.
Dizem-me que sou capitalista porque parti as vitrines da NIKE e porque roubei
uma dúzia de pares de ténis. Sou estúpido porque peguei fogo à Mediateca, mas
se o ministro do interior que já visitou certamente muitas mediatecas e muitas
bibliotecas em resposta à indignação da juventude nacional, dos pobres, do
árabes, dos negros, dos generosos, indignados contra a polícia que matou outro
miúdo, não tem nada a dizer senão que vai meter mais 45000 polícias na rua, mais
os blindados, mais o armamento pesado, mais os seus snipers, ele que já foi a
muitas bibliotecas e mediatecas, então de que serve ir à mediateca?”<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">A
racionalidade dos motins, a sua inteligência colectiva, torna-se então
evidente. Trata-se de intervenções directas sobre esses aparatos de controle
social, que apontam a uma apropriação imediata do espaço. Não concretizam a
revolução? Claro que não, mas é intelectualmente desonesto exigir que as
expressões políticas de quem se subleva cumpram os requisitos que toda a
política de esquerda se demitiu de pensar nas últimas décadas. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;">O
que Mau expressa na linguagem rarefeita do materialismo histórico e da crítica
da economia política é evidente para qualquer proletário que habite os limites
do capitalismo moderno, mas não para grande parte da esquerda contemporânea.
Resta saber de que lado está então a ignorância, os defeitos e os excessos. Os
proletários não votam na esquerda, não se sindicalizam, não se inscrevem no
micro-colectivo marxista, não assinam o jornal Público? Talvez isso diga mais
sobre cada uma dessas instituições do que sobre eles. Talvez essa recusa seja o
primeiro sinal de inteligência e de consistência de “pensamento ideológico”,
para usar os termos de Carmo Afonso.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="line-height: 200%; margin-bottom: 12pt; text-align: justify;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 13pt; line-height: 200%;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 12pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 25pt;">•<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Luhuna
Carvalho<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Lisboa
(1980). Estudou Cinema em Barcelona. Fez um estágio em Nova Iorque. Mestrado na
FCSH. Universidade Nova de Lisboa. Doutoramento no <i>Centre for Research on
Modern European Philosophy</i>, <i>Kingston University</i>, Londres. Autor de <i>Depois
da Lei</i>, Língua Morta, 2022.<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Imagem<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Remi Moons<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 6pt; text-align: center;"><b><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Ficha
técnica<o:p></o:p></span></b></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">«Dizem-me
que sou estúpido porque peguei fogo à mediateca» — Uma resposta a Carmo Afonso»
• Luhuna Carvalho<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Data de
publicação • 04.07.2023<o:p></o:p></span></p>
<p align="center" class="MsoNormal" style="line-height: normal; margin-bottom: 0cm; text-align: center;"><span style="font-family: Alegreya; font-size: 11.5pt;">Edição
#39 • Verão 2023</span></p>Unknownnoreply@blogger.com